São felipe - Vara cível

Data de publicação09 Agosto 2021
Número da edição2917
SeçãoCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE SÃO FELIPE
INTIMAÇÃO

8000032-04.2018.8.05.0233 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: São Felipe
Autor: Benedita Silva Dos Santos
Advogado: Joao Vitor Dos Santos Ribeiro (OAB:0040927/BA)
Reu: Banco Bradesco Sa
Advogado: Perpetua Leal Ivo Valadao (OAB:0010872/BA)

Intimação:

Dispensado o relatório, na forma do art. 38 da Lei 9.099/95.

Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, que autor discute a inexistência de débitos junto à Empresa Ré.

Aduz a parte autora que ao receber sua pensão por morte de seu esposo, no Banco Bradesco, 5287, na cidade de São Felipe-BA, quando foi surpreendida com um desconto no valor de R$ 637,00 (seiscentos e trinta e sete reais), decorrentes de um empréstimo pessoal no valor R$ 9.877,26 (nove mil oitocentos e setenta e sete reais e vinte e seis centavos).

Diz que a operação citada, foi realizada sem seu conhecimento e autorização, que é pessoa com pouco estudo e não possui necessidade de realizar empréstimo, em face da aposentadoria que recebe que é para o sustento seu e de sua família.

Liminar concedida Id 12550295.

Em resposta, o banco demandado arguiu a preliminar de carência de ação. No mérito, contestou os pedidos alegando que o contrato ora contestado pela parte autora foi realizado pelo BDN através de senha ou biometria e que não há qualquer irregularidade.

Argumenta que no dia 09/11/2017, a parte Acionante realizou a contratação de um empréstimo pessoal no importe de R$ 9.418,34 (nove mil quatrocentos e dezoito reais e trinta e quatro centavos), possuindo como registro bancário o nº 5705954 e que no dia 05/01/2018 foi debitada a primeira parcela do empréstimo, no valor de R$ 262,36 (duzentos e sessenta e dois reais e trinta e seis centavos).

Afirma que, após solicitação do Requerente, por mera liberalidade e boa-fé, o Banco Demandado promoveu o estorno do valor creditado em conta, a título de empréstimo pessoal, resolvendo a questão de forma administrativa

Defende que não houve conduta ilícita praticada pelo mesmo, motivo pelo qual não há substrato para caracterização do dano moral e prejuízos alegados pela parte autora.

Decido.

Inicialmente, não há que se falar em carência da ação, uma vez que é perfeitamente possível a discussão judicial de qualquer contrato firmado se a parte alegar abusividade, não se caracterizando o defeito alegado, pelo que rejeito a preliminar.

O feito comporta julgamento nesta fase, sem dilação probatória. A matéria discutida é só de direito. Assim, possível o julgamento antecipado, nos termos dos artigos 139, II e 355, I, ambos do CPC, sem olvidar o princípio constitucional da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF). Oportuno lembrar que: “Presentes as condições que ensejam o julgamento antecipado da causa, é dever do juiz e não mera faculdade, assim proceder.” (STJ-4ª TURMA, Resp 2.832-RJ, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 14.8.90, DJU 17.9.90, citado por NEGRÃO, Theotonio, GOUVEIA, José Roberto. Código de processo civil e legislação processual civil em vigor. 37.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 430).

O pedido é procedente. Pois bem, em que pese o argumento trazido pela defesa, observa-se que o réu não colacionou nos autos o suposto contrato que fundamentasse suas alegações, restando evidente a inexistência do mesmo.

Nessa vertente, os documentos trazidos pelo autor corroboram os fatos descritos na inicial. De fato, a autora fez prova de que houve um crédito em sua conta lançado pelo réu, do qual sustenta desconhecer a origem. Daí, competia ao banco réu o ônus probatório de trazer documentos que elidissem a veracidade dos argumentos apresentados pelo autor.

Daí, considerando que a ré não comprovou que a autora solicitou o empréstimo, não trouxe prova do instrumento do contrato que originou o débito, é caso de se declarar inexistentes os débitos da autora com o réu, fixando-se, ainda, indenização por danos morais, dado cuidar-se de dano in re ipsa.

A aplicabilidade da norma consumeirista é evidente na medida em que, apesar de não haver relação de consumo entre as partes, a requerente é englobada na norma de extensão definida no art. 17 já que vítima da falha do fornecedor.

O Código de Processo Civil Pátrio estabelece regras quanto ao ônus da prova, senão vejamos:"Art. 373: O ônus da prova incumbe:I- ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;II- ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."

No caso dos autos, diferentemente do alegado pelo demandado, como a demandante afirma não ter firmado qualquer contrato com a instituição Demandada, não possui subsídios para provar o que não aconteceu, trata-se de um fato negativo. Deste modo, na medida em que a autora não poderia fazer prova negativa, isto é, demonstrar que não contratou, competiria ao demandado demonstrar eficazmente a solicitação dos serviços ou qualquer outro negócio que pudesse motivar os descontos realizados nos proventos da autor. Nesse sentido vem decidindo a jurisprudência pátria:

APELAÇÃO CÍVEL -AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO -COMPRA E VENDA DE CALCÁRIO -ÔNUS DA PROVA -DISTRIBUIÇÃO -FATO NEGATIVO IMPOSSÍVEL DE PROVAR -DESLOCAMENTO DO ÔNUS PARA A RÉ -AUSÊNCIA DE PROVA HÁBIL A DEMONSTRAR A EXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA ENSEJADORA DO DÉBITO -RECURSO CONHECIDO -IMPROVIDO. Tratando-se de ação declaratória de inexistência de débito, que teria advindo de uma suposta relação jurídica de compra e venda, não se pode imputar à autora o ônus da prova, porque se trata, no caso, de negativa indeterminada, que não pode ser provada. Em casos tais, quando à ré comparece em juízo para defender-se, alegando a existência da relação jurídica, é dela o ônus da prova de tal fato, porque a ela interessa a demonstração da existência de tal relação e do débito dela advindo. Assim, não demonstrada a ocorrência de relação jurídica pela ré, ora recorrente, correta a sentença ao declarar inexistente o débito. (AC nº 872 MS 2010.000872-2, Quarta Turma Cível, TJMS, Rel. Rêmolo Letteriello, publicado em 12.02.2010) (grifo nosso)

Diante do que, indiscutível e notório o prejuízo moral que tal fato ocasionou à autora, que passou por sofrimento e constrangimento ao tentar cancelar sem sucesso um empréstimo que nem mesmo solicitou, não se enquadrando os transtornos por ela suportados como meros aborrecimentos, mas sim como graves contrariedades e sofrimento emocional. Assim, tenho que restou evidenciado nos presentes autos o dano moral sofrido pela parte autora.

Ademais, a Doutrina e a Jurisprudência têm ensinado que o dano simplesmente moral, sem repercussão no patrimônio, prova-se tão somente pela ofensa ou constrangimento, e dela é presumido, sendo o bastante para justificar a indenização.

Veja-se o ensinamento de Yussef Said Cahali:

"(...) Parece mais razoável , assim, caracterizar o dano moral pelos seus próprios elementos; portanto, como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos"...(CAHALI, Yussef Said, Dano Moral, 2ª Ed., ver., atual. E apl., 3ª tiragem, Revistas dos Tribunais, 1999, PP.20-21.)"

Assim, como é cediço, a configuração dos danos morais independem da prova de prejuízos e de reflexos ou repercussão patrimonial.

A esse respeito, e a guisa de mera ilustração, já tem proclamado o STF que "a indenização, a título de dano moral, não exige comprovação de prejuízo" (RT 614/236), por ser este uma consequência irrecusável do fato e um "direito subjetivo da pessoa ofendida" (RT 124/299). Com efeito, tal entendimento se justifica porque essas decisões partem do princípio de que a prova do dano moral está no próprio fato em si, como o afirmou o juiz DEMÓCRTIO RAMOS REINALDO FILHO, em r. voto proferido como Relator no Recurso nº 0228/1998 do I Colégio Recursal Cível de Pernambuco, em Sessão de Julgamento da 3ª Turma, em 20/09/1998, "verbis":

"- A indenização a título de dano moral não exige comprovação de prejuízo, por ser este uma consequência irrecusável do fato e um direito subjetivo da pessoa ofendida. Fundamenta-se no princípio de que a prova do dano (moral) está no próprio fato, não sendo correto desacreditar na existência de prejuízo diante de situações potencialmente capazes de infligir dor moral. Esta não é passível de prova, pois está ligada aos sentimentos íntimos da pessoa. Assim, é natural admitir-se a responsabilidade civil, p. ex., na maioria dos casos de ofensa à honra, à imagem ou ao conceito da pessoa, pois subentende-se feridos seus íntimos sentimentos de auto-estima."

Ademais não custa ressaltar que já é pacífico o entendimento de que "o dano moral pode ser fixado independentemente da prova de ter o ilícito repercussão patrimonial".

A intensidade da culpa, os meios empregados, a falta de mínimos cuidados que levaram ao evento danoso, deverão...

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