Transparencia do Banco Central e mercado financeiro: evidencias para o caso brasileiro.

AutorFerreira de Mendon
CargoTexto en Portuguese
  1. Introdução

    Os novos modelos de pré-comprometimento, utilizados pelos gestores da política monetária, se desenvolveram, em paralelo, à evolução das formas de comunicação do banco central (BC). A adoção de âncoras nominais nos anos 1990 mostra a importância da comunicação do BC na condução das expectativas de inflação dos agentes econômicos. A partir de então, o regime de metas explícitas (inflação, agregados monetários e câmbio) tem sido utilizado por muitos países industrializados e em desenvolvimento.

    Com o passar do tempo, a prática dos BCs mostrou que os modelos de regras estritas eram falhos e que as incertezas do mundo real exigiam a utilização de modelos híbridos. Estes modelos combinam regras com discrição e criam soluções para alguns dilemas vividos pelas autoridades monetárias. Por exemplo, como reagir aos choques de oferta, ao desvio da meta de inflação e como explicar políticas restritivas em períodos de baixa inflação (sem que haja perda de credibilidade do BC). Neste contexto, a transparência do BC torna-se uma importante ferramenta de ligação entre as ações de curto prazo do BC e seus objetivos de longo prazo. São exemplos dessa conduta, a utilização de regras de previsão (forecast), as explicações relativas à duration da taxa de juros e a publicação de metas de inflação de longo prazo.

    A necessidade de a autoridade monetária publicar suas previsões sobre a economia e, desta forma, criar uma nova (adicional) âncora nominal, tem sido debatido em diversos BCs. Muller & Zelmer (1999) estudaram o efeito da publicação do BC sobre previsões de choques de oferta no mercado financeiro canadense. No que diz respeito à redução das incertezas para os investidores, os resultados obtidos reforçam a importância destas publicações. A justificativa é que as expectativas são formadas a partir de um conjunto de informações mais amplo.

    Além do argumento acima, é esperado que a transparência econômica do BC ajude os agentes econômicos a anteciparem as ações de política monetária e que, por conseguinte, evite possíveis perdas de capital. A idéia é que a transparência reduz a incerteza por meio de aumento do conjunto de informações dos agentes econômicos promovendo uma menor assimetria de informações. Destarte, a transparência do BC tem um papel relevante na redução do prêmio de risco dos ativos e no aumento da eficiência do mercado financeiro.

    O principal objetivo deste artigo é uma análise empírica dos efeitos da transparência do Banco Central do Brasil sobre o mercado financeiro brasileiro. Além desta introdução, o artigo encontra-se estruturado em mais duas seções. Na seção 2 faz-se uma apresentação sobre os referenciais teóricos e empíricos relativos à transparência do BC. Na seção 3 faz-se um estudo empírico sobre o impacto das diferentes dimensões da transparência do Banco Central do Brasil (BCB) nos juros futuros e, por sua vez, na curva de juros da economia brasileira. Por fim, é apresentada a conclusão.

  2. Revisão da Literatura

    Alguns autores como Siklos (2000), Muller & Zelmer (1999), Chada & Nolan (2001), Geraats (2002), Chortareas et al. (2002), e Gürkaynak et al. (2005) estudam, de forma empírica, os efeitos da transparência do BC nas variáveis macroeconômicas e destacam os benefícios desta transparência para a economia.

    Siklos (2000) mostra que períodos de maior transparência estão relacionados com períodos de curióse mais elevada e, portanto, com maior conteúdo informacional. Muller & Zelmer (1999) enfatizam que o spread da taxa de juros (na economia canadense) reage, de forma significativa, às decisões de política monetária anunciadas pelo BC canadense. Conforme destacado por Clare & Courtenay (2001) os mercados financeiros ficaram mais eficientes depois da introdução da independência operacional do BC do Reino Unido. Neste caso, os agentes econômicos reagiram, de forma mais intensa, nos cinco primeiros minutos depois do anúncio da meta de juros (aumenta a eficiência e reduz a possibilidade de arbitragem). Além disso, o efeito total sobre as variáveis macroeconômicas é menor do que nos períodos em que o BC não era transparente, ou seja, aumentou o poder do BC em ancorar as expectativas dos agentes econômicos.

    Chortareas et al. (2002) também se mostram favoráveis à transparência do BC. O destaque refere-se à transparência relativa às publicações das previsões de inflação, uma vez que a inflação é mais baixa em países que publicam tais informações. Gürkaynak et al. (2005) mostram que os juros futuros são afetados por notícias relativas à meta de inflação e à meta da taxa básica de juros da economia. Neste caso, os autores supracitados reforçam que as informações sobre a política monetária afetam variáveis de longo prazo e, não apenas, variáveis de curto prazo.

    O trabalho de Fry et al. (2000) dá destaque à transparência do BC como uma ferramenta que possibilita o BC ser discricionário em um ambiente de regras. Dos 94 países estudados pelo autor, em 1990, apenas 57% deles adotavam metas explícitas. Em 1998 este número subiu para 97% ilustrando a tendência de utilização de uma âncora nominal para guiar as expectativas do público. Além disso, a maioria destes países faz análises forward-looking e publicam previsões em forma de gráficos, números ou palavras. Destarte, quase 25% destes países publicam discussões regulares sobre erros de previsões. Segundo o autor sobredito, os dirigentes destes BCs destacam a transparência como o terceiro atributo mais importante na condução da política monetária.

    Os trabalhos teóricos sobre transparência do BC também mostram a sua importância na condução da política monetária. Muitos destes trabalhos estudam os impactos da publicação da meta de inflação, das explicações sobre as decisões de política monetária e das informações sobre o futuro da economia.

    Svensson (1999) utiliza um modelo em que o BC se compromete a minimizar sua função de perda e constrói resultados teóricos sobre a influência do grau de transparência do BC na efetividade da política monetária. O autor supracitado defende a importância da transparência sobre a accountability e sobre a credibilidade do BC. De acordo com esse modelo, a transparência explicita a meta de emprego (que até então era informação privada do BC) e impossibilita que o BC haja com oportunismo para conter choques idiossincráticos. Esta contingência conduz o BC a ter uma postura mais responsável com relação ao governo, ao público e ao legislativo. Assim, em regimes de metas de inflação implícitas, Svensson (2001) defende a publicação do erro de controle, uma vez que esta publicação deixa explícita a preferência do BC (expost). Nesse caso, a meta de inflação pode ser obtida por meio de um resíduo, isto é, levando-se em consideração a inflação efetiva e o erro de controle. Em suma, a publicação do erro revela, para o público, as preferências do BC.

    Jensen (2000) enfatiza um outro efeito decorrente do anúncio da meta de inflação, isto é, o aumento na sensibilidade da credibilidade do BC às suas ações. Neste caso, o anúncio atua como um mecanismo de comprometimento da autoridade monetária. O autor sobredito alerta que uma maior transparência só é recomendável quando existe informação privada. Caso contrário, o BC incorrerá em custos desnecessários de revelação (custos operacionais e custos de flexibilidade), uma vez que ele se auto-restringirá no processo de reação a choques adversos.

    Morris & Shin (2000) também defendem que a publicação das informações do BC é um fator determinante para o controle das expectativas de inflação. Os autores sobreditos alertam para o fato de que estas expectativas têm uma alta sensibilidade à transparência do BC e, portanto, discussões equivocadas sobre erros passados produzem ruídos que causam incertezas para os agentes econômicos. Assim, os efeitos benéficos da publicação da meta de inflação e das explicações do BC têm efeito contrário se as informações não tiverem qualidade.

    Alguns autores defendem a publicação das metas de inflação e seu cumprimento estrito como política de construção da reputação e da credibilidade do BC. Athey et al. (2001), Herrendorf (1998), Brunilla & Lahdenperã (1995) destacam que a política ótima do BC é cumprir a meta de inflação. Além disso, Svensson (2001) afirma que tal cumprimento é a principal ferramenta para influenciar as expectativas de inflação. O autor...

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