Valença - Vara crime, júri, execuções penais, infância e juventude

Data de publicação15 Março 2023
Número da edição3292
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE VALENÇA
SENTENÇA

0502840-78.2017.8.05.0271 Ação Penal De Competência Do Júri
Jurisdição: Valença
Autor: Ministério Público Do Estado Da Bahia
Reu: Edivaldo Soares Nunes
Advogado: Ilanna Karine Pinheiro Rocha Gomes (OAB:BA66581)
Advogado: Israel Ventura Mendes (OAB:BA37506)
Terceiro Interessado: Maria Cládia
Terceiro Interessado: Maurílio Pereira Dos Santos
Terceiro Interessado: Jenilda Brito Dos Santos
Terceiro Interessado: Nancy Tosta Vilas
Terceiro Interessado: Ana Claudia Machado Dos Santos
Terceiro Interessado: Edivaldo Sena Nunes
Terceiro Interessado: Antonio Santana Da Cruz

Sentença:


1 – RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, no uso de suas atribuições, ofereceu denúncia em face de Edivaldo Soares Nunes, conhecido como “Júnior”, pela suposta prática de tentativa de homicídio qualificado, conduta delitiva prevista no art.121, §2º, incisos II e VI, c/c com art. 14, inciso II, todos do Código Penal.

Narra a denúncia que, “no dia 18 de agosto de 2017, por volta das 23h30min, em frente o Bar do Sr. Ireno, na Rua da Lagoa Morro de São Paulo, Município de Cairu/BA, o denunciado EDIVALDO SOARES NUNES efetuou, com animus necandi, golpes de faca contra sua ex-companheira, Sra. Ana Cláudia Machado dos Santos, causando-lhe os ferimentos descritos no Laudo Pericial n. 2017.05PV.002085-01, os quais não foram causa de sua morte, por circunstâncias alheias à vontade do denunciado”.

Aduz que a vítima retornava do trabalho e passava em frente do Bar do Sr. Ireno, localizado na Rua da Lagoa, quando encontrou o réu, seu ex-companheiro, ocasião na qual lhe chamou para conversar, tendo a vítima recusado.

Prossegue a inicial acusatória afirmando que após a negativa da vítima, o réu “puxou da cintura uma faca, do tipo peixeira, momento em que a vítima tentou fugir, mas se esbarrou num poste de energia e foi alcançada pelo denunciado, o qual passou a desferir- lhe golpes de faca pelo pescoço, braço esquerdo, lado direito das costas, não vindo a óbito pelo fato de ser acudida por populares que passavam no local”.

Ainda esclarece a denúncia que a motivação seria fútil, visto decorreu simplesmente pelo fato de a vítima ter dito que não conversaria com o réu. Além disso, o delito foi praticado no âmbito da violência doméstica e familiar contra a mulher, em razão de o réu ter convivido com a vítima durante 07 (sete) anos, configurando-se assim uma relação íntima de afeto.

Apresentou rol de testemunhas e juntou o IP 132/2017 (id. 265786172, fls. 01/25): termo de declarações da vítima; interrogatório do réu; laudo de exame de lesões corporais da vítima (id. 265786172, fls. 19/20); e demais documentos.

Antecedentes criminais (id. 265786176 e 265786182).

A denúncia foi recebida em 28/01/2019 (id. 265786189), oportunidade em que foi ordenada a citação do réu e deferida medidas protetivas em favor da vítima.

Embora o réu não tenha sido regularmente citado, sanou a irregularidade na medida em que constituiu advogado e apresentou resposta à acusação (id. 265787373), dando como citado diante da inequívoca ciência da ação penal. Na ocasião, o réu negou autoria, apresentando a tese de legítima defesa putativa e, subsidiariamente, a desclassificação para o crime de lesão corporal.

Por não concorrer nenhuma das hipóteses previstas no art. 397 do Código Penal, foi ratificado recebimento da denúncia e designada audiência de instrução e julgamento (id.265787432).

Laudo de lesões corporais da vítima (id. 265787869).

Em audiência de instrução e julgamento, ouviu-se uma testemunha arrolada pela acusação Nancy Tosta Vilas, uma pela defesa, Antônio Santana da Cruz e a testemunha referida Edivaldi Sena Nunes, sendo designada audiência em continuação para oitiva das demais e interrogatório do réu.

Considerando a ausência de informações acerca do endereço da vítima e demais testemunhas, não havendo outras diligências requeridas pelas partes, após diversas audiências frustradas, declarou-se encerrada a instrução. No mesmo sentido, considerando que o réu encontrava-se em local incerto e não sabido, não sendo possível realizar sua intimação pessoal para comparecer em audiência e prestar interrogatório, considerou-se sua ausência como exercício ao direito ao silêncio, nos termos do art. 367 do CPP.

Em alegações finais, em forma de memoriais escritos, o Ministério Público ratificou os termos da denúncia e requereu a pronúncia do réu como incurso nas penas do art.121, § 2º, II e VI, c/c 14 II do Código Penal, submetendo-o ao Julgamento pelo Tribunal do Júri

O réu, por sua vez, assistido por sua defesa técnica, apresentou suas alegações finais, requerendo a impronúncia do réu e, subsidiariamente, a desclassificação do crime de homicídio tentado, para lesão corporal.

Eis o relatório. Decido.

2 - FUNDAMENTAÇÃO

Cuida-se de ação penal da competência do Tribunal do Júri na qual, em juízo preliminar, averigua-se a viabilidade do pleito acusatório relativo ao crime imputado ao acusado.

Como propalado pela doutrina, a decisão de pronúncia se limita a justificar o preenchimento dos requisitos de admissibilidade do julgamento pelo Tribunal Popular, sem, contudo, proceder à análise aprofundada das provas e à fundamentação exaustiva acerca do acervo probatório, sob pena de caracterizar supressão de instância e violação da soberania do veredicto do Júri.

Dispõe o art. 413 do CPP: “o juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de sua participação”.

Faz-se mister verificar se há ou não os requisitos elencados no art. 413 do CPP, pois, para que haja uma sentença de pronúncia é necessário, nos termos do supracitado artigo, que o juiz esteja convencido da existência do crime e de indícios de que seja o acusado seu autor.

A inexistência dos requisitos é que leva a impronúncia, conforme artigo 414, também do CPP.

No caso em tela, a materialidade do delito restou comprovada por meio do inquérito policial, pelo conjunto probatório em sede judicial, notadamente pelo laudo de exame pericial de lesões corporais (id. 265787873), o qual evidenciou que a vítima apresentava: ferimento inciso suturado transverso linear, medindo 6,0 cm, localizado na região posterior do braço esquerdo. Ferimento inciso suturado, medindo 1,0 cm, localizado na região lateral do braço esquerdo. Escoriação linear, longitudinal em região lateral do antebraço esquerdo, terço superior, medindo 12 cm; ferimento inciso suturado linear no couro cabeludo, medindo 2,5 cm, em região occipital; Ferimento linear suturado, oblíquo, localizado na região dorsal direita; Escoriações irregulares na região peitoral direita e antebraço esquerdo”.

Em relação aos indícios de autoria, embora o réu não tenha prestado interrogatório em juízo, em sede de IP e resposta a acusação não negou a conduta, mas suscitou excludente de ilicitude da legítima defesa e tese de desclassificação. Aduziu que pegou a faca e a utilizou para se defender da vítima e não tinha a intenção de matá-la.

Ao final da instrução, em verdade, o Ministério Público demonstrou a probabilidade de ter o agente iniciado a execução do crime de homicídio, que não se concretizou por circunstâncias alheias à vontade do réu, conforme depoimento da testemunha ocular arrolada pela própria defesa, Antônio Santana da Cruz que em juízo afirmou:

“(…) QUE ia passando no momento, na hora que eles estavam brigando lá, eu entrei correndo, tirei e, em seguida, fui embora; QUE ela saiu correndo, estava com um corte eu acho, melada de sangue e ele com a faca na mão, então eu cai fora; QUE no momento não tinha nem visto a faca, que foi correndo, agarrou ele por trás e puxou; QUE nesse momento a vítima saiu correndo e olhei assim, ele estava com a faca na mão; QUE nessa hora para cá, soltei ele e ele com a faca na mão, fui embora; QUE aconteceu na rua, junto a um orelhão; QUE não viu quebrar copo, QUE no momento em que ia passando o bar estava fechado; QUE o colega que estava comigo não se envolveu; QUE é sentimental, viu o momento, achou que deveria tirar; QUE não viu quem prestou socorro a vítima; QUE agarrou o acusado e ficou segurando ele e depois viu a faca; QUE ela já saiu correndo; QUE viu um corte no braço dela, que no outro dia a irmã dela foi la em casa, agradecer; QUE ela foi dois dias depois na sua casa lhe agradecer; QUE não sabe dizer o que aconteceu com a faca; QUE não sabe para onde o acusado foi; QUE conhecia acusado e vítima de vista; QUE ela saiu correndo, foi na hora que soltei ele; QUE era por volta das 23hs; QUE não percebeu o tamanho da faca; QUE ela estava caída e o acusado ao lado; QUE ele só parou porque o depoente o segurou; QUE ele estava irritado; QUE ela gritava socorro;

Corroborando com a versão apresentada, colheu-se as declarações do genitor do acusado Edvaldo Sena Nunes, o qual, embora não tenha presenciado os fatos, confirmou ter havido uma discussão entre o réu e a vítima, a qual teria saído ferida:

“(…) QUE é pai do réu; QUE nunca ficou sabendo sobre nada, só ouviu que tiveram uma discussão; QUE estava em casa dormindo com o filho do réu e da vítima; QUE à época o acusado residia com o declarante, QUE soube que eles brigaram; QUE o acusado falou que teve uma discussão besta,...

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