Uma realidade patrimonialista: análise jurídico sociológica do estado burocrático brasileiro

AutorHorácio Monteschio e Valéria Juliana Tortato Monteschio
Ocupação do AutorPós-Doutor na Universidade de Coimbra - Portugal e pelo UNICURITIBA, Paraná - Brasil/Graduação em Direito pela Universidade Estadual de Maringá
Páginas339-355
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UMA REALIDADE PATRIMONIALISTA: ANÁLISE JURÍDICO
SOCIOLÓGICA DO ESTADO BUROCRÁTICO BRASILEIRO
Horácio Monteschio1
Valéria Julia na Tortato Monteschio2
Resumo: Procurou-se investigar em certos elementos do processo
civilizatório brasileiro as raízes do patrimonialismo e a consequente
confusão entre o público e o privado. Também investigou-se o
descompasso entre um sistema racional-legal baseado na impessoalidade
da lei e o sistema patrimonialista de relações baseado em relações de
amizade. A consequência desse patrimonialismo surtiu na presença de
excessivas normas e regulamentos estatais dificultam a contratação com a
atividade privada no Brasil.
Palavras chave: Patrimonialismo; razão-legal; desconfiança; atividade privada.
Abstract: It was sought to investigate in certain elements of the Brazilian
civilizing process the roots of patrimonialism and the consequent confusion
between the public and the private. Also investigated the mismatch between a
rational-legal system based on the impersonality of the law and the
patrimonialist system of relations based on friendly relations. The consequence
of this patrimonialism was in the presence of excessive norms and state
regulations hinder the contracting with the private activity in Brazil.
Keywords: Patrimonialism; rational-legal; mistrust; private activity.
1 Pós-Doutor na Universidade de Coimbra - Portugal e pelo UNICURITIBA, Paraná - Brasil. Pós-
Doutorado. Mediterranea International Centre for Human Rights Research, MICHR, Itália.
Doutor em Direito pela Faculdade Au tônoma de São Paulo- FADISP. Mestre em Direitos da
Personalidade - UNICESUMAR. Professor titular do Programa de mestrado da UNIPAR.
Professor colaborador do mestrado do CERS Pernambuco. Integrante do Instituto dos
Advogados do Paraná (IAP). E-mail: h.monteschio@uol.com.br
2 Graduação em Direito pela Universidade Estadual de Maringá. Graduação em Peda gogia, pós
graduação na área educacional - supervisão e gestão. Mestre em Políticas Públicas da Educação
pela Universidade Tuiuti do Paraná. E-mail: vatortato@yahoo.com.br
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INTRODUÇÃO
Numa breve investigação acerca da formação civilizatória do Brasil,
nota-se que a sociedade ainda padece de uma confusão entre o público e o
privado, sendo essas relações muito mais fundadas na amizade, no compadrio
do que em um sistema racional-legal e impessoal. São essas raízes
patrimonialistas, que ainda subsistem no seio da administração pública
brasileira, que se constituem em um dos grandes entraves nas relações
obrigacionais e em um ambiente de notória desconfiança. Trata-se o presente de
um estudo preliminar, geral e introdutório.
AS RAÍZES PATRIMONIALISTAS DO BRASIL
A obra Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda talvez ainda seja
a de maior subsídio teórico para se entender a formação ética da sociedade
brasileira. Em caráter instrumental, optou-se por adotá-la como referencial por
ser um clássico da historiografia e a sua construção teórica ser dotada de
suficiente coesão para dar segurança ao desenvolvimento do tema.
A obra do historiador paulista tinha como escopo delinear uma
psicologia do povo brasileiro. Aquilo que Sérgio Buarque de Holanda chamou
de “homem cordial”. Ele afirma que o cerne da noção de homem cordial não
estaria necessariamente na referência direta ao significado literal da expressão.
Na realidade, ao referir-se à cordialidade, o autor busca enfatizar uma
característica marcante do modo de ser do brasileiro, ou seja, uma dificuldade
de cumprir os ritos sociais que sejam rigidamente formais, não pessoais e
afetivos; também de separar, a partir de uma racionalização destes espaços, o
público do privado. Mais do que uma espécie de indivíduo, a cordialida de
perpassa, em maior ou menor escala, a todos os atores sociais no Brasil. Afirma
o autor:
A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes
tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam,
com efeito, um traço definido do caráter brasileiro, na
medida, ao menos, em que permanece ativa e fecunda a
influência ancestral dos padrões de con vívio humano,
informados no meio rural e patriarcal. Seria engano supor
que essas virtudes possam significar “boas maneiras”,
civilidade. São antes de tudo expressões legítimas de um
fundo emotivo extremamente rico e transbordante. Na

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