O triunfo da micro-história

AutorPetrônio José Domingues
CargoDoutor em História (USP); Professor Adjunto da Universidade Federal de Sergipe.
Páginas169-172

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Petrônio José Domingues1

FAUSTO, Boris. O crime do restaurante chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

A historiografia brasileira é dinâmica e mutante, adaptandose dialeticamente a cada contexto histórico. A crise do marxismo e o sepultamento dos referenciais estruturalistas, de um lado, e a descrença na razão, as retóricas pósmodernistas, a ascensão dos movimentos específicos (como o das mulheres, dos negros, dos gays, dos índios, dos ambientalistas) e a emergência do neoliberalismo, de outro, levaram milhares de pessoas a se desencantarem com as grandes ideologias; a abandonarem a perspectiva de transformações sistêmicas na sociedade. Este novo cenário histórico se refletiu na prática historiográfica, contribuindo para redefinir os pressupostos teóricometodológicos, os recortes temáticos e o uso das fontes. Novas abordagens, novos problemas e novos objetos entraram em pauta. Se, no passado, as interpretações predominantes tinham a ambição de produzir uma história total, hoje essa ambição foi praticamente descartada. De forma notável, as abordagens macros e generalizantes perdem cada vez mais espaço para as incursões micros, centradas em questões específicas. É neste novo cenário historiográfico que se insere o livro O crime do restaurante chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30, de Boris Fausto, que ora será resenhado. Publicado no primeiro semestre de 2009, o livro foi acolhido com entusiasmo pela mídia e pelo mercado editorial, chegando a comparecer às listas dos livros mais vendidos de nãoficção. A acolhida do mundo acadêmico não tem sido menos positiva.

Mas do que trata a obra? No dia 2 de março de 1938, em plena QuartaFeira de Cinzas, a cidade de São Paulo amanheceu com a notícia de um crime que abalou a opinião pública. Em um restaurante chinês, da rua Wenceslau Braz, número 13, no centro da cidade, quatro pessoas foram cruelmente assassinadas. Duas delas, o lituano José Kulikevicius e o brasileiro Severino Lindolfo Rocha, eram funcionários do restaurante e foram abatidos depois de terem recebidos vários golpes de um grosso cilindro de madeira. Já as duas outras pessoas, tratavamse do casal de proprietários do estabelecimento. Ele – HoFung, um imi-

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grante chinês – foi violentamente espancado, sofreu várias fraturas na cabeça e, por fim, morreu asfixiado por um laço, apertado em torno do pescoço. Ela – Maria Akiau, uma brasileira, filha de chineses – morrera por último, por esganadura, com um laço de tecido...

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