Trabalho docente no Instituto Federal de São Paulo no contexto da Pandemia de Covid-19

AutorLiliane Bordignon de Souza
DOI: https://doi.org/10.5007/2175-7984.2021.79564
178178 –197
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Trabalho docente no Instituto
Federal de São Paulo no contexto da
pandemia de Covid-19
Liliane Bordignon de Souza
Resumo
Apresentamos, nesse artigo ,uma análise da organização e das condições do trabalho docente no
Instituto Federal de São Paulo durante o primeiro momento da pandemia de Covid-19 (março a ju-
lho de 2020). Para tanto, recorremos a dados levantados por meio de questionário e sistematizados
no relatório de pesquisa sobre o trabalho no IFSP, produzido pelo SINASEFE-SP. Observamos que,
antes mesmo da retomada do calendário letivo pela instituição, os(as) docentes já sinalizavam
que não possuíam as condições adequadas para o exercício do trabalho; que faltavam instrumen-
tos e ergonomia; que a pandemia provocou um embaralhamento entre atividades prossionais e
domésticas; que intensicou e estensicou o trabalho; e que tem provocado sofrimento psíquico.
As mulheres foram as mais afetadas por esse processo. Os dados revelam que as condições de tra-
balho dos(as) professores(as) no contexto da pandemia são bastante precárias, o que têm afetado
a qualidade do trabalho e do ensino, demonstrando os limites do trabalho remoto.
Palavras-chave: Trabalho e educação. Trabalho docente. Pandemia de Covid-19.
1 Introdução
No mês de março de 2020, as escolas brasileiras, os(as) professores(as)
e estudantes viram-se diante de três dilemas básicos: como preservar a vida
sem interromper o ensino sistemático? Como é possível garantir o ensino
regular remotamente a todos e todas? Ensino remoto é ensino sistemáti-
co? A escola pública (da educação infantil ao ensino superior), enquanto
instituição que agrega um conjunto diversos de trabalhadores(as) e estu-
dantes na sociedade brasileira, foi essencial no início da pandemia para
conter a crise social, especialmente pela organização da distribuição de
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 20 - Nº 48 - Mai./Ago. de 2021
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cestas básicas, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) (máscaras e
álcool gel) e distribuição de livros e outros materiais didáticos1. Além dis-
so, foram feitas arrecadações de dinheiro, alimentos, produtos de higiene
etc. para famílias de estudantes que caram sem recursos devido ao isola-
mento obrigatório2. No entanto, a questão que colocamos aqui é: o que
aconteceu com o trabalho dos(as) professores(as) nesse primeiro momento
da pandemia?O ensino sistemático parou por alguns meses, inclusive em
escolas privadas, dando lugar a um processo de reorganização da vida no
espaço público e privado. As famílias se viram, pela primeira vez, obrigadas
a trabalhar e conviver com as crianças e os(as) jovens o dia todo em casa,
sem o apoio do Estado. Além disso, elas puderam perceber, de diferentes
maneiras, as consequências da desinstitucionalização da infância e da ju-
ventude: o que fazer com essa energia criadora no interior de residências
pequenas e inapropriadas para abrigar diferentes gerações sem experiência
de convivência tão intensa? Nesse contexto de tensões, o ensino remoto e
as atividades remotas, em geral, apareceram como a panaceia da pandemia.
O mundo virtual pela tela, cujo uso excessivo por crianças e jovens é tão
questionado na sociedade3, tornou-se também o lugar da escola.Buscando
oferecer contribuições para o debate sobre educação e trabalho em um con-
texto de excepcionalidade, apresentamos a seguir uma análise da organiza-
ção e das condições do trabalho docente no Instituto Federal de Educação,
Ciência e Tecnológica de São Paulo (IFSP)4 durante o primeiro momento5
1 Exemplos de prefeituras e estados que utilizaram as escolas como meio de oferecer assistência social às famílias
podem ser encontrados em reportagem publicada no jornal Folha de São Paulo em 09 de abril de 2020, dis-
ponível em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2020/04/alunos-recebem-refeicao-diaria-cestas-basicas-e-
-vouchers-como-merenda.shtml. O Instituto Federal de São Paulo também realizou a distribuição de cestas
básicas e EPIs.
2 A Medida Provisória (MP) nº 934, de abril de 2020, convertida na Lei nº 14.040, de 18 de agosto de 2020, esta-
beleceu normas de excepcionalidade para os calendários da educação básica e da educação superior em função
do estado de calamidade pública provocado da pandemia, desobrigando os sistemas e as escolas dos 200 dias
letivos, mas mantendo a obrigatoriedade das 800 horas/aula anuais. Após a MP, o CNE emitiu, em 04 de maio,
o Parecer nº 5/2020, no qual “reconhece as fragilidades e desigualdades estruturais da sociedade brasileira, que
agravam o cenário decorrente da pandemia” e aponta recomendações.
3 A Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu o “vício em games” ou “distúrbio de games” na 11ª Classifi-
cação Internacional de Doenças (CID), problema bastante presente em crianças e jovens em idade escolar.
4 Doravante Instituto Federal de São Paulo ou IFSP.
5 Denominaremos, neste texto, como “primeiro momento da pandemia” os meses de março a agosto de 2020,
ocasião em que o IFSP suspendeu o calendário letivo, retomado em 10 de agosto de 2020.

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