Vou indicar quem toma cerveja comigo': convertendo indicações em influência no STF

AutorLucas Magalhães, Mateus Morais Araújo, Shandor Torok Moreira
CargoProfessor Assistente no Núcleo de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais em Belo Horizonte (Ibmec). E-mail: lucasmagalhães108203@gmail.com; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1046-2458. / Professor colaborador na Fundação João Pinheiro e servidor público. E-mail: mateus.m.araujo@gmail.com; ORCID: https://orcid...
Páginas163-183
DOI: https://doi.org/10.5007/2175-7984.2022.e90225
163163 – 183
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Vou indicar quem toma cerveja
comigo1: convertendo indicações
em inuência no STF2
Lucas Fernandes de Magalhães3
Mateus Morais Araújo4
Shandor Torok Moreira5
Resumo
Este artigo tem como objetivo ampliar os horizontes do debate sobre a indicação presidencial para
o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal no Brasil por meio da exploração dos mecanis-
mos pelos quais se pode antecipar expectativas de comportamento dos Ministros. Após uma aná-
lise da discussão atual sobre o tema, que destaca a inuência como um dos principais objetivos na
escolha de indicados ao STF, apresentamos e discutimos os mecanismos pelos quais essa inuên-
cia pode ser esperada pelo presidente: ideologia, lealdade e gratidão. Com base nisso, formulamos
hipóteses sobre o comportamento judicial de Ministros que tenham sido indicados por meio de
um desses mecanismos, em detrimento dos outros, e fornecemos evidências anedóticas de que
presidentes indicam Ministros com expectativas de lealdade e gratidão. Além disso, observamos
que a manifestação desses elementos no comportamento dos Ministros, embora criticada, também
é esperada por outros atores políticos.
Palavras-chave: Indicação presidencial, STF, lealdade, gratidão, comportamento judicial
1 Durante um encontro com empresários em Chapecó/SC em 2021, às vésperas da aposentadoria do então Minis-
tro Marco Aurélio, Bolsonaro afirmou “Vou indicar para o Supremo quem toma cerveja comigo. É o critério da
confiança da lealdade mútua” (PODER 360, 2021, [s. p.]).
2 Agradecemos pelas brilhantes sugestões recebidas durante o debate no Mare Incognitum de 2021 e pelos exce-
lentes comentários do parecerista. Eventuais erros remanescentes são de inteira responsabilidade dos autores.
3 Professor Assistente no Núcleo de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercados de Capitais em
Belo Horizonte (Ibmec). E-mail: lucasmagalhães108203@gmail.com; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-
1046-2458.
4 Professor colaborador na Fundação João Pinheiro e servidor público. E-mail: mateus.m.araujo@gmail.com; OR-
CID: https://orcid.org/0000-0001-9164-2591.
5 Doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e servidor público. E-mail:
shandorbr@yahoo.com.br; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5319-3745.
Vou indicar quem toma cerveja comigo”: convertendo indicações em inuência no STF | Lucas Fernandes de Magalhães, Mateus
Morais Araújo, Shandor Torok Moreira
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1. Introdução
Cortes e Chefes do Executivo possuem uma longa história de conitos nas
democracias constitucionais (CLARK, 2010; CHÁVEZ; FEREJOHN;
WEINGAST, 2011), sobretudo, quando o partido ou os representantes
de uma determinada ideologia ocupam a cadeira presidencial após longos
períodos afastados dela. Uma das principais causas desses atritos é o des-
compasso entre os mandatos dos ministros da Corte e o do Presidente, o
que muitas vezes cria um fosso ideológico entre eles, aumentando a proba-
bilidade de divergência entre as instituições.
No Brasil e nos EUA, uma das ferramentas à disposição do Chefe do
Executivo para contornar esses desentendimentos, ao lado do aumento
dos subsídios ou possíveis retaliações, é a indicação presidencial quando
abrem vagas no Supremo Tribunal Federal (STF) ou na Supreme Court
of the United States (SCOTUS). Apesar de a relação parecer óbvia, não é
trivial a explicação de como a indicação pode se converter em apoio para
o Presidente. Caso a nomeação tenha êxito, o cargo do ministro indicado
se reveste das garantias da vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade
de subsídios, de modo que o Presidente perde quase todas as condições de
barganha, diferentemente, por exemplo, da situação do Procurador-Geral
da República que pode ser reconduzido de dois em dois anos.
O principal mecanismo levantado pela literatura para explicar a con-
versão da indicação presidencial em apoio é o alinhamento ideológico
(MORASKI; SHIPAN, 1999; COTTRELL et al., 2019). Em termos sim-
ples, o Presidente escolheria um candidato para suprir a vacância na Corte o
mais ideologicamente alinhado possível às suas próprias preferências, den-
tro das limitações impostas pelo processo de aceitação do Senado. Desse
modo, o futuro ministro, independentemente de qualquer necessidade de
barganha, irá votar com uma maior frequência em favor das políticas do
governo porque essas políticas reetem suas próprias preferências políticas.
É em virtude desse mecanismo de indicação de juristas alinhados às pre-
ferências dos presidentes que alguns autores chegaram a armar que a Corte
não exerceria, na grande maioria do tempo, um papel relevante como um
veto player (DAHL, [1957] 2009; TSEBELIS, 2002). Vale dizer, no curso de

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