Ação Civil Pública - Gafisa S/A - Terceirização Ilícita - Atividade-fim - Construção Civil - Dano Moral Coletivo

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DO TRABALHO DA____VARA DO TRABALHO DE GOIÂNIA/GO

O Ministério Público do Trabalho — Procuradoria Regional do Trabalho da 18ã Região, inscrito no CNPJ sob n. 26.989.715/0049-57, com sede na Av. T-63 esq. C/Av. T-4 n. 984, Setor Bueno, Goiânia/GO, CEP 74230-0100, por seu Procurador do Trabalho ao final assinado, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, com fundamento nos arts. 127 e 129 da Constituição Federal, no art. 83, inciso II, da Lei Complementar n. 75, de 20.5.1993 e nos arts. 1e, inciso IV, e 3e da Lei n. 7.347, de 24.7.1985, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA com pedido de antecipação dos efeitos da tutela inaudita altera parte, nos termos dos arts. 287 e 461, do CPC, dos arts. 12 e 19 da Lei n. 7.347/1985 e art. 769 da CLT;

em desfavor de GAFISA S/A, pessoa jurídica de direito privado, com sede na Av. das Nações Unidas n. 8501,19ã andar, Bairro de Pinheiros, São Paulo/SP, pessoa jurídica direito privado, inscrita no CNPJ sob n. 01.545.826/0001 -07; GAFISA SPE 42 — Empreendimentos Imobiliários Ltda., pessoa jurídica de direito privado, com sede no mesmo endereço e podendo, ainda ser encontrada na Av. T-15, Q.133, Lotes 1 a 14, Setor Bueno, Goiânia/GO, inscrita no CNPJ sob n. 07.152.307/ 0001-57, pelos fatos e fundamentos jurídicos que seguem:

I - Dos fatos

O Ministério Público do Trabalho instaurou procedimento investigatório n. 75.2010.18.000/9, em virtude do Relatório de Fiscalização encaminhado pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego/GO, onde consta uma série interminável de irregularidades (cópia integral anexa).

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Aliás, já tramitava no MPT em face da 1ã ré o Inquérito Civil n. 620/2008, com denúncia de diversas irregularidades, dentre elas a terceirização da sua atividade-fim, onde a empresa confessou que, para todos os seus empreendimentos, há apenas 14 (quatorze) empregados, sendo 8 (oito) da área administrativa, e que, na parte operacional propriamente dita das obras, não há qualquer emprego seu, pois todos são terceirizados.

Por uma questão de melhor investigação, diante da nova denúncia, constante do Relatório de Fiscalização, achamos por bem instaurar novo procedimento e deixar as demais matérias para serem resolvidas nos autos do Inquérito Civil n. 620/2008, discutindo nestes autos apenas a questão referente à terceirização.

Assim, no que se refere à terceirização da atividade-fim consta que a 1ã ré terceirizou a sua atividades-fim para as seguintes empresas: a) Flávio Rodrigues Nunes Ltda.; b) Gafisa SPE-42 Empreendimentos Imobiliários Ltda.; c) Maria Inês SPE Empreendimentos Imobiliários Ltda.; d) Construtora Tenda S/A; e) Invest Empreendimentos e Participações Ltda.; f) Via Delta Construtora Ltda. — ME; g) Adriana de Fátima Alves Ferreira; h) Consienge Construção e Engenharia Ltda.; i) Luciene Fagundes da Silva; j) Equipel Tratorpeças Ltda.; k) WL Construtora Ltda.; l) Vera Cruz Construções Ltda.; m) Prestadora de Serviços Lima e Santos Ltda.-ME; n) Antonio Gonçalves Duarte; o) Rafael Lourenço; p) Premoltec Indústria e Comércio e Engenharia Ltda.; q) Chão de Pedra Piso Raspadora Ltda.; r) Constru-Kraft Construções Ltda.; s) Guma Construtora Ltda.; t) PH Projetos e Manutenção Elétrica Ltda.; u) Apla Engenharia Ltda.; ev) Novatecin Nova Tecnologia em Instalações Ltda. — ME.

Foram instauradas Representações em face de todas essas empresas, porém entendemos que não seria cabível a instauração de procedimento em face do prestador de serviço, em função da terceirização, uma vez que prestar o serviço não é irregular, salvo se houver uma quarteirização desse serviço. Sendo assim, determinamos o arquivamento das Representações distribuídas a este Membro ns.: a) REP-000222.2010.18.000/8 em face de Adriana de Fátima Alves Ferreira; b) REP-000227.2010.18.000/0 em face de Vera Cruz Construções Ltda.; c) REP-000231.2010.18.000/9 em face de Chão de Pedra Piso Raspadora Ltda.; e d) REP-000235.2010.18.000/4 em face de Apla Engenharia Ltda.

Permaneceu apenas a Representação em face da Gafisa SPE Empreendimentos Imobiliários Ltda., uma vez que esta foi criada pela 1ã ré para administrar e gerir as obras, certamente encerrando as atividades no final do empreendimento, ou seja, com a finalidade de não deixar pendência para a empresa mãe (1ã ré).

Pois bem, prova de que a terceirização, além de ser irregular, é uma forma de precarização da mão de obra é o expediente de fl. 57 da REP-00075/2010 que instrui a presente ação onde os auditores-fiscais do trabalho (Srs. Valdemar M. de Carvalho Jr. e Walmir Nogueira de Lima) apresentam a seguinte informação:

"Durante ação fiscal iniciada em 2.9.2009 no canteiro de obras denominado FIT Maria Inês, administrado pela GAFISA S/A, verificou-se que trabalhadores estão alojados em ambientes que ferem a dignidade humana.

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De fato, em um galpão com aproximadamente 50 metros quadrados encontramos 16 (dezesseis) trabalhadores, que foram recrutados em Anápolis — GO, em condições precárias, um único banheiro, inexistência de camas, fazendo refeições sentados no chão, às vezes com alimentação imprópria ao consumo humano, tudo conforme cópia de fotos e declarações em anexo.

Como se trata de situação anormal, não comum à nossa rotina de trabalho, solicitamos além da comunicação ao Ministério Público do Trabalho, apoio técnico para condução da ação fiscal, pois, existem fortes indícios de terceirização ilícita e os trabalhadores, que em tese estão em contrato de experiência, estão sendo pressionados pela tomadora deixarem o local de trabalho, como de fato já ocorreu com dois trabalhadores."

Bastante interessante os depoimentos dos trabalhadores terceirizados (pedreiros e serventes), que trabalham no empreendimento denominado Fit Maria Inês, da GAFISA S/A, colhidos às fls. 58/65, cujos trechos achamos por bem transcrever para ilustrar a matéria: "...QUE, pelo que sabem, a proprietária da obra é a GAFISA S/A; QUE trabalham na obra como terceirizados da empresa de propriedade de Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço, em Anápolis/ GO, para trabalhar em Goiânia/GO; QUE em Anápolis há grande oferta de empregos, mas vieram para Goiânia por causa de oferta de melhores salários; QUE havia oferecido salário de R$ 1.700,00 (para pedreiro) e R$ 1.000,00 (um mil reais) para serventes de pedreiro; QUE até a presente data receberam apenas uma "ajuda"; (...) QUE Leonardo dos Santos Pereira, pedreiro, admitido em 2.7.2009, recebeu até o momento R$ 370,00 (trezentos e setenta reais), conforme declarou; QUE vieram em ônibus fretado pelo Sr. Antonio Gonçalves Duarte, com a promessa de alojamento e alimentação; QUE desde o início foram alojados em sala comercial, antigo bar, com apenas um pequeno banheiro; QUE o cômodo foi alugado pelo Sr. Antonio Gonçalves Duarte; QUE no início o banheiro estava com vaso sanitário quebrado, com vazamento, e sem chuveiro; QUE o chuveiro foi providenciado depois de mais de um mês de trabalho e por isso eram obrigados a tomar banho frio; QUE o vaso sanitário ainda está quebrado; QUE no mesmo cômodo chegou 23 (vinte e três) pessoas; QUE alguns dormiam sobre papelão, porque Antônio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não forneceram colchão nem roupa de cama; QUE no local não havia camas; QUE somente há poucos dias o Sr. Rafael, um dos donos, forneceu madeira suficiente para construir apenas quatro camas; QUE os demais dormem em colchões trazidos de casa; QUE o local é muito quente e por isso alguns dormem no lado de fora, onde colocaram duas das camas montadas; QUE Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não forneceram e as roupas de cama não são trocadas; QUE Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não fornecem sabão e não fornece papel higiênico; QUE a limpeza é pelos próprios trabalhadores; QUE Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não fornecem material de limpeza; QUE são levados para suas casas em Anápolis a cada 15 (quinze) dias; QUE bebem água da torneira, sem filtrar; QUE a geladeira era de um trabalhador; QUE no início Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não davam café da manhã; QUE apenas há cerca de dez dias Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço autorizaram

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que uma panificadora ao lado fornecesse pão, manteiga, leite e café; QUE o almoço e o jantar são fornecidos por uma senhora de nome Maria das Graças (...) QUE na GAFISA tem refeitório, mas eles não deixam que eles almocem na empresa, mesmo eles comprando a refeição; QUE por isso têm que ir até o alojamento para comer, mas lá não há mesas nem cadeiras; QUE almoçam e jantam sentados no chão ou dividem as poucas camas; (...) QUE na GAFISA todos os declarantes fazem o reboco da torre Um que é feito por outra terceirizada, de nome Vera Cruz; QUE no serviço da GAFISA todos recebem ordens dos estagiários da Gafisa, Adailton, Leda, Michele; QUE também recebem ordens do mestre de obra da GAFISA; QUE os declarantes sabem que todos são da GAFISA porque usam uniformes da GAFISA; QUE Antonio Gonçalves Duarte e Rafael Lourenço não dão palpites no serviço e não fornecem material de serviço; QUE fazem horas extras, pois trabalham das 7 h às 18 h, de segunda a sexta-feira, e das 6h às 15h do sábado; (...)".

As condições precárias também se encontram demonstradas pelas fotografias de fls. 66/67.

O bem fundamentado Relatório de Fiscalização de fls. 68/82, firmado pelos auditores-fiscais do trabalho, Walmir Nogueira de Lima e Cláudia Maria Duarte, identifica todas as empresas e seus sócios, porém para os fins da presente ação cabe citar o quanto foi apontado a partir das fls. 75, onde afirmam, in verbis:

"3e IRREGULARIDADES

A análise documental das empresas envolvidas, as declarações de trabalhadores e as diligências efetuadas pelo corpo fiscal, deixaram evidente que a Gafisa S/A terceirizou de...

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