Santo antônio de jesus - 3ª vara dos feitos relativos às relações de consumo, cíveis e comerciais

Data de publicação07 Novembro 2022
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição3213
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
3ª VARA DE FEITOS DE REL DE CONS. CIVEL E COMERCIAIS SANTO ANTONIO DE JESUS
INTIMAÇÃO

8000329-86.2019.8.05.0229 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Santo Antônio De Jesus
Autor: Maria De Lourdes Silva
Reu: Municipio De Santo Antonio De Jesus
Advogado: Camilla Bastos De Cerqueira (OAB:BA50164)

Intimação:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

3ª VARA DOS FEITOS DE RELAÇÃO DE CONSUMO, CÍVEIS, COMERCIAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

COMARCA DE SANTO ANTONIO DE JESUS - BA

Fórum Des. Wilde Oliveira Lima, Av. ACM, s/n, Bairro São Paulo - CEP: 44442-900 -

Fone (75) 3162-1305 - e-mail: sadejesus3vcivel@tjba.jus.br


SENTENÇA



Processo nº: 8000329-86.2019.8.05.0229

Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7)

Assunto: [Antecipação de Tutela / Tutela Específica, Obrigação de Fazer / Não Fazer]

Autor (a): MARIA DE LOURDES SILVA

Réu: Municipio de Santo Antonio de Jesus


Trata-se, no presente caso, de Ação de Obrigação de Fazer, com pedido de tutela de urgência em caráter liminar, ajuizada por MARIA DE LOURDES SILVA, em desfavor do MUNICÍPIO DE SANTO ANTÔNIO DE JESUS, em razão de alegada omissão no fornecimento de fármacos.

Alega a autora que sofre de diabetes melitus crônica e descompensada, além de insuficiência renal grave e hepática, cujo tratamento médico prescrito consiste no uso de insulina Xutolphy, que é de alto custo e deve ser utilizada em combinação com uma fórmula manipulada de anlodipino, hidroclorotiazida e losartana, além de Jardiace 25 mg.

Assevera que já fez uso de outra medicação (insulina NPH) de forma regular por vários anos, bem como hiplocemiante oral, não tendo havido qualquer resposta clínica.

Relata que seus familiares contataram a Defensoria Pública do Estado da Bahia, solicitando a adoção de providências, uma vez que não dispõem de recursos para custearem a aquisição dos mencionados medicamentos, os quais são de alto custo, eis que, somados, custam cerca de R$ 700,00, sem prejuízo do sustento próprio e da sua família.

Informa que a Secretária Municipal de Saúde instada, respondeu que as medicações não fazem parte da lista Rename, o que acredita não ensejar o afastamento da responsabilidade do Ente Municipal.

Transcreve dispositivos legais, textos doutrinários e decisões judiciais sobre o tema.

Defende, ainda, que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante acesso universal e igualitário, tendo como diretriz o atendimento integral, consoante se observa da Constituição Federal no art. 196.

Cita a Lei nº 8.080/1990 – Lei Orgânica da Saúde, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, bem como sobre a organização e funcionamento.

Argumenta que em virtude da integralidade de assistência, é obrigatório o fornecimento de procedimentos médicos comprovadamente necessários ao tratamento dos agravos, ainda que na rede particular, quando não houver cobertura suficiente na rede pública de referência, cujas despesas devem ser custeadas mediante conjugação solidária de recursos da União, dos Estados e dos Municípios. Transcreve jurisprudência.

Afirma que os serviços de saúde são de relevância pública, restando certo que o direito à saúde constitui direito público subjetivo e indisponível, assegurando o ordenamento jurídico a efetividade social em toda a sua amplitude e que, outrossim, cumpre a direção do SUS é única, sendo exercida em nas esferas Municipal, Estadual e Federal.

E defende, ad argumentandum tantum, que a teoria da reserva do possível é inaplicável na hipótese sub examine.

Declina, pois, que, em vista do exposto, é imprescindível a concessão da tutela de urgência, determinando que o réu lhe forneça os citados medicamentos, de forma contínua.

Ao final, pugna pela confirmação da tutela de urgência.

À exordial foram juntados documentos.

Recebida a exordial, foi concedida a justiça gratuita à autora, deferida a tutela requerida, e determinada a citação do réu.

O réu apresentou a sua defesa suscitando preliminar de ilegitimidade passiva, alegando que a competência para o fornecimento de medicamentos de alto custo é do Estado da Bahia.

No mérito, defende que o fornecimento pelo Município de tratamento de alto custo compromete a continuidade do serviço municipal de saúde, por risco de falência, e que parte dos medicamentos não é fornecida pelo SUS.

Pugna, ao final, pela improcedência da ação.

A autora apresentou réplica, impugnando a preliminar e refutando as demais alegações do réu, pugnando pelo julgamento procedente do pedido.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

A lide comporta julgamento antecipado, uma vez que as questões fáticas já estão suficientemente comprovadas pelos documentos acostados aos autos, sendo desnecessária a produção de outras provas, nos termos do art. 355, I, do CPC.

DA PRELIMINAR

Argui o réu a sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que a obrigação da distribuição de medicamentos de alto custo ao usuário do SUS é de alçada do Estado da Bahia.

Ocorre que o sistema de saúde é único e a responsabilidade dos entes políticos é solidária. Ora, a saúde é direito de todos e dever do Estado, consoante promana a Constituição no art. 196.

E a própria Lei nº 8.080/1990, Lei Orgânica da Saúde, e o Decreto nº 7.508/2011 que a regulamenta, estabelecem o compartilhamento de competências e atribuições sem especificar a qual dos entes políticos cabe o fornecimento de medicamentos, sendo que se normativos administrativos o estabelecem, não foram comprovados pelo demandado, quando sequer possuem efeito vinculante em caso de omissão.

É que, em virtude da unicidade e integralidade de assistência, é obrigatória a execução das providências necessárias a garantir a saúde do cidadão, na rede pública de referência, com despesas e esforços compartilhados mediante conjugação solidária da União, dos Estados e dos Municípios, ao que em caso de omissão, quaisquer dos entes podem ser demandados, não se configurando a ilegitimidade do Município no caso em apreço.

Pelo exposto, REJEITO a preliminar suscitada.

DO MÉRITO

Consoante já relatado, trata-se, no caso, de ação com pedido de obrigação de fazer pautado na alegada omissão no fornecimento de medicamentos pelo Município de Santo Antônio de Jesus, sob o fundamento de que parte dos fármacos não constam da Rename.

Para que se possa impor ao ente municipal o seu fornecimento, há que se ter a certeza de que a medicação requerida é eficaz para o tratamento da doença, bem como que a utilização de outros medicamentos, indicados para a mesma moléstia e fornecido pela rede pública, não alcançariam o mesmo resultado.

Saliente-se que o STJ firmou tese, por ocasião do julgamento do recurso repetitivo n.º 1.657.156/RJ, prolatado em maio de 2018, determinando critérios cumulativos para a concessão de medicamentos não incorporados pelo SUS, conforme se segue:

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS a presença cumulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

E verifica-se que a autora cumpriu todos os requisitos acima, elencados pelo STJ no Tema 106, quais sejam, apresentou relatório médico fundamentado e circunstanciado relativo à paciente, que é comprovadamente hipossuficiente financeiramente para arcar com o custo dos fármacos, os quais são registrados pela ANVISA.

A cópia do parecer médico acostada (ID 20589047, p. 8), atesta diagnóstico no sentido de que a requerente de fato sofre das enfermidades indicadas na petição inicial, necessitando de medicamentos que, embora não fornecidos pelo SUS, são imprescindíveis ao tratamento da moléstia que acomete a autora, e que a terapêutica fornecida não foi eficaz no seu tratamento, de forma que atendido o disposto na tese firmada no REsp 1657156.

Nesse sentido, a negativa do réu em lhe fornecer fármacos associados conforme prescrição médica significa agravar a sua dor e sofrimento.

Ressalte-se que, a teor do que dispõe o art. 196 da Constituição Federal, a saúde é direito de todos e dever do Estado. Nesse toar, o direito à saúde é prerrogativa constitucional indisponível. Por conseguinte, o legislador constituinte não mediu esforços no sentido de conferir instrumentos suficientes no próprio texto da Carta Política de 1988, que também ficou conhecida como Constituição Cidadã, de forma que os entes políticos possibilitem ao cidadão brasileiro acesso a um sistema de saúde de qualidade.

De acordo com a Constituição Federal, a dignidade da pessoa humana é princípio fundamental e basilar do Estado brasileiro, que, aliás, estabelece ainda, enquanto princípio, o direito à saúde (art. 227, caput, da CF).

Na cátedra de José Afonso da Silva, in Comentário contextual à Constituição (4ª ed., Ed. Malheiros, 2007, São Paulo, pág. 38):

Se é fundamento porque se constitui num valor supremo, num valor fundante da República, da Federação, do País da Democracia e do Direito. Portanto, não é apenas um princípio da ordem jurídica, mas o é também da ordem política, social, econômica e cultural. Daí sua natureza de valor supremo, porque está na base de toda a vida nacional. Repetiremos aqui o que já escrevemos de outra feita, ou seja, que a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde...

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