Wenceslau guimar�es - Vara c�vel

Data de publicação30 Maio 2022
Gazette Issue3107
SectionCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE WENCESLAU GUIMARÃES
INTIMAÇÃO

8000008-07.2019.8.05.0276 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Wenceslau Guimarães
Autor: Renata Livia Sampaio Da Franca
Advogado: Renata Rosa Da Silva (OAB:BA36187)
Reu: Companhia De Eletricidade Do Estado Da Bahia Coelba
Advogado: Marcelo Salles De Mendonça (OAB:BA17476)
Advogado: Rafael Martinez Veiga (OAB:BA24637)
Advogado: Bruno Nascimento De Mendonça (OAB:BA21449)

Intimação:

SENTENÇA

Vistos, etc.

Visto.

Relatório dispensado, na forma do art. 38, da Lei 9099/95.

Tratam os presentes autos da pretensão de RENATA LÍVIA SAMPAIO DA FRANÇA em obter provimento jurisdicional que condene a requerida a compensar os danos materiais e morais sofridos e a restabelecer o serviço de prestação de energia suspenso.

Alega, em síntese, ser consumidora do serviço de energia elétrica fornecido pela ré e que o serviço fora suspenso em 10.01.2019, apesar da adimplência contratual.

A ré, em sua peça contestatória, suscita a ausência de conduta abusiva, pelo que refuta a pretensão indenizatória formulada.

É o que importa circunstanciar. DECIDO.

A título de prelúdio, insta situar a questão ora ventilada no espectro das relações de consumo, à guisa dos preceptivos dos artigos e do CDC, de modo a apresentar-se a parte autora como destinatária final dos serviços prestados pela ré, e esta, por sua vez, fornecedora de tais serviços.

Na esteira do posicionamento dominante do STJ, a inversão do ônus da prova é considerada regra de instrução e não mais de julgamento, como inicialmente definido pelo Tribunal da Cidadania. Entretanto, em razão da peculiaridade e brevidade procedimental dos processos submetidos ao rito da Lei 9099/95, inexistindo uma fase própria de saneamento, e não havendo pedido de tutela de urgência, somente no momento da sentença será possível a inversão do ônus da prova, sem prejuízo à defesa que terá a hipersuficiência quanto à apresentação das provas técnicas.

Ademais, sabe-se que, em razão da vulnerabilidade do consumidor frente às relações contratuais standartizadas, a dinamização da prova nas relações de consumo é a regra, concretizando o direito fundamental de defesa do consumidor. Assim, diante da clara conjugação dos pressupostos insertos no art. 6º, VIII, do CDC, inverto o ônus da prova, detendo o réu a absoluta suficiência técnica para a produção probatória e evidência da prestação do serviço de forma adequada aos preceptivos do CDC.

Capitaneada por essas premissas principiológicas, no caso concreto, diante da análise dos elementos de informação encerrados nos autos, percebo que a controvérsia gravita em torno da legitimidade da conduta da ré.

No caso dos autos, a requerida se limita a aduzir que a parte Autora teve seu fornecimento de energia elétrica interrompido em consequência do não pagamento de fatura de consumo.

Isto é, deixa a ré de impugnar especificamente os fatos narrados na exordial, a despeito do que lhe impõe o art. 341, do CPC, fazendo, assim, presumir como verdadeiras as alegações autorais, notadamente quanto ao injustificado corte no fornecimento de energia elétrica em sua residência, na data acima.

Nesse diapasão, resta caracterizada a conduta ilícita perpetrada pela ré ensejadora de responsabilidade objetiva na reparação dos danos eventualmente causados, nos termos do art. 20, do CDC, mormente no caso em testilha, em que, não obstante a reclamação administrativa efetuada pela autora, a suspensão do serviço perdurou, injustificadamente, por quase 24 horas.

Nesse sentido, veja-se a seguinte ementa de julgado:

Ementa: APEL AÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. ENERGIA ELÉTRICA. SUSPENSÃO DO SERVIÇO. DEMORA INJUSTIFICADA NO ATENDIMENTO DA SOLICITAÇÃO REALIZADA PELO CONSUMIDOR. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO. OBSERVADA A GRAVIDADE DA LESÃO, O CARÁTER PUNITIVO DA MEDIDA, A CONDIÇÃO SOCIAL E ECONÔMICA DO LESADO, BEM COMO A REPERCUSSÃO DO DANO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70073600835, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jerson Moacir Gubert, Julgado em 31/01/2019)


No que tange ao dano moral, sabe-se que a doutrina e a jurisprudência majoritárias se alinham no sentido de que o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito, caracterizando-se in re ipsa, ou seja, nas palavras do festejado Sérgio Cavalieri Filho: “deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa... está demonstrado o dano moral” (Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 2003. p. 99).

Mas, também pelo viés punitivo e da prevenção de danos, a repercussão da conduta da ré merece ser sancionada.

Perceba-se que o “paradigma reparatório”, calcado na teoria de que a função da responsabilidade civil é, exclusivamente, a de reparar o dano, tem-se mostrado ineficaz em diversas situações conflituosas, nas quais ou a reparação do dano é impossível, ou não constitui resposta jurídica satisfatória, como se dá, por exemplo, quando o ofensor obtém benefício econômico com o ato ilícito praticado, mesmo depois de pagas as indenizações pertinentes, de natureza reparatória e/ou compensatória; ou quando o ofensor se mostra indiferente à sanção reparatória, vista, então, como um preço que ele se propõe a pagar para cometer o ilícito ou persistir na sua prática.

Essa “crise” do paradigma reparatório leva o operador do direito a buscar a superação do modelo tradicional, a qual não se traduz no abandono da ideia de reparação, mas no redimensionamento da responsabilidade civil, que, para atender aos modernos e complexos conflitos sociais, deve exercer várias funções.

Ao lado da tradicional função de reparação pecuniária do prejuízo, outras funções foram idealizadas para a responsabilidade civil. Assim, avulta, atualmente, a noção de uma responsabilidade civil que desempenhe a função de prevenção de danos, forte na ideia de que mais vale prevenir do que remediar.

Conforme salienta Ramón Daniel Pizarro, tanto do ponto de vista da vítima quanto do possível responsável, a prevenção do dano é sempre preferível à sua reparação. O tema assume especial relevo em matéria de danos causados como consequência de uma lesão a direitos personalíssimos, como a intimidade, a honra ou a imagem.

Do mesmo modo, cresce a ideia, em países de tradição romanística, de uma função punitiva da responsabilidade civil. A indenização punitiva surge como instrumento jurídico construído a partir do princípio da dignidade humana, com a finalidade de proteger essa dignidade em suas variadas representações.

A ideia de conferir o caráter de pena à indenização do dano moral pode ser justificada pela necessidade de proteção da dignidade da pessoa e dos direitos da personalidade, sobretudo em situações especiais, nas quais não haja outro instrumento que atenda adequadamente a essa finalidade, respondendo, outrossim, a um imperativo ético que deve permear todo o ordenamento jurídico.

Essa ideia da indenização punitiva é coerente com os princípios que informam o nosso Direito e constitui um mecanismo consistente e apto à consecução dos fins para ele almejados.

Assim, o valor da reparação e punição deve observar a situação econômica das partes envolvidas, a gravidade do dano e o tríplice escopo da reparação: indenizatório, punitivo e pedagógico, evitando enriquecimento ilícito, por um lado, e desestimulando a reiteração da prática ilícita, por outro.

Ressalte-se que a indenização pelo dano moral deve ser considerado o fato da autora à época encontrar-se grávida de 07 (sete) meses e mão de um bebê de nove meses.

Ante o exposto, declaro extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, para condenar a requerida a:

a) compensar o dano moral sofrido pela parte autora no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigido monetariamente pelo INPC-IBGE, além de juros legais, a contar deste arbitramento [Súmula 360 STJ e Nº 903.258 - RS (2006/0184808-0)].

Fixo como índice de correção monetária o INPC e como periodicidade de capitalização de juros a mensal, se expressamente pactuado, nos termos da Súmula 539 do STJ.

Advirta-se a condenada:

a) Quanto ao efeito da sentença constituir hipoteca judiciária, nos termos do art. 495, §1, do CPC;

b) Quanto à possibilidade de fixar-se multa diária para hipótese de descumprimento da obrigação de pagar, na esteira do inovador art. 139, IV, do CPC, buscando a efetivação do art. 77, IV, do CPC;

c) Quanto à possibilidade de fixar multa de 10%, para hipótese de pagamento parcial, na esteira do art. 526, §2, do CPC;

d) Quanto ao dever estabelecido no art. 77, IV, do CPC, sob pena de configuração de ato atentatório a dignidade da justiça, bem assim configuração da litigância de má-fé em hipótese de descumprimento injustificado da ordem judicial, sem prejuízo da sua responsabilização por crime de desobediência, na esteira do art. 536, §3º, do CPC.

Transitado em julgado o decisum e não havendo cumprimento voluntário da obrigação de pagar, deverá a exequente promover a execução, instruindo o processo com o devido demonstrativo, atendido o comando do art. 524, do CPC, sob pena de arquivamento.

De logo fica registrado o descabimento da inserção de honorários advocatícios no cálculo, tendo em vista a expressa disposição excludente do art. 54, da Lei 9.099/95.

Havendo pagamento voluntário da obrigação pecuniária, após o trânsito em julgado, expeça-se alvará em favor do beneficiário, respeitando as...

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