O trabalho escravo como expressão latente da questão social

AutorBruno J. R. Boaventura - Ivone Maria Ferreira da Silva
CargoMestrando em política social pela UFMT - Doutora em Serviço Social pela PUC, SP
Páginas5-21
BOAVENTURA, B. J. R.; SILVA, I. M. F. da. 5
Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 16, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2013
O TRABALHO ESCRAVO COMO EXPRESSÃO LATENTE DA
QUESTÃO SOCIAL
Bruno J. R. Boaventura1
Ivone Maria Ferreira da Silva2
BOAVENTURA, B. J. R.; SILVA, I. M. F. da. O trabalho escravo como expres-
são latente da questão social. Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR. Umuarama. v.
16, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2013.
RESUMO: O presente texto elucida algumas implicações da escravidão para
efeito de comprovar a sua caracterização como expressão latente da raiz da ques-
tão social no Brasil Colônia. Traz de maneira introdutória a importância de tal
análise para as ciências sociais.
PALAVRAS-CHAVE: Questão social. Escravidão. Brasil Colônia. Formação
socio-histórica.
1 INTRODUÇÃO
A escravidão, conforme coloca Silva (2008) é categoria constituinte e
atual no processo de formação da sociedade brasileira, não podendo ser descola-
da da raiz latente da nossa questão social.
Evitamos, assim, com tal caracterização que a escravidão seja somente
um ramo da investigação social do que denomina de “relações raciais”, mas,
também, da investigação social da constituição da sociedade do trabalho no Bra-
sil, como muito bem ressalta Cardoso (2008). Tal premissa, é imprescindível
para que não caiamos no erro de acreditar que “tudo se passou como se a ordem
escravocrata tivesse sido enterrada com a abolição, não transferindo ao momento
posterior nada de sua dinâmica (e inércia) mais geral.”
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são latente das raízes da questão social do Brasil, estamos demonstrando a exis-
tência da base da cadeia produtiva da acumulação primitiva do capitalismo mer-
cantil para ascensão do projeto da modernidade. A modernidade no Brasil não é
a dupla face da moeda da burguesia (Revolução Francesa e Revolução Inglesa)
é a face negra do escravo marcada a ferro e fogo pelo senhor. É essa a face que
evidencia a desumanidade da mercantilização total da vida, quando a base de
uma ordem é a máxima do lucro pela exploração da pessoa como mercadoria.
Esse, sim, é o dilema brasileiro da modernidade, baseado na chamada por Ianni
1Mestrando em política social pela UFMT.
2Doutora em Serviço Social pela PUC – SP.
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Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 16, n. 1, p. 5-21, jan./jun. 2013
(2004) de “dialética escravo e senhor no curso da história do mundo moderno”,
senão vejamos:
Vista assim, em perspectiva ampla, a história do mundo moderno é
também a história da questão racial, um dos dilemas da modernidade.
Ao lado de outros dilemas, também fundamentais, como as guerras
religiosas, as desigualdades masculino-feminino, o contraponto natu-
reza e sociedade e as contradições de classes sociais, como revela-se
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as suas implicações sociais, políticas, econômicas, culturais, ideo-
lógicas, pode ser vista como uma expressão e um desenvolvimento
fundamentais do que tem sido a dialética escravo e senhor no curso
da história do mundo moderno. A dialética do escravo e do senhor
pode ser tomada como uma das mais importantes alegorias do mundo
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2004).
Teremos, então, o percurso de evidenciar a latência da escravidão como
raiz da questão social nos seguintes aspectos do início da formação social brasi-
leira: a formação arquitetônica da cidade no Brasil Colônia centrada no pelouri-
nho; a formação do povoamento por colonos degradados sobressalta as relações
do trabalho escravo; a formação econômica baseada no escravismo colonial; a
formação do privatismo no Brasil; o Estado na colônia a serviço da escravidão;
a formação da ética católica como espírito escravista; a formação política do
liberalismo brasileiro: o livre comércio do trabalho escravo.
2 ESTADO, E SOCIEDADE NA ORDEM ESCRAVISTA NO BRASIL
2.1 A CIDADE CENTRADA NO PELOURINHO
Nenhum estudioso da escola de navegação de Sagres poderia imaginar
que a descoberta de Cabral não seria apenas “uma ilha grande e boa para refres-
co e aguada dos navios que fossem à India” como foi dito pelo próprio el-rei
d.Manuel (FLEIUSS, 2004).
O interesse, o único, que fazia homens enfretarem oceanos, famílias
serem desfeitas, o Rei desprezar a descoberta, o chamar do vento nas velas das
grandes navegações, não era encontrar um mundo novo, não era povoar, era o
compulsório desejo em estabelecer uma nova rota comercial com o Oriente, a
princípio nada mais importava (PRADO JUNIOR, 1999, p. 43).
Os embriões dos núcleos de organização político-administrativa na terra
de Santa Cruz se desenvolveram a partir de feitorias construídas em certos pon-
tos estratégicos ao longo do litoral para que houvesse uma constante vigilância

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