2a Vara do Trabalho de Goiânia - GO

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Processo: 000960-07.2012.5.18.0002
Autor: Rubens de Lima
Réu: Novo Mundo Méveis e Utilidades Ltda.

ATA DE AUDIÊNCIA

Aos 29 (vinte e nove) dias do mês de novembro de 2012, por determinação do Exmº.

Sr. RANÚLIO MENDES MOREIRA, Juiz do Trabalho Substituto, realizou-se sessão exclusivamente para publicação de decisão relativa à ação que tramita perante a 2a Vara do Trabalho de Goiânia-GO sob n. 000960-07.2012.5.18.0002 entre partes:
AUTOR: RUBENS DE LIMA.

RÉU: NOVO MUNDO MÓVEIS E UTILIDADES LTDA.

Aberta a audiência às 17:00 horas, foram apregoadas as partes, ausentes, sendo então proferida a seguinte:

SENTENÇA

I - Relatório

RUBENS DE LIMA ajuizou ação em face de NOVO MUNDO MÓVEIS E UTILIDADES LTDA., narrando vínculo jurídico entre as partes, postulando a gratuidade judiciária e a satisfação, em síntese, dos seguintes pedidos: vínculo de emprego no período de 27.9.1996 a 14.1.2011 com anotação da CTPS, piso salarial, diferenças de comissões, DSR sobre comissões, horas extras, inclusive pela concessão irregular do intervalo intrajornada, feriados, sábados e domingos laborados, férias + 1/3, salários trezenos, FGTS + 40%, indenização por danos morais, multa do art. 467 da CLT e honorários advocatícios. Deu à causa o valor de R$ 120.000,00 juntando procuração e documentos.

Em audiência, frustrada a conciliação, a ré apresentou contestação escrita com documentos, refutando os pedidos da inicial, em resumo, argumentando:
prescrição e fatos impeditivos e extintivos das pretensões do autor.

Impugnação à defesa às ?s. 981/1002.

Em audiência em prosseguimento, encerrou-se a instrução, seguindo-se razões ?nais orais e remissivas, permanecendo inconciliados.

É o que, de relevante, havia a relatar.

II - Fundamentação
1 - Da prescrição

Face à arguição defensiva e com fulcro no art. 7º, inciso XXIX da CRFB, pronuncio a prescrição das pretensões exigíveis anteriormente a 15.5.2007 e do respectivo FGTS sobre elas acessoriamente incidente (Súmula n. 206 do TST e CC/02, art. 92 c/c CLT, art. 8º, parágrafo único), extinguindo-se o processo, quanto a elas, com resolução do mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, rejeitando-se tais pretensões.

A pronúncia não alcança as pretensões autônomas de depósitos de FGTS, prestigiadas pelo prazo trintenário (Lei n. 8.036/90, art. 23, § 5º). Mais, observar-se-á quanto às pretensões relativas a férias o cômputo do prazo extintivo conforme art. 149 da CLT e, em relação às anotações de CTPS não há prescrição, nos termos do art. 11, § 1º, da CLT.

2 - Do vínculo, remuneração e DSR

O reclamante alega ter trabalhado para a reclamada, na função de montador, no período

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de 27.9.1996 a 14.1.2011. Informa que de 1997 a 1998 teve sua CTPS assinada e, que de 14.1.2011 até janeiro de 2007 continuou trabalhando para a ré sem a CTPS anotada, sendo que sua CTPS foi novamente assinada em 14.1.2011. Postula o reconhecimento do vínculo empregatício no período sem anotação na CTPS bem como as parcelas elencadas na peça vestibular.

A reclamada nega o vínculo empregatício no período anterior a 14.1.2011, asseverando que, neste período, o reclamante lhe teria prestado serviços como montador autônomo. Aduz ser lícita a terceirização pois a montagem de móveis não se insere na atividade-?m da empresa reclamada.

Analiso.

Das provas destes autos e de vários outros que tramitaram nesta Especializada, julgados por este e outros magistrados em casos semelhantes, ?cou indubitavelmente veri?cado que a reclamada, mediante fraude, perpetrou a “pejotização” do trabalhador, com intuito de mascarar verdadeira relação de emprego, em ?agrante desrespeito à legislação trabalhista, que abomina a precarização das condições de trabalho humano.

Ao Direito do Trabalho, segundo Lima Teixeira, importa que a empresa desenvolva com empregados próprios as atividades que explicam a sua existência e lhe dão perenidade. A fraude não está em ser este contingente de pessoal enxuto em relação ao número de empregados que um dia a empresa já ostentou. A fraude à legislação do trabalho consiste em:
I) seccionar atividades realmente essenciais da empresa como se fossem acessórias, terceirizando-as;
II) independentemente da atividade desmembrada, sobrepor a um contrato civil os traços fáticos de?nidores das partes no contrato de trabalho.

Neste contexto, cabe citar a mui esclarece-dora manifestação de Ricardo Antunes:

“particularmente, nas últimas décadas a sociedade contemporânea vem presenciando profundas transformações, tanto nas formas de materialidade quanto na esfera da subjetividade, dadas as complexas relações entre essas formas de ser e de existir da sociabilidade humana. A crise experimentada pelo capital, bem como suas respostas, das quais o neoliberalismo e a reestruturação produtiva da era da acumulação ?exível são expressão, têm acarretado, entre tantas consequências, profundas mutações no interior do mundo do trabalho. Dentre elas podemos inicialmente mencionar o enorme desemprego estrutural, um crescente contingente de trabalhadores em condições precarizadas, além da degradação que se amplia, na relação metabólica entre o homem e a natureza, conduzida pela lógica societal voltada prioritariamente para produção de mercadorias e para a valorização do capital. (ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: ensaio sobre a a?rmação e a negação do trabalho. 5. ed. São Paulo, Boitempo, 2001. p. 15).”

Deste modo, veri?co que a reclamada aproveitando-se da hipossu?ciência do reclamante, contratou-o ao arrepio da lei, e, ainda por cima, exigiu que o mesmo abrisse uma empresa para encobrir a real relação de emprego que existia entre as partes.

No caso vertente, a reclamada seccionou atividades realmente essenciais da empresa como se fossem acessórias, terceirizando-as e também tentou sobrepor a um contrato civil os traços fáticos de?nidores do contrato de trabalho.

Houve, sem dúvida, a subordinação estrutural.

O reclamante se submetia às diretrizes da reclamada, recebendo e cumprindo ordens de serviços de montagens de móveis, mediante remuneração. A pessoalidade também é manifesta, uma vez que o preposto reconhece ter combinado o início do vínculo com o

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reclamante, indicado por colegas e não a contratação de empresa que anunciou seus serviços em lista telefônica ou na imprensa falada ou escrita.

Neste sentido a jusrisprudência do TRT da 3a Região:

EMENTA: SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL, INTEGRATIVA OU RETICULAR — OU SIMPLESMENTE SUBORDINAÇÃO. CARACTERIZAÇÃO. A subordinação como um dos elementos fático-jurídicos da relação empregatícia é, simultaneamente, um estado e uma relação. Subordinação é a sujeição, é a dependência que alguém se encontra frente a outrem. Estar subordinado é dizer que uma pessoa física se encontra sob ordens, que podem ser explícitas ou implícitas, rígidas ou maleáveis, constantes ou esporádicas, em ato ou em potência. Na sociedade pós-moderna, vale dizer, na sociedade info-info (expressão do grande Chiarelli), baseada na informação e na informática, a subordinação não é mais a mesma de tempos atrás. Do plano subjetivo — corpo a corpo ou boca/ouvido — típica do taylorismo/fordismo, ela passou para a esfera objetiva, projetada e derramada sobre o núcleo empresarial. A empresa moderna livrou-se da sua represa; nem tanto das suas presas. Mudaram-se os métodos, não a sujeição, que trespassa o próprio trabalho, nem tanto no seu modo de fazer, mas no seu resultado. O controle deixou de ser realizado diretamente por ela ou por prepostos. Passou a ser exercido pelas suas sombras; pelas suas sobras — em células de produção. A subordinação objetiva aproxima-se muito da não eventualidade: não importa a expressão temporal nem a exteriorização dos comandos. No fundo e em essência, o que vale mesmo é a inserção objetiva do trabalhador no núcleo, no foco, na essência da atividade empresarial. Nesse aspecto, diria até que para a identi?cação da subordinação se agregou uma novidade: núcleo produtivo, isto é, atividade matricial da empresa, que Godinho denominou de subordinação estrutural. A empresa moderna, por assim dizer, se subdivide em atividades centrais e periféricas. Nisso ela copia a própria sociedade pós-moderna, de quem é, simultaneamente, mãe e ?lha. Nesta virada de século, tudo tem um núcleo e uma periferia: cidadãos que estão no núcleo e que estão na periferia. Cidadãos incluídos e excluídos. Trabalhadores contratados diretamente e terceirizados. Sob essa ótica de inserção objetiva, que se me a?gura alargante (não alarmante), eis que amplia o conceito clássico da subordinação, o alimpamento dos pressupostos do contrato de emprego torna fácil a identi?cação do tipo justrabalhista. Com ou sem as marcas, as marchas e as manchas do comando tradicional, os trabalhadores inseridos na estrutura nuclear de produção são empregados. Na zona grise, em meio ao fogo jurídico, que cerca os casos limítrofes, esse critério permite uma interpretação teleológica desaguadora na con?guração do vínculo empregatício. Entendimento contrário, data venia, permite que a empresa deixe de atender a sua função social, passando, em algumas situações, a ser uma empresa fantasma — atinge seus objetivos sem empregados. Da mesma forma que o tempo não apaga as características da não eventualidade; a ausência de comandos não esconde a dependência, ou, se se quiser, a subordinação, que, modernamente, face à empresa ?exível, adquire, paralelamente, cada dia mais, os contornos mistos...

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