Sistema de justiça criminal e crise democrática: o desprezo da cláusula de igual proteção perante a lei

AutorAntonio Henrique Graciano Suxberger
Páginas329-348
329
COLEÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL
Antonio Henrique Graciano Suxberger1
CAPÍTULO 10
SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL E CRISE
DEMOCRÁTICA: O DESPREZO DA CLÁUSULA
DE IGUAL PROTEÇÃO PERANTE A LEI
1 Doutor e Mestre em Direito. Pós-doutor pelo Ius Gentium Conimbrigae da
Universidade de Coimbra. Professor do programa de mestrado e doutorado em
Direito do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) e dos cursos de especia-
lização da Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e
Territórios (FESMPDFT). Promotor de Justiça no Distrito Federal desde 2003.
E-mail: antonio.suxberger@ceub.edu.br. O autor agradece ao gentil convite dos
organizadores e os parabeniza pela eleição de temática tão necessária. A reexão
acadêmica sobre as diculdades ora enfrentadas pelo país é a certeza de que, tam-
bém no campo da produção de conhecimento, buscamos cumprir o compromisso
ético e político de mobilização por um mundo melhor.
RESUMO
A redução da democracia, no campo político-criminal, ao que
seja a democracia representativa esvazia o compromisso ético que
deve orientar a promoção da cláusula de igualdade perante a lei.
O artigo objetiva demonstrar a ausência do compromisso brasi-
leiro com essa cláusula, a partir da constatação de que as opções
políticas implementadas reforçam a seletividade do sistema de
justiça criminal. Colhem-se dois exemplos recentes de alteração
legislativa: a inserção pelo Congresso Nacional de detalhe proce-
dimental para o consco alargado, exigindo a indicação apurada
no início do processo criminal, e a lei que agravou a pena dos
maus tratos a cães e gatos.
DEMOCRACIA E RESILIÊNCIA NO BRASIL A DISPUTA EM TORNO DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
COLEÇÃO DIREITO CONSTITUCIONAL
PATRÍCIA PERRONE CAMPOS MELLO | THOMAS DA ROSA DE BUSTAMANTE ORGANIZADORES
330
INTRODUÇÃO
Partamos de uma premissa: o Brasil vivencia uma crise democrática. Tra-
ta-se de uma crise que, consideradas suas nuanças materiais, decorre das dicul-
dades de superação de um período formal e declaradamente autoritário antece-
dente à Constituição de 1988. Numa vertente expressa, a crise se apresenta com
nome e rosto a partir da vocalização inequívoca de arroubos autocráticos pelo
atual Governo de Jair Messias Bolsonaro. As visões se interrelacionam, pois a
crise que se imputa ao Presidente da República não o xa como marco inicial do
problema, mas como resultado de um processo mais complexo. Um Presidente
descompromissado com a democracia não é um dado contra o regime democrá-
tico, mas o produto de um contexto antecedente e mal resolvido.
A discussão sobre a democracia e a tensão entre avanços e retrocessos é
reetida também no campo político-criminal2. No presente trabalho, preten-
demos indicar que a crise democrática, quando tratamos do sistema de justiça
criminal, tem por consequência justamente a ausência de implementação (ou
preocupação) com a cláusula da igual proteção perante a lei. A seletividade da
justiça criminal é um dado, mas isso não implica naturalizá-la ou tomá-la por
insuperável. Ao contrário: o esforço de atenuação da desigualdade de acesso à
segurança e à justiça mostra-se justamente na maior ou menos presença demo-
crática na construção do sistema de justiça criminal.
2 Para uma discussão mais detida sobre como o debate democrático inuencia a
pauta político-criminal do Estado, Cf. SUXBERGER, Antonio Henrique Gra-
ciano. Ministério Público e política criminal: uma segurança pública compro-
missada com os direitos humanos. Curitiba: Juruá, 2010, cap. 3.
PALAVRAS-CHAVE
Crise democrática. Seletividade da justiça criminal. Igual prote-
ção perante a lei. Consco alargado. Maus tratos a cães e gatos.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT