Segunda câmara criminal - segunda turma - Segunda câmara criminal - segunda turma

Data de publicação26 Julho 2022
Número da edição3144
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
Des. João Bôsco de Oliveira Seixas - 2ª Câmara Crime 2ª Turma
DECISÃO

8029708-75.2022.8.05.0000 Habeas Corpus Criminal
Jurisdição: Tribunal De Justiça
Impetrante: Defensoria Publica Do Estado Da Bahia
Paciente: Jose Roberto Lino Dos Santos Filho
Impetrado: 1 Vara Criminal De Simoes Filho

Decisão:

Vistos, etc.

Cuidam os presentes autos de Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública Estadual em favor de José Roberto Lino dos Santos Filho, que aponta como Autoridade Coatora o eminente Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de Simões Filho, através do qual discute suposto constrangimento ilegal que vem sendo suportado pelo Paciente.

Assevera a Impetrante que o Paciente foi preso no dia 18/07/2022, acusado da suposta prática do crime tipificado no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, tendo a referida prisão sido convertida em preventiva no dia 19/07/2022, para garantia da ordem pública.

Sustenta, em síntese, que o decreto preventivo se encontra desfundamentado, pois ausentes os seus requisitos legais, não tendo sido consideradas as condições pessoais favoráveis do Paciente, nem tampouco a possibilidade de aplicação de outras medidas cautelares diversas da prisão, em total afronta ao princípio da presunção da inocência.

Com fulcro nos argumentos supra, pede que seja deferida a liminar, expedindo-se o consequente alvará de soltura em favor do Paciente, ainda que mediante aplicação de outras cautelares, pugnando, ao final, pela confirmação da liminar.

É o Relatório.

Como cediço, a concessão de plano e liminar de ordem em Habeas Corpus é medida extraordinária que somente se justifica através de verificação inequívoca, prévia e cumulativa dos seus requisitos legais - o fumus boni iuris e o periculum in mora - de forma a assegurar e tornar eficaz a decisão definitiva da ordem pleiteada.

In casu, vislumbro, de plano, a existência de constrangimento ilegal a macular o status libertatis do Paciente.

Com efeito, no que concerne à inidoneidade do decreto preventivo, pois ausentes os seus requisitos legais, verifico que assiste razão à Impetrante, uma vez que, ao decretar a prisão preventiva do Paciente, atendendo requerimento do Ministério Público (ID 215892547, APF nº 8004012-63.2022.8.05.0250, em trâmite no Sistema PJE – Primeiro Grau), a Autoridade indigitada Coatora deixou de apontar elementos concretos que indicassem a periculosidade deste, bem como a inviabilidade de responder à acusação que lhe foi imputada em liberdade.

Veja-se como a referida Autoridade se pronunciou:

“ (…) No caso em análise, constitui conclusão inarredável a presença do fumus comissi delicti, porquanto vislumbra-se a plausibilidade de que se trata de um fato criminoso, constatado por meio de elementos de informação que confirmam a presença de prova da materialidade do fato e de indícios de autoria, notadamente pelo auto de prisão em flagrante, pelo auto de exibição e apreensão, pelo laudo provisório de constatação, e pelas declarações dos policiais que realizaram a diligência, as quais, em conjunto, fornecem indícios da prática do crime de tráfico de drogas.

Patente, também, o periculum libertatis, uma vez que a permanência dos agentes em liberdade acarreta perigo concreto para a ordem pública. A quantidade de droga não é expressiva, fato comum entre traficantes quando em via pública, mas suficiente para denotar a prática do tipo do art. 33 da Lei de Drogas, o qual também se consuma com os tipos guardar e transportar, não necessitando terem sido encontrados durante a venda das substâncias.

Diante do exposto, a liberdade dos custodiados traz evidente insegurança ao seio da sociedade em que habita. Filio-me à corrente majoritária no âmbito da doutrina e jurisprudência, que entende a garantia da ordem pública como risco considerável de reiteração de ações delituosas por parte do flagranteado, o qual, caso permaneça em liberdade, teria os mesmos estímulos relacionados com o delito cometido.

(…) As mudanças produzidas pela Lei nº 12.403/11 vêm ao encontro dessa corrente, porquanto, segundo a nova redação do art. 282, I, do CPP, as medidas cautelares poderão ser adotadas não só para tutelar a aplicação da lei penal e a investigação ou instrução penal, como também para evitar a prática de infrações penais. (...)” (ID 31942527 – Fls. 06/08) Grifos do Relator

Da leitura do excerto supratranscrito, é possível afirmar que inexistiu uma fundamentação suficientemente apta a sustentar o decreto prisional do Paciente, não podendo se considerar a necessidade da prisão cautelar lastreando-se, apenas, no conceito de garantia da ordem pública e de aplicação da lei penal.

A mera citação de “risco considerável de reiteração de ações delituosas por parte do flagranteado, o qual, caso permaneça em liberdade, teria os mesmos estímulos relacionados com o delito cometidonão justifica a decretação de uma prisão preventiva, haja vista tratar-se de referência genérica e cabível para qualquer hipótese do referido crime. Registre-se que, de acordo com o teor do documento acostado aos autos (ID 31942527 – Fls. 16), o único registro que o Paciente ostenta é o que se refere ao auto de prisão em flagrante que originou o presente Habeas Corpus.

Ora, como cediço, a prisão cautelar é medida excepcional e extrema e apenas pode ser decretada quando se mostrar estritamente necessária e devidamente fundamentada na garantia da ordem pública, na conveniência da instrução processual e na eventual aplicação da lei penal.

Ademais, após a edição da Lei nº 12.403/2011, com as alterações trazidas pela Lei nº 13.964/2019, a constrição cautelar da liberdade ganhou contornos ainda mais restritos, pois, além da presença dos requisitos apontados, há que se demonstrar a inadequação das outras medidas cautelares previstas pelo legislador, todas diversas da prisão.

Em vista de tais considerações, entendo que a constrição cautelar da liberdade, calcada apenas em elementos genéricos, abstratos e sem respaldo documental, há de ser considerada ilegal, e impõe a concessão da liminar, não sendo permitido a este julgador complementar a fundamentação utilizada na decisão impetrada, apesar da gravidade do crime supostamente cometido pelo Paciente.

Sobre o assunto, mutatis mutandis, vem sendo perfilhado o entendimento da jurisprudência pátria:

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. DESPROPORCIONALIDADE DA CONSTRIÇÃO. ACRÉSCIMO DE FUNDAMENTAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. ADEQUAÇÃO E SUFICIÊNCIA. COAÇÃO ILEGAL DEMONSTRADA. 1. A prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão devidamente fundamentada e com base em dados concretos, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos do art. 312 e seguintes do Código de Processo Penal.(...) 3. O decreto preventivo não apontou fundamentação concreta para a constrição cautelar. Além disso, não só deixou de fazer referência aos indícios de autoria e do perigo pelo estado de liberdade dos pacientes, como também não demonstrou os elementos concretos da prisão preventiva. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC 147.586/PE, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 22/09/2021) Grifos do Relator

Ex positis, evidenciado o constrangimento ilegal apontado, defiro a liminar pleiteada, relaxando a prisão preventiva do Paciente.

Por derradeiro, submeto o Paciente ao cumprimento das medidas cautelares previstas no artigo 319, incisos I e IV do Código de Processo Penal, exatamente como forma de acompanhar as atividades regulares deste e com intuito de preservar o andamento do processo, impondo, assim: a) obrigação de comparecer, mensalmente, em juízo, para informar e justificar suas atividades; b) obrigação de não se ausentar da Comarca e de não mudar de endereço sem prévia autorização judicial, devendo comparecer a todos os atos processuais, sempre que intimado.

Ressalvo a possibilidade de nova decretação da custódia cautelar pelo juízo de primeiro grau, uma vez demonstrada, com a devida fundamentação, a sua concreta necessidade.

Comunique-se a soltura do Paciente e a imposição das medidas cautelares ao MM. Juiz apontado como coator, para que este exerça os controles devidos e para que preste informações, no prazo de 05 (cinco) dias.

Nos termos do Ato Conjunto nº 01, deste Egrégio Tribunal de Justiça, de 16/05/2022, expeça-se alvará de soltura na plataforma do BNMP – Banco Nacional de Monitoramento de Prisões em favor do Paciente José Roberto Lino dos Santos Filho.

Diante da concessão da liminar, as demais teses suscitadas ficam prejudicadas.

Após prestados os referidos informes, colha-se o opinativo da douta Procuradoria de Justiça, retornando-me conclusos em seguida.

P.I.

Salvador/BA, (data registrada no sistema no momento da prática do ato).

Des. João Bôsco de Oliveira Seixas

Segunda Câmara Crime - Segunda Turma

Relator

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*Cópia da presente decisão servirá como Ofício, devendo a Secretaria certificar, nos autos, a data de envio da comunicação ao Juízo impetrado.

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