Valença - 2ª vara criminal

Data de publicação17 Outubro 2022
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição3199
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE VALENÇA
INTIMAÇÃO

8003723-67.2022.8.05.0271 Pedido De Medida De Proteção
Jurisdição: Valença
Requerente: M. P. D. E. D. B.
Requerido: A. C. F. D. S.
Terceiro Interessado: A. S. F. D. S.

Intimação:

Poder Judiciário do Estado da Bahia
Comarca de Valença

2ª Vara Crime, Infância e Juventude


PROCESSO Nº: 8003723-67.2022.8.05.0271

PEDIDO DE MEDIDA DE PROTEÇÃO (12070)

REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA

REQUERIDO: A. C. F. D. S.


DECISÃO


Vistos, etc...

Trata-se de MEDIDA DE PROTEÇÃO consistente em COLOCAÇÃO EM FAMÍLIA NATURAL COM CONCESSÃO DE GUARDA PROVISÓRIA requerida pelo Ministério Público do Estado da Bahia em favor da menor A. C. F. S.

Aduz, em síntese, que conforme consta nos autos, a guarda da criança é compartilha entre a sra. Lindinalva, avó paterna, que reside na cidade de Valença e a sra. Angie, genitora, que mora na cidade de Presidente Tancredo Neves. Nesse sentido, a criança contou para a sua genitora que no ano de 2021, na igreja frequentada pela avó paterna, um homem, o filho mais velho do pastor, abusou sexualmente dela, colocando o dedo em suas partes íntimas.

Narra que, diante a informação a sra. Angie conversou com a sra. Lindinalva que nada fez a respeito da situação. Ato contínuo, a genitora acionou o conselho tutelar de Presidente Tancredo Neves, e, após orientação, registrou boletim de ocorrência na delegacia. Pontua ainda que, já fora requisitado a instauração de inquérito Policial e que a criança foi encaminhada para acompanhamento multidisciplinar no CREAS.

Requereu, por fim, que seja decretada a medida de proteção de colocação da menor A. C. F. S. em família natural e o deferimento de GUARDA PROVISÓRIA em favor de Angie Silva Feliz dos Santos. Além disso, que o Conselho Tutelar e o CREAS realizem o acompanhamento do núcleo familiar e encaminhem relatório atualizado.

É o relatório. DECIDO.

É evidente o periculum in mora na situação narrada, haja vista que qualquer demora no provimento jurisdicional acarretará risco de danos irreparáveis à criança desamparada.

Ademais, presente a verossimilhança das alegações, ante aos relatórios acostados aos autos, eis que, enquanto documentos produzidos por agentes públicos, gozam de presunção de veracidade.

Tal entendimento segue na linha do Princípio do Melhor Interesse da Criança. O processo não é um fim em si mesmo, em verdade, é instrumento de garantia do resultado material de justiça, devendo então, proteger a criança, eis que, in casu, a tutela antecipada é provimento do seu maior interesse. A criança é sempre o protagonista, porquanto a decisão repercute direta e objetivamente em sua vida.

Os direitos processuais e materiais são submetidos ao interesse primário do menor, que é objeto central da proteção legal em ações que o afetem. A interpretação do ordenamento legal deve honrar o princípio do melhor interesse da criança, cuja intangibilidade deve ser preservada.

Neste diapasão, o art. 98, do Estatuto da Criança e do Adolescente determina adoção de medidas com vistas à proteger a criança que se encontra em situação vulnerável. Veja-se:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:

I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;

III - em razão de sua conduta.

In casu, a medida deve ser concedida liminarmente, já que verificada a hipótese de descumprimento do disposto no art. 22, do ECA.

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Nesta esteira, não é outra a determinação do art. 157, do ECA. Veja-se:

Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do poder familiar, liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade.

De outro ponto, considerando o disposto no art. 19 da Lei 8.069/90 - que preleciona sobre o direito de toda criança e adolescente ser criado e educado no seio da sua família - bem como a provisoriedade da guarda, que se verifica a inexistência do risco de irreversibilidade da medida, não vislumbro qualquer óbice ao deferimento da guarda pleiteada, sobretudo porque se revela necessária a concessão da guarda provisória, na hipótese, para cumprir o previsto no Estatuto da Criança e Adolescente e por se afigurar medida mais benéfica a crianças em questão. Ademais, o deferimento da medida satisfaz, portanto, a necessidade de representação da menor para assegurar a continuidade dos cuidados necessários à sua criação.

Outrossim, não verifico, numa análise perfunctória, ínsita ao momento de cognição prefacial, qualquer prejuízo a criança já que a guarda poderá ser modificada, a teor do disposto no supracitado artigo 35, do Estatuto da Criança e do Adolescente. A doutrina caminha no mesmo sentido:

“A concessão da guarda, provisória ou definitiva, não faz coisa julgada, podendo ser modificada no interesse exclusivo do menor e desde que não tenham sido cumpridas as obrigações pelo seu guardião." (Paulo Lúcio Nogueira – ECA Comentado)

A necessidade de colocação da criança sob a guarda e responsabilidade da família natural (art. 25, caput, da Lei 8.069/90), qual seja, genitora biológica, decorre da situação de violação dos direitos relatado pelo Conselho Tutelar de Presidente Tancredo Neves-BA.

Houve a identificação de familiar, genitora biológica, disposta a cuidar da menor (Relatório nº 01/2022 do Conselho Tutelar de Presidente Tancredo Neves-BA, ID 238266195, fls. 06/07). Dessa forma, a presente decisão encontra-se em consonância ao caráter excepcional de deferimento de guarda, “para atender situações peculiares e suprir a falta eventual do pais ou responsável” previsto pelo art. 33, § 2º, da Lei 8.069/90.

Assim sendo, considerando a situação de risco da criança, conforme se depreende do Relatório do Conselho Tutelar de Presidente Tancredo Neves-BA, vê-se que restou configurada a excepcionalidade prevista no § 1º do art. 101 do ECA, sobretudo se considerarmos as necessidades da infante que se trata de criança com 09 (nove) anos de idade. Por este motivo, nos termos do que requerido pelo Parquet, a colocação em família natural, sob a guarda provisória da sua genitora biológica se impõem.

Isto posto, em face das razões expostas e o que mais conta nos autos, especialmente o relatório circunstanciado mencionado, levando em consideração única e exclusivamente os interesses atuais da menor, e sem adentrar ao meritum causae, consoante dispõe os art. 33, § 2º, 98 e 100, todos do ECA, DEFIRO A COLOCAÇÃO EM FAMÍLIA NATURAL, requerida pelo MP na exordial, pelo que, CONCEDO A GUARDA PROVISÓRIA, com direito de representação, da criança A. C. F. S. (nascida em 29/11/2012), a ANGIE SILVA FELIX DOS SANTOS, genitora biológica, RG n. 16.142.317-53, CPF nº 086.401.765-07, residente no Alto do Japão, Praça Mariana, próximo a construção do sr. Abel, Bairro Japão, Presidente Tancredo Neves-BA, a qual deverá ser notificado para prestar o devido compromisso, sem prejuízo de ulterior revogação, a qualquer tempo, caso tal medida não mais se justifique. Expeça-se o termo de guarda e responsabilidade respectivo.

Comunique-se ao Conselho Tutelar e CREAS de Presidente Tancredo Neves-BA para que realize e cumpra as medidas inseridas entre suas atribuições e prestem informações periódicas a este juízo, com a urgência devida ao caso, 1- Para que diligencie junto a familiares e órgãos do Poder Público a fim de providenciar documentação da criança necessária a atendimento na rede municipal de saúde e educação, dentre outros serviços essenciais; 2- E procedam com a orientação e encaminhamento dos genitores e da criança, bem como acompanhem o processo de colocação em família natural (genitora biológica), APRESENTANDO RELATÓRIO CIRCUNSTANCIADO NO PRAZO DE 10 (DEZ) DIAS.

Oficie-se, o Conselho Tutelar e o CREAS de Presidente Tancredo Neves-BA e Valença-BA para que elaborem novo estudo psicossocial e emitam relatório circunstanciado, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, na residência da genitora e da avó paterna, relatando sobre as condições do lar, e visando auferir as condições estruturais, físicas e psicológicas dessa. Em igual prazo, sem prejuízo do anteriormente determinado, deverá - os genitores da infante - ser encaminhada à avaliação psicológica, visando auferir se esta têm condições de acolher a filha, e remetendo o relatório a este Juízo. Caso necessário expeça-se Carta Precatória.

Após, CITE-SE E INTIME-SE a avó paterna da criança, para no prazo de 10 (dez) dias, oferecer resposta escrita, indicando as provas a serem produzidas e oferecendo desde logo o rol de testemunhas e documentos (art. 158 do ECA), bem como para que compareça à AUDIÊNCIA INAUGURAL, incluindo-se em pauta, no Fórum Local, cuja finalidade é avaliar a situação atual da criança. Intimações e comunicações necessárias.

Intimem-se os genitores, os Conselheiros Tutelares de Presidente Tancredo Neves-BA que acompanham o caso. Intime-se o Ministério Público.

Deverá o Cartório adotar as providências necessárias para garantir ao feito a mais absoluta prioridade, conforme estabelece o art. 227, caput, da Constituição Federal, arts. e 102, § 2º, in fine, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Dê-se ciência dessa decisão ao Ministério Público, ao CMDCA e ao Conselho Tutelar.

As diligências acima deverão ser...

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