O Processo de Internacionalização de uma Empresa Brasileira de Artigos Esportivos: uma experiência no mercado alemão

AutorMario Cesar Barreto Moraes - Graziela Dias Alperstedt - Lilian Silvestre Laranjeira
CargoDoutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina. - Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC. - Mestrado Profissional em Administração. Centro de Ciências da Administração e Sócio-Econômicas - ESAG/UDESC.
Páginas254-281

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Mário Cesar Barreto Moraes 1

Graziela Dias Alperstedt 2

Lilian Silvestre Laranjeira 3

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1 Introdução

O comércio internacional é uma prática de negócios secular, que remonta ao tempo feudal, no qual foi potencializado com os descobrimentos marítimos pelo mercantilismo no Século XVI. Nesse sentido, o desenvolvimento do comércio internacional acompanhou a evolução da civilização humana, aperfeiçoando as atividades de trocas até chegar à complexidade do comércio atual.

No mercantilismo uma das atividades era manter as exportações sempre maiores do que as importações para assegurar uma balança comercial positiva. As importações deviam vir preferencialmente de lugares distantes, de modo a não enriquecer países vizinhos, bem como negociantes rivais (STRATHERN, 2000).

No decorrer dos anos seguintes, a Revolução Industrial veio reconfigurar e impulsionar a economia mundial juntamente com a contribuição de renomados pensadores que deixaram sua marca ao longo da história. Dentre esses autores estão Adam Smith, com sua visão de livre mercado, e David Ricardo, com a teoria das vantagens comparativas. Esta última teoria é aplicada às condições mais complexas da economia mundial de hoje. Sua aplicação consiste em situações que envolvam mais de dois países e também para comércio que envolva mais de dois produtos (STRATHERN, 2000).

A interdependência entre países, entretanto, é compreendida de forma mais proeminente nos anos pertencentes à última década do Século XX. Nesse momento cresceu entre empresários e demais indivíduos da sociedade a percepção de que a interrelação dos países era uma necessidade para comportar as crescentes mudanças nos campos tecnológico, social, político e cultural.

A participação no comércio internacional pelo Brasil vem a tomar corpo nos anos 90, durante o governo Collor, quando houve uma abertura do mercado financeiro mundial à emissão de títulos originários de países com interrupções no pagamento de suas dívidas externas nos anos 80. Isso ocorreu em decorrência do afrouxamento das condições de crédito e forte redução das taxas de juros dos países desenvolvidos. A atração de investimentos iniciou o desenvolvimento de infraestrutura e tecnologia.

Mesmo diante dessa iniciativa de abertura ao comércio internacional, há o fato de a economia encontrarse ainda fechada à globalização. Segundo Paduan (2005), o Brasil possui barreiras comerciais das mais altas e não conta com nenhum acordo de livre comércio para valer.

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A participação do Brasil no cenário internacional de exportações deixa a desejar em comparação aos outros países, pois apenas representa 1,13% (BACEN, 2006). Em Santa Catarina, do volume total de exportações em 2004, segundo dados da FIESC, dentre outros produtos, 16% foram decorrentes dos setores de alimentos e bebidas, 15% de madeira, 15% de móveis e indústrias diversas, 9% máquinas e equipamentos e 9% vestuário e acessórios.

As empresas brasileiras, segundo Rocha e Christensen (2002), se deparam com vários obstáculos quando o objetivo é internacionalizar. Além de questões relativas à tecnologia, qualidade do produto, mão de obra, transportes e distância física dos mercados, boa parte das empresas enfrenta a insuficiência de recursos financeiros, baixa competitividade de preços, barreiras institucionais (com legislação complexa, falta de acordos e procedimentos demasiadamente burocráticos) e falta de orientação para o mercado externo.

Por outro lado, ainda há um fator que contribui para diminuir a expansão internacional. Na ótica de alguns empresários, focar no mercado doméstico parece por vezes já ser suficiente. O mercado interno é bastante expressivo se comparado com mercados de outros países com menor população. Entretanto, olhar para o exterior como fonte de novas oportunidades é algo que precisa ser estimulado para que as empresas brasileiras se tornem mais competitivas, permitindo assim que seus processos, produtos e serviços apresentem acréscimos de melhorias.

Sob tal entendimento, com o propósito de ampliar os conhecimentos sobre internacionalização de organizações, esta pesquisa se propôs a estudar o processo de internacionalização de uma empresa brasileira de artigos para a prática do surfe, entre os anos 1987 e 2005 no mercado alemão. Apesar de centrada no mercado da Alemanha, a pesquisa revela informações do que acontece em outros países, particularmente, na Europa. Vale destacar que tais dados contribuem com a análise do processo de internacionalização, pelo aporte de particularidades nacionais, especialmente aquelas de natureza cultural, extraídas da coleta de dados no próprio mercado da Alemanha.

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2 Fundamentos Teóricos
2. 1 O Processo de Internacionalização de Empresas

Muitos pesquisadores vêm buscando desvendar o movimento de expansão internacional de empresas em função de distintos fatores, tais como: competitividade, representatividade da firma para a indústria, proximidade cultural e ou geográfica, dentre outros.

Um ponto convergente observado entre os autores está em compreender a internacionalização de uma entidade organizacional como parte de um processo, algo que envolve diferentes fases de mudanças em um continuum ? desde o começo até o término de um determinado evento (DE VEM; POOLE; SCOTT, 1995). Assim sendo, de acordo com Calof e Beamish (1995, p. 116) a internacionalização de empresas é “um processo de adaptação das operações de uma empresa (estratégia, estrutura, recursos, dentre outros fatores) aos ambientes internacionais”(tradução livre).

Os primeiros estudos sobre internacionalização do Brasil, realizados pela Fundação Dom Cabral em décadas anteriores a 1980, compreendiam como internacionalização somente as ações que pressupunham a presença física da empresa no exterior. Esses pesquisadores não consideravam o processo como um todo, que pode ser mais abrangente, como descrevem Johanson e Vahlne (1977).

Andersen (1993) classifica as teorias que descrevem o processo de expansão internacional entre dois arcabouços teóricos: o UModel denominado Modelo de Internacionalização de Uppsala, no qual o processo de internacionalização se dá em forma de ciclos causais e ênfase na teoria do conhecimento; e o IModel que é decorrente de autores que, inspirados no modelo anterior, consideraram o processo de internacionalização mais eficiente e inovador quando ele advém de uma sequência de passos planejados e deliberados. Dentre esses autores, Bilkey e Tesar (1977), Cavusgil (1980) Czinkota et al. (2004) e Reid (1981) percebem o processo de internacionalização como produto de uma análise racional e não somente em face do acúmulo de conhecimento e experiência acerca do mercado.

O UModel provém dos pioneiros estudos da Escola de Uppsala na Suécia, tais estudos foram desenvolvidos principalmente por Johanson e Valne no final da década de 70. A partir dos estudos, percebeuse que a internacionalização de empresas é o produto de uma série de decisões

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incrementais, sustentados pela teoria do crescimento da firma de Edith Penrose (HEMAIS; HILAL, 2002).

Desse modo, de acordo com Johanson e Vahlne (1977), o processo de internacionalização foca na aquisição, integração e uso de conhecimento de forma sequencial sobre os mercados externos e operações, ampliando assim o grau de comprometimento da firma em seus mercados externos. Isso significa que, quanto melhor for o conhecimento acerca do mercado, mais valiosos serão os recursos e mais forte será o comprometimento da empresa com esse mercado. Portanto, conhecimento e comprometimento compõem os elementoschave para a internacionalização de empresas sob a ótica de Johanson e Vahlne (1977). Segundo esses autores, a definição de conhecimento é subdividida entre experimental, geral e específico do mercado.

Nesse sentido, o modelo dinâmico de Uppsala expressa, por conseguinte, que as operações de internacionalização ocorrem passo a passo (de forma incremental) em face da aquisição gradativa de conhecimento e comprometimento. Tal processo de internacionalização começa sem atividades regulares de exportação, depois via agentes independentes, posteriormente estabelecendose uma subsidiária de vendas no país destino e eventualmente iniciandose a produção no país exterior. A dinâmica desse processo de internacionalização é propiciada de modo incremental, à medida que as barreiras psicológicas são superadas com ganhos de conhecimento e comprometimento.

Já o IModel reúne autores como Czinkota et al. (2004) e Reid (1981), bem como Yip Biscarri e Monti (2000). Todos consideram o processo de internacionalização por meio de sequência de estágios, no qual Czinkota et al. (2004) e Reid (1981) descrevem os possíveis modos de entrada no exterior, conforme anteriormente apresentado.

De acordo com Czinkota et al. (2004), seu modelo de internacionalização auxilia as empresas a encontrarem o seu estágio de internacionalização vigorante, assim como as mudanças para continuar o progresso. O modelo envolve na primeira fase os elementos: estímulos internos e externos, informação, experiência e percepção, agentes de mudança internos e externos. Na fase seguinte: atividades referentes a informações, mecanismos, comunicação, esforço de vendas, serviço, entrega e regulamentos. Após a firma integrar e avaliar esses elementos, há a terceira fase: exportação, que pode ocorrer por acordo, interesse, experimentação, avaliação ou

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adaptação. Mediante bom desempenho nas exportações, a firma parte para a quarta fase: o licenciamento, a franquia ou as alternativas...

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