Sentença de mérito
Autor | Manoel Antonio Teixeira Filho |
Ocupação do Autor | Advogado - Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região |
Páginas | 7-48 |
Cadernos de Processo do Trabalho n. 40
7
CAPÍTULO X
Sentença de mérito
Segundo o art. 966, caputdoCPCsomentesãorescindíveisasdecisõesde
mérito passadas em julgado, conquanto o § 2º dessa mesma norma ressalve a
possibilidadedearescisóriadirigirseapronunciamentojurisdicionalquenão
sejademéritonassituaçõesalireferidas
Detenhamo-nos no exame dos elementos que integram essa dicção legal,
no que diz respeito aos pronunciamentos jurisdicionais de mérito.
1. Sentença
OCPCdealudiaapenasàsentença como ato jurisdicional rescindível,
particularidadequenos levouaobervaremlivroanteriorqueaquele Código
não pretendeu, como se pudesse imaginar, tornar imune ao iudicium rescindens
dostribunaisosdemaisprovimentosqueosórgãosjudicantesemitiamcomoos
acórdãoseosdespachosdeconteúdodecisório
Esclarecíamos que o vocábulo sentença não foi aí utilizado com o sentido
estrito que lhe dá o art. 162, § 1º, daquele CPC ; em rigor, o que houve foi um
deslize de ordem técnica do legislador, sob a forma de minus dixit quam voluit,
pois é certo que bastaria ser de mérito o pronunciamento jurisdicional para que
elepudessesesubmeteraumataquepelaviarescisóriacontantoquejáenvol-
vidopelofenômenodacoisajulgadapoucoimportandoquesetratassedesen-
tençaatodejuízodeprimeirograuoudeacórdãoatodetribunaloumesmo
dedespachodeconteúdodecisório
Embora o Prof. Alfredo Buzaid tenha, na Exposição de Motivos do CPC
de 1973 feito referência ao conselho proveniente das fontes romanas, no senti-
dodequetodadeniçãoemdireitociviléperigosaomnisdenitioiniurecivile
periculosa estatreveuse aconceituara sentençacomo oatopelo qualojuiz
põetermoaoprocesso decidindoou nãooméritodacausaart º); a
decisãointerlocutóriacomooatopeloqualojuiznocursodoprocessoresolve
questãoincidenteibidemeosdespachoscomotodososdemaisatosdo
juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento da parte, a cujo respeito
aleinãoestabeleçaoutraformaibidemTodasessasdeniçõestiveream
emmiraaredaçãooriginaldoartdaqueleCódigo
8
Manoel Antonio Teixeira Filho
Dissemosnaalturaqueessaclassicaçãodospronunciamentosjudiciaise
aconsequentedeniçãodessesforamrealizadascomtécnicasenãoperfeitaao
menossatisfatóriaDequalquermaneirarepresentavamumaexpressivaruptu-
raepistemológicacomaterminologia ea doutrinapredominantesnotextodo
CPCdesuperandoasdeciênciaseasimprecisõescientícasqueestavam
a eivá-lo. A presença de Liebman, em nosso País, no período de 1940 a 1946,
pode ser apontada como um dos fatores que mais contribuíram para esse apri-
moramentocientícoterminológicoelembrávamos ofatodeAlfredoBuzaid
ter sido um dos discípulos desse notável jurista italiano.
Nadaobstanteesseconsiderávelavançocientícoempreendidopelodiplo-
ma processual civil de 1973, ele, em determinados momentos, fez inadvertida
concessãoàlinguagemimprecisadoCódigode
OCPCdenãoincidiunosequívocosdosCódigosqueoprecederam
de mérito transitadas em julgado que tenha incorrido em quaisquer dos casos
previstos nos incisos I a VIII, desse preceptivo legal. De tal arte, o vocábulo de-
cisõescompreendecom vistasaoexercíciodaaçãorescisóriaassentenças os
acórdãoseasdecisõesinterlocutóriasdeméritoFoioquesustentamosdesde
sempre, em livros, palestras, conferências, artigos, e o mais, mesmo quando a
norma legal parecia não confortar a nossa opinião.
AConsolidaçãodasLeisdoTrabalhoelaboradasobainuênciadoCó-
digode ProcessoCivildefaz referênciano art à sentença
deliquidação quandose sabequeesseatojurisdicional dequanticação do
crédito do exequente, por não implicar a extinção do processo, não pode ser
classicadocomosentençae sim como decisão de traço interlocutório na
medida em que, de lege lata, a fase de liquidação, no processo do trabalho, cor-
responde a uma espécie de incidente (não típico) do processo de execução – e
nãoaumprocessoautônomo
Jáoprovimentojurisdicionalqueresolveosembargosàexecuçãoconsti-
tui, realmente, modalidade de sentença (irrepreensível, por isso, a linguagem
empregadapeloartartdaCLTporquantodotadodeecáciaextin-
tiva dessa ação (de embargos).
2. Mérito
ComoasseveramoshápoucooCódigodeProcesso Civilde lançou
por terra o obsoleto edifício do estatuto anterior, em que as sentenças que pu-
nhammaoprocessosemexamedoméritoeramdenominadasdeterminativas
e as que davam cobro ao processo com investigação do mérito recebiam o trata-
mentodedenitivas
Cadernos de Processo do Trabalho n. 40
9
Do ponto de vista do CPC de 1973 era absolutamente desnecessário veri-
carseseasentença adentraraou nãono méritodacausapoisesseaspecto
nãoeraessencialparaaconceituaçãodaqueleatojurisdicionalOquesedeveria
colocaràfrenteeraofatodetalatosermunidodeecáciaparadarmounão
aoprocessosearespostafossearmativaestaríamosdiantedeumasentença
se negativa, haveria que se procurar descobrir de que outra modalidade de pro-
nunciamento se tratava.
PosteriormentecontudoaLeinrevolucionouoprocessocivil
aorealizaraquiloqueadoutrinapassouadenominardesincretismoproces-
sualconsistenteemtrazeraclássicaexecuçãodetítulojudicialparaopróprio
processodeconhecimento Em decorrênciadisso no sistema daquele Código
a expressão execução foi substituída por cumprimento da sentença. Por força
dessa profunda transformação imposta no sistema, o legislador teve que refor-
mularoconceitodesentençaquepassouaseroatodojuizqueimplicaalguma
dassituaçõesprevistasnosartsedestaLei
OCPCdemanteveocumprimento da sentença (arts. 513 a 538), razão
pelaqualconceituou a setença como opronunciamentopormeio do qual o
juizcomfundamentonosartse põe mà fasecognitivadoprocedi-
mentocomumbemcomoextingueaexecução
Perguntasecomo ca o processo do trabalho diante dessa alteração do
conceitodesentençarealizadapeloCPCdeLeinemanti-
da, mutatis mutandis, pelo CPC de 2015? A resposta nos conduz a uma situação
deveras sui generis. Expliquemo-nos. Conforme vimos há pouco, o CPC de 1973,
anteriormenteao advento daLein separavaos processos de co-
nhecimentoedeexecuçãodetítulojudicialfatoquejusticouoseuconceitode
sentençacomooatopeloqualojuizpunhamaoprocessodeconhecimento
examinando, ou não, o mérito da causa (art. 162, § 1º). Como o processo do tra-
balho também separava os processos de conhecimento e de execução, caía-lhe
bem o conceito enunciado pelo art. 162, § 1º, daquele CPC. Desse modo, mesmo
tendooprocessocivilrealizadooprecitadosincretismoprocessualeemde-
corrência disso, reformulado o conceito de sentença, esse fato não afetou o pro-
cesso do trabalho, que mantém a separação dos processos de conhecimento e de
execução. Assim sendo, em que pese ao fato de o primitivo conceito de sentença,
estampado no art. 162, § 1º, do estatuto processual civil de 1973, ter sido refor-
mulado (e, de certa forma, repetido pelo art. 203, § 1º, do CPC de 2015), ele foi
incorporadoaoprocessodotrabalhopelaviatácitafoienmrecepcionadopor
esteprocesso especializadoQue ninguémsesobressaltecomnossa armação
arespeitodessarecepçãofenômenoperfeitamenteadmissívelnossítiosjurídi-
cos, inclusive processuais, bastando argumentar com os provectos princípios da
variabilidade e da fungibilidade, largamente utilizados na vigência do CPC de
semqueestivessemprevistosnesseCódigopreviamnosoCPCde
(arts. 809 e 810, respectivamente). Ditos princípios foram, pois, recepcionados,
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO