Santana - Vara cível

Data de publicação15 Junho 2020
SeçãoCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
Número da edição2633
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE SANTANA
INTIMAÇÃO

8000323-85.2019.8.05.0227 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Santana
Autor: Ivanir Pereira Lopes Da Silva
Advogado: Mariana Silva De Oliveira (OAB:0062118/BA)
Réu: Pag S.a Meios De Pagamento
Advogado: Jose Campello Torres Neto (OAB:0122539/RJ)
Réu: Avista S.a. Credito Financiamento E Investimento

Intimação: S E N T E N Ç A

Vistos e Examinados.

Do Relatório

Dispensado nos termos do art. 38 da Lei 9.099/95.

Da Fundamentação

Antes de adentrar ao mérito propriamente dito, passo à análise da preliminar aventada.

Da Ilegitimidade Passiva

Aduz a segunda requerida - AVISTA S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO - ilegitimidade passiva, sob alegação de que somente exerce a função de cedente de crédito para a empresa PAG!, não sendo, portanto, administradora de cartão de crédito. Melhor razão, entretanto, não assiste à requerida quanto à ilegitimidade passiva. Não há de se falar em ilegitimidade passiva da segunda requerida, ante a cooperação entre a administradora de cartão de crédito e a cedente de crédito, eis que esta viabiliza a prestação do serviço daquela, com fulcro no Art. 7º c/c 14, ambos da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor).

Rechaço, por conseguinte, a preliminar agitada na contestação apresentada pela segunda demandada (ID Num. 41969333).

Do Mérito

IVANIR PEREIRA LOPES DA SILVA, com qualificação completa nos autos em epígrafe, por conduto de advogado regularmente constituído, ingressou, em 29/10/2019, neste Juízo, com AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO LIMINAR em face de PAG S.A. MEIOS DE PAGAMENTO e AVISTA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, ambas já qualificadas, aduzindo, em suma, que seu nome foi inscrito em cadastro de inadimplentes por débito não reconhecido.

Aduz que adquiriu o cartão de crédito denominado 'Pag!' da primeira ré há aproximadamente um ano, sendo que a única compra efetuada foi um jogo digital para celular, no valor de R$ 14,98 (quatorze reais e noventa e oito centavos), pago através de boleto bancário.

Que, empós a aquisição do aludido jogo, recebeu uma ligação telefônica lhe informando de um débito no importe de R$ 1.763,77 (um mil, setecentos e sessenta e três reais e setenta e sete centavos), referente a um título, do qual a autora não tinha conhecimento.

Ato contínuo, recebeu nova ligação, cuja finalidade foi cobrar o pagamento da dívida, tendo a autora registrado boletim de ocorrência, eis que não sabia a origem do débito.

Alfim, pugna pela procedência dos pedidos contidos na peça primeva, requerendo a declaração de inexistência do débito, além do valor de, no mínimo, R$ 7.000,00 (sete mil reais) a título de danos morais.

A inicial veio instruída com documentos, inclusive boletim de ocorrência (ID Num. 38285955).

A audiência de conciliação ocorreu da forma noticiada no ID Num. 43462074, sem êxito.

A primeira ré - PAG S.A. MEIOS DE PAGAMENTO -, devidamente citada, apresentou a contestação de ID Num. 41968616, alegando, em suma, que não houve falha na segurança do aplicativo, porquanto o login e a transferência foram efetuados com os dados pessoais cadastrais da parte autora. Assevera que, inobstante os diversos avisos de segurança que a empresa direciona aos consumidores, a autora deixou de agir com o dever de cuidado, ao transferir seus dados a terceiros pelo aplicativo Instagram, conforme conversa do chat anexa aos autos. Refutou a ocorrência de danos morais. Pugnou, ao final, pelo julgamento improcedente dos pedidos.

A segunda ré - AVISTA S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO -, regularmente citada, ofertou peça defensiva (ID Num. 41969333), sustentando, preliminarmente, ilegitimidade passiva e, no mérito, a improcedência dos pedidos contidos na peça prodrômica, pela ausência do nexo causal entre a conduta da empresa e o dano ocorrido.

Vieram os autos conclusos para sentença.

Ab initio, refuto o pedido de decretação de revelia requestado durante audiência de conciliação, eis que, em atenção ao princípio da informalidade que rege os Juizados Especiais, entendo que não há vedação legal que impeça o preposto de solicitar prazo para posterior juntada de carta de preposição e, mesmo que não peça prazo, o aludido documento pode ser juntado até a data da audiência de instrução e julgamento. No caso posto, a carta de preposto e os atos constitutivos da empresa foram protocolizados minutos depois a realização da audiência (ID Num. 42072966).

Pretende a autora a declaração de inexistência de sua responsabilidade pela compra realizada em seu nome, por meio do cartão Pag!, com consequente cancelamento da cobrança, além de indenização por dano moral.

A tese por ela defendida é no sentido de que não realizou qualquer compra, tendo sido vítima de golpe praticado por terceiro.

O caso sob análise encontra-se sob o raio de incidência do Diploma Consumerista, já que a relação havida entre a autora e as rés configura relação de consumo, nos termos do conceito exposto no artigo 3º da Lei nº 8.078/90.

Segundo o preceituado no artigo 14 da Lei nº 8.078/90, o fornecedor de serviços responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados por defeito na prestação do serviço.

Com efeito, referido diploma cuidou de dar proteção eficaz ao consumidor e, nesse passo, adotou, como regra, no campo da prestação de serviços, a responsabilidade objetiva do fornecedor, em caso de dano causado por defeito no serviço (art. 14), a qual somente pode ser elidida, na ocorrência de uma das hipóteses previstas no parágrafo 3º de seu art. 14, a seguir transcrito, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...)

§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Como se vê da leitura do dispositivo legal acima transcrito, o fornecedor de serviço responde pelos danos causados ao consumidor, independentemente de sua culpa, eximindo-se, contudo, de tal responsabilidade se restar caracterizada a inexistência de defeito no serviço ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.

No caso dos autos, a PAG S.A. MEIOS DE PAGAMENTO, em sua peça de defesa, afirma a inexistência de falha no seu proceder e imputa à autora culpa exclusiva pelos danos que alega ter sofrido, já que foi ela quem viabilizou a compra por meio do cartão Pag!, tendo fornecido a pessoa estranha, a sua senha pessoal e seu número de CPF, que deveriam ser mantidos sob sigilo, conforme prints de conversa entre a autora e preposto da empresa no chat (ID Num. 41968616).

E, de fato, não há como deixar de reconhecer que a ré tem razão.

A dinâmica dos fatos leva à conclusão de que a compra foi efetuada por meio de cartão clonado e/ou utilização do login (CPF) e da senha, os quais foram fornecidos pela própria autora, durante conversa na rede social denominada Instagram, a pessoa desconhecida.

Ora, como é cediço, a senha de cartão de crédito é de uso pessoal e intransferível, sendo dever do titular do cartão, mantê-la sob sigilo.

Em tal contexto tem-se caracterizado que a culpa do fato danoso é exclusivamente da vítima, ou seja, da própria autora, que descuidou do dever de manter o sigilo da senha do cartão, de uso pessoal e exclusivo, ao fornecê-la a terceiro desconhecido.

Em sendo assim, cabe à autora arcar com as consequências de seu procedimento, que exime as empresas demandadas de qualquer responsabilidade, a teor do disposto no art. 14, §3º, da Lei nº 8.078/90.

Com efeito, ainda que se pudesse cogitar de eventual culpa da ré, no que tange à clonagem do cartão (o que, diga-se de passagem, não restou caracterizado), a efetiva utilização do cartão, dependeria do uso da senha, e a autora é a única responsável por tê-la fornecido a terceiro.

Não pode, então, a autora querer imputar às demandadas as consequências de sua conduta displicente, devendo ela arcar com as consequências de seus atos.

Em síntese: ausente a caracterização de ilícito imputável à ré, consistente em falha na prestação de seu serviço, e evidenciado, por outro lado, a culpa exclusiva da vítima, incide, em favor das demandadas, a excludente de responsabilidade prevista no art. 14, §3º, do Código de Defesa do Consumidor, na esteira do entendimento jurisprudencial sobre o tema, como se vê dos arestos a seguir transcritos:

RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MATERIAIS -SAQUES INDEVIDOS EM CONTA-CORRENTE - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA – ART. 14, §3º DO CDC -IMPROCEDÊNCIA.

1 - Conforme precedentes desta Corte, em relação ao uso do serviço de conta-corrente fornecido pelas instituições bancárias, cabe ao correntista cuidar pessoalmente da guarda de seu cartão magnético e sigilo de sua senha pessoal no momento em que deles faz uso. Não pode ceder o cartão a quem quer que seja, muito menos fornecer sua senha a terceiros. Ao agir dessa forma, passa a assumir os riscos de sua conduta, que contribui, à toda evidência, para que seja vítima de fraudadores e estelionatários.

(STJ, RESP 602680/BA, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU de 16.11.2004; RESP 417835/AL, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJU de 19.08.2002).

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ALEGAÇÃO DE SAQUES INDEVIDOS. UTILIZAÇÃO DE CARTÃO MAGNÉTICO E SENHA PESSOAL. DEVER DE GUARDA DO CARTÃO E...

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