Valença - 2ª vara dos feitos de relações de cons. Cíveis, comerciais, fazenda pub. E acidente trabalho

Data de publicação04 Agosto 2023
Gazette Issue3387
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª V DOS FEITOS DE REL. DE CONS. CÍVEIS COM. FAZ. PUB. E ACID. TRAB. DE VALENÇA
INTIMAÇÃO

8001643-04.2020.8.05.0271 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Valença
Autor: Plinio Lourenco De Jesus
Advogado: Cornel Wilde Dos Santos (OAB:BA10042)
Reu: Municipio De Cairu
Interessado: Municipio De Cairu

Intimação:

Vistos, etc.

Trata-se de AÇÃO INDENIZATORIA DE DANOS MATERIAIS COM PEIDO DE LIMINAR, oposta por PLINIO LOURENÇO DE JESUS, em face de MUNICÍPIO DE CAIRÚ.

Em síntese alegou o autor: 1) Que é servidor municipal e no ano de 2017 foi promovido para o trabalho em regime de 40 horas semanais, passando a receber o estipêndio de R$ 5.304,48; 2) Que em junho de 2019 o Município acionado promoveu descontos indevidos nos vencimentos do professor, no valor de R$ 2.624,79, sobre a rubrica de 12 faltas; 3) Que as faltas não se justificam pois o autor encontrava-se afastado em razão de decisão em processo administrativo que respondia; 4) Que os meses de agosto e setembro o Município acionado retirou do acionante (gratificação de regência de classe-GIRC no valor de R$ 883,42) e ainda retirou a (gratificação de atividade complementar-GAC) no valor de R$ 345,37, impondo um prejuízo material num total de R$ 2.417,58; 5) que a partir do mês de novembro de 2019, o Município acionado retirou do acionante as vantagens relativas ao regime de 40 horas cuja remuneração é no valor de R$ 5.304,48, passando o acionante a receber estipendio de apenas R$ 2.363,45, impondo-lhe um prejuízo material mensal de R$ 2.941,03 , o que implica até a data atual num prejuízo material num importe de R$ 32.351,35.

Em conclusão, requereu: A) procedência da demanda, para condenar o réu ao pagamento das verbas indevidamente inadimplidas no montante de R$ 42.698,20; B) condenação do réu ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais no montante de 20% sobre o valor da causa.

Juntou documentos.

O réu, em CONTESTAÇÃO, alegou: 1) que em razão de processo disciplinar instaurado o autor foi suspenso de suas atividades, sendo-lhe comunicado em 17/05/2019; 2) que em razão da suspensão foram suprimidos os pagamentos de Gratificação de Atividade Complementar – GAC e à Gratificação de Incentivo à Regência de Classe-GIRC; 3) que após a suspensão o Requerente foi cedido a partir de novembro de 2019 para o Núcleo Territorial de Educação do estado da Bahia, perdendo o direito a extensão de 20 horas.

Em conclusão requereu pela improcedência da demanda.

Juntou documentos.

Em RÉPLICA, o autor reiterou os termos da inicial.

Intimados a se manifestar sobre a produção de provas, ambas as partes dispensaram providências instrutórias.

Eis o Relatório. Decido.

DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO.

Considerando a regularidade do procedimento, bem como a mútua dispensa da produção de provas, é possível o julgamento antecipado do mérito nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC.

DOS DANOS MATERIAIS.

Como observado nos autos e sintetizado no relatório, o autor tem por objetivo ser indenizado por retenção indevida de vencimentos. Segundo o demandante, o fato de ter respondido processo disciplinar e ser suspenso cautelarmente não embasa a perda de gratificações, redução salarial por faltas e perda de vencimento derivado de regime jurídico adquirido.

O réu, em contrapartida, alegou que as gratificações são diretamente ligadas ao efetivo exercício da função pública, e que em razão do processo disciplinar o autor perdeu o direito ao regime de 40 (quarenta) horas e o correspondente vencimento.

Pois bem. Nos autos foi informado que o autor foi promovido, e passou exercer sua função pública em regime de 40(quarenta) horas semanais (ID. 74442756), percebendo salário no montante de R$ 4.317,09 (quatro mil, trezentos e dezessete reais e nove centavos) e outros vencimentos (ID. 74442933) e Gratificação por regência e atividade complementar ( ID. 74443033).

Contudo, a partir da instauração do processo administrativo, foi penalizado com um abate salarial de R$ 2.624,79 (dois mil seiscentos e vinte e quatro reais e setenta e nove centavos) em razão de alegadas 12 faltas (ID. 74443118), perda das gratificações, bem como redução permanente do salário para R$ 2.435,26 (dois mil quatrocentos e trinta e cinco reais e vinte e seis centavos) a partir de novembro de 2019 (contracheques acostados).

Segundo a ré, tais descontos são justificados em razão do processo administrativo instaurado que suspendeu cautelarmente o autor das suas funções. Extrai-se do aludido processo administrativo a decisão de suspensão cautelar, que em seu dispositivo determinou que:

Posto isto, dentro desta ordem de ponderações e todas aquelas que serão acrescentadas por órgão superior, decide esta comissão por PUNIR o professor Plínio Lourenço com a suspensão de suas atividades, sem direito a remuneração, pelo período de 30 (trinta) dias; ainda, cautelarmente, de maneira provisória, seja afastado das atividades de sala de aula após o cumprimento da suspensão, até que, com relatório fundamentado e relatório psíquico social, seja possível o seu retorno à sala de aula (ID. ID. 92325800).

Ao se analisar os documentos acostados, e considerando o regime jurídico vigente, denota-se que o município réu não encontra razão em suas alegações.

Considerando o seu poder disciplinar, quando uma infração é cometida em âmbito da administração, se torna fundamental que esta seja apurada, todavia, o procedimento tem que ser formal e permitir ao suspeito do fato o exercício das suas garantias processuais (CARVALHO FILHO, 2020), como o devido processo legal e a presunção de inocência.

O réu em suas alegações contextualiza o processo administrativo enfatizando o clamor popular por providências. Não cabe ao presente juízo emitir valoração sobre o presente fato, eis que estranho a presente causa, contudo, é dever do judiciário, em razão da inafastabilidade da jurisdição, apreciar a legalidade de certos atos administrativos.

Conforme se extrai de leis ligadas a servidores públicos na esfera federal e estadual, denota-se que o afastamento cautelar é um direito garantido a administração em situações em que se mostre adequado. Todavia, é enfatizado legalmente que tal suspensão ou afastamento cautelar do servidor não prejudicará a sua remuneração. A título de exemplo seguem trechos dos estatutos federal e estadual da Bahia sobre a pauta:

Lei Estadual n. 6.677 de 26 de setembro de 1994. Art. 208: A autoridade instauradora do processo disciplinar, de ofício ou mediante solicitação do presidente da comissão processante, poderá ordenar o afastamento do servidor acusado, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo de remuneração, a fim de que o mesmo não venha a influir na apuração dos fatos. Parágrafo único - O afastamento poderá ser prorrogado por igual prazo, findo o qual cessarão os seus efeitos, ainda que não concluído o processo.

Lei 8112/1990. Art. 147. Como medida cautelar e a fim de que o servidor não venha a influir na apuração da irregularidade, a autoridade instauradora do processo disciplinar poderá determinar o seu afastamento do exercício do cargo, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração. Parágrafo único. O afastamento poderá ser prorrogado por igual prazo, findo o qual cessarão os seus efeitos, ainda que não concluído o processo.

Com base nos aludidos preceitos legais, verifica-se que o afastamento cautelar do servidor em processo administrativo não ocorrerá em prejuízo dos seus vencimentos. Não poderia ser diferente na medida em que a Constituição Federal assegura a todos, inclusive em processo administrativo, o respeito ao devido processo legal, que em certa medida engloba a presunção de inocência até a prolação da decisão final (Art. 5°, incisos LV e LVII, CFRB/88).

A título argumentativo e resgatando preceitos da doutrina processual penal, que muito se aproxima com aquela ligada a penas disciplinares administrativas, Aury Lopes Junior (2021) ensina que a presunção de inocência, dentre muitos vieses, pode ser vista como uma norma de tratamento, determinando que a autoridade acusatória trate o acusado como sendo inocente.

Sendo assim, em relação a estes elementos, não poderia o autor ser previamente punido com perda de vencimentos ou faltas em razão de instauração e suspensão cautelar decorrentes de processo administrativo disciplinar sem decisão final prolatada, pois tal medida viola a presunção de inocência e o devido processo legal em regimes de servidores públicos. Inclusive, a própria notificação encaminhada ao autor (ID. 92325940) informa que a suspensão ocorrerá sem prejuízo da remuneração.

Com base nestes mesmos elementos expostos, pode-se apresentar os seguintes julgados:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL-PENAL. AÇÃO PENAL. DENÚNCIA POR FORMAÇÃO DE QUADRILHA E FALSIDADE IDEOLÓGICA. MEDIDA CAUTELAR DE AFASTAMENTO DO CARGO PÚBLICO. ART. 319, VI, DO CPP. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. SUSPENSÃO DOS RESPECTIVOS VENCIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE. EXCEÇÃO EM RELAÇÃO ÀS VANTAGENS QUE DESAPARECEM QUANDO CESSA A ATIVIDADE. OFENSA A DIREITO LÍQUIDO E CERTO DEMONSTRADO. LIMINAR CONFIRMADA. RECLAMO PROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte Superior consolidou-se no...

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