Trajetórias posit(ihv)as de cuidado? Apropriação do tempo e do trabalho de mulheres que vivem com hiv/aids

AutorRenata Alves César Fernandes, Evandro Alves Barbosa Filho, Ana Cristina de Souza Vieira
Páginas57-77
2GÊNERO | Niterói | v. 22 | n. 2 | p. 2-2 | 1. sem 2022
EDITORIAL
2
EDITORIAL
Nesta edição da revista Gênero, apresentaremos o dossiê Gênero,
Políticas Públicas e Serviço Social, organizado pelas professoras doutoras
Luciana Zucco e Teresa Kleba L isboa, ambas da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), e pela professora doutora Magali Silva Almeida,
da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Serão apresentadas discus-
sões sobre gênero e a interseccionalidade entre raça e classe; sexualidade;
violência; migração feminina; encarceramento de mulheres; e suas inter-
faces com as políticas públicas, visando contribuir para o aprofundamento
dos estudos sobre a temática no serviço social. Esses estudos são de
grande relevância em um contexto de graves retrocessos no campo das
políticas públicas e de avanço do racismo e da violência contra mulheres,
homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais devido ao neoconservado-
rismo e ultraneoliberalismo que dominam o Estado brasileiro.
Ademais, esta edição conta com uma série de artigos de temas livres,
como adoção por casais do mesmo sexo; mulheres e esporte; participação
feminina na democracia portuguesa; feminismo negro; abor to; e trabalho
doméstico. Oferece, ainda, duas resenhas: uma sobre o livro E se fosse você?
sobrevivendo às redes de ódio e fake news, de autoria de Manuela d’Ávila;
eoutra sobre o livro Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano,
que tem como autora Grada Kilomba. Sendo assim, convidamos a todas
e todos, da comunidade acadêmica ou não, que possuem interesse pelos
estudos de gênero a desfrutar de uma ótima leitura.
Equipe editorial:
João Bosco Hora Góis
Kamila Cristina da Silva Teixeira
Sidimara Cristina de Souza
GÊNERO | Niterói | v. 23 | n. 1 | p. 57-77 | 2. sem 2022 57
TRAJETÓRIAS POSIT(IHV)AS DE CUIDADO? APROPRIAÇÃO
DO TEMPO E DO TRABALHO DE MULHERES QUE VIVEM
COM HIV/AIDS
Renata Alves César Fernandes1
Evandro Alves Barbosa Filho2
Ana Cristina de Souza Vieira3
RESUMO: O artigo analisa a exploração e a apropriação do tempo de mulheres
que vivem com HIV/Aids no trabalho doméstico e de cuidado não remune-
rado.O estudo é qualitativo, e suas análises se fundamentam no feminismo
materialista e de estudiosos críticos do campo de HIV/Aids. A pesquisa de
campo ocorreu em 2020, num hospital universitário, em Pernambuco, sendo
realizadas entrevistas em profundidade, análise documental, observação,
registro em diário de campo e revisão bibliográfica. Foi possível identificar a
sobrecarga e a naturalização do trabalho não pago e os impactos desse tipo
de trabalho nos processos de autocuidado entre as participantes da pesquisa.
PALAVRAS-CHAVE: Trabalho não pago. Mulheres. HIV/Aids.
ABSTRACT: The paper analyzes the exploitation and appropriation of time
of women living with HIV/AIDS in domestic and unpaid care work. The study
is qualitative, and its analyzes are based on materialist feminism and critical
scholars in the field of HIV/AIDS. The Field research took place in 2020, in
a university hospital, in Pernambuco State, Brazil, within-depth interviews,
document analysis, observation, fielddiaryandliterature review. It was possible
to identify the burden and naturalization of unpaid work and their impacts
on self-care processes among the research participants.
PALAVRAS-CHAVE: Unpaidwork. Women, HIV/SIDA.
1 renata.cesar@upe.br
2 evealves85@yahoo.com.br
3 anacvieira12@gmail.com
Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons – Atribuição Não-
Comercial 4.0 Internacional.
2GÊNERO | Niterói | v. 22 | n. 2 | p. 2-2 | 1. sem 2022
EDITORIAL
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EDITORIAL
Nesta edição da revista Gênero, apresentaremos o dossiê Gênero,
Políticas Públicas e Serviço Social, organizado pelas professoras doutoras
Luciana Zucco e Teresa Kleba L isboa, ambas da Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), e pela professora doutora Magali Silva Almeida,
da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Serão apresentadas discus-
sões sobre gênero e a interseccionalidade entre raça e classe; sexualidade;
violência; migração feminina; encarceramento de mulheres; e suas inter-
faces com as políticas públicas, visando contribuir para o aprofundamento
dos estudos sobre a temática no serviço social. Esses estudos são de
grande relevância em um contexto de graves retrocessos no campo das
políticas públicas e de avanço do racismo e da violência contra mulheres,
homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais devido ao neoconservado-
rismo e ultraneoliberalismo que dominam o Estado brasileiro.
Ademais, esta edição conta com uma série de artigos de temas livres,
como adoção por casais do mesmo sexo; mulheres e esporte; participação
feminina na democracia portuguesa; feminismo negro; abor to; e trabalho
doméstico. Oferece, ainda, duas resenhas: uma sobre o livro E se fosse você?
sobrevivendo às redes de ódio e fake news, de autoria de Manuela d’Ávila;
eoutra sobre o livro Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano,
que tem como autora Grada Kilomba. Sendo assim, convidamos a todas
e todos, da comunidade acadêmica ou não, que possuem interesse pelos
estudos de gênero a desfrutar de uma ótima leitura.
Equipe editorial:
João Bosco Hora Góis
Kamila Cristina da Silva Teixeira
Sidimara Cristina de Souza
GÊNERO | Niterói | v. 23 | n. 1 | p. 57-77 | 2. sem 2022
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INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é analisar a exploração e a apropriação do tempo
das mulheres que vivem com HIV/Aids no trabalho doméstico e de cuidado
não remunerado, devido à sua contínua vulnerabilidade, que é agravada pela
iniquidade social e pelas relações assimétricas de poder entre homens e mulheres,
conforme Barbosa Filho e Rocha (2018).
A relevância do tema deve-se aos dados referentes à epidemia do HIV/Aids,
compreendendo sua dinâmica, com indicativo de uma expressiva desigualdade
social, pauperização e feminização da doença; o outro aspecto tem relação com
o número de óbitos e abandono no tratamento entre as mulheres positivas
para HIV. Vale ressaltar a importância de se conhecer as mulheres cuidadoras
que vivem com HIV/AIDS, assim como abordar a sobrecarga do trabalho de
cuidado dessas mulheres no âmbito familiar e doméstico.
Tal reflexão foi resultado da pesquisa realizada no ano de 2020, com nove
mulheres que vivem com HIV/Aids (cisgênero e/ou transgênero soropositivas,
maiores de 18 anos, atendidas no ambulatório e/ou enfermarias de infecto-
logia), num hospital universitário de Recife/PE, por meio de entrevistas em
profundidade, através de amostra não probabilística. O estudo está ancorado
no feminismo materialista francófono, que possibilita compreender o trabalho
de cuidado no capitalismo e suas transformações, na perspectiva da divisão
sexual do trabalho, levando em conta a consubstancialidade raça/etnia. Neste
artigo, as mulheres serão identificadas pela numeração da entrevista (E), dada
a necessidade ética de manter o sigilo.
A pesquisa possibilitou trazer à tona a problematização e a discussão
sobre a condição das mulheres no âmbito familiar, particularmente daquelas
que vivem com HIV/Aids. No cotidiano das mulheres, esse tipo de trabalho
ainda é visto como algo natural e de responsabilidade feminina, corroborando
a ideia de que são elas as principais cuidadoras de crianças, de pessoas idosas,
de pessoas com deficiência e de adultos mesmo em idade produtiva.
Nesse sentido, considera-se que no modo de produção capitalista há
um reforço dos lugares sociais que homens e mulheres ocupam, construídos
historicamente, especialmente nas relações sociais de produção e reprodução
social. A sociabilidade do capital também é regida pelo controle da moral e
dos comportamentos para garantir a ordem, a família nuclear nos moldes
burgueses, a produção e a reprodução social, relações muitas vezes marcadas
pela violência (BRUSCHINI, 2005; FEDERICI, 2004).

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