Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

AutorAlexandre Reis
Páginas291-303

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PROCESSO: 1262/14.1t8vct-b. G1.S1 n. Convencional: 1ª SECÇÃO relator: ALEXANDRE REIS descritores:

CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL

LEI APLICÁVEL

DEVER DE INFORMAÇÃO COMUNICAÇÃO

ABUSO DO DIREITO VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM

DATA DO ACORDÃO: 13.09.2016 VOTAÇÃO: UNANIMIDADE TEXTO INTEGRAL: S

PRIVACIDADE: 1

MEIO PROCESSUAL: REVISTA DECISÃO: NEGADA A REVISTA

ÁREA TEMÁTICA:

DIREITO BANCÁRIO - ACTOS BANCÁRIOS EM ESPECIAL (ATOS BANCÁRIOS EM ESPECIAL) / CRÉDITO BANCÁRIO / MÚTUO.

DIREITO DO CONSUMO - CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS.

DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / EXERCÍCIO E TUTELA DE DIREITOS.

doutrina:

- FERNANDO gravato de morais, contratos de crédito ao consumo, ALMEDINA 2007, 143 a 145.

- heinrich e. Horster, A PARTE geral do código civil PorTUGUês, 284 e ss..

- JOAQUIM de SOUSA ribeiro, direito dos contratos, estudos, coimbra editora, coimbra, 2007, 49, 61.

- JORGE coutinho de ABREU, do ABUSO do direito, 59 e 60.

- menezes cordeiro, tratado de direito civil, i, PARTE geral, tomo iv, ALMEDINA, coimbra, 2005, 275.

- P. Lima e A. Varela, "código civil" ANOTADO, 4ª ed. Vol. I, 298.

- PAIS de vasconcelos, contratos ATÍPICOS, coimbra, 1995, 423. Legislação nacional: CÓDIGO civil (cc): - ARTIGO 334º. D.l. N. 446/85, com As SUAs SUBSEQUENTES ALTERAÇÕES (lccg): - ARTIGOS 1º, n. 2, 5º, 6º. Legislação comunitária: DIRECTIVA COMUNITÁRIA n. 93/13/cee.

JURISPRUDÊNCIA NACIONAL:

ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

- de 24/2/1999, BMJ 484º-246. - de 18/11/1999, , PROCESSO n. 99b869, em WWW.DGSI.PT .

- de 12/12/2002, , PROCESSO n. 02A3692, em WWW.DGSI.PT .

- de 8/7/2003, PROCESSO n. 03A1832, em WWW.DGSI.PT .

- de 18/4/2006, PROCESSO n. 06A818, em WWW.DGSI.PT .

- de 30/10/2007, PROCESSO n. 07A303048, em WWW.DGSI. PT .

- de 23/10/2008, PROCESSO n. 08b2977, em WWW.DGSI.PT .

- de 20/1/2010, PROCESSO n. 2963/07.6TVLSB.l1.S1, em WWW.DGSI.PT .

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- de 8/4/2010, PROCESSO n. 3501/06.3TVLSB.c1.S1, em WWW. DGSI.PT.

- de 2/12/2013, PROCESSO n. 306/10.0tcgmr.g1.S1, em WWW. DGSI.PT.

- de 2/6/2015, PROCESSO n. 109/13.0tbmld.P1.S1, em WWW. DGSI.PT.

- de 9/7/2015, PROCESSO n. 1728/12.8tbbrr-A.l1.S1, em WWW.DGSI.PT.

SUMÁRIO:

i - É aplicável o regime das cláusulas contratuais gerais ao clausulado inserido no corpo contratual individualizado cujo conteúdo, previamente elaborado, o destinatário não pode influenciar. Ii - o cumprimento das prestações impostas pelos arts. 5º e 6º da lccg - cuja prova onera o predisponente - convoca deveres pré-contratuais de comunicação das cláusulas (a inserir no negócio) e de informação (prestação de todos os esclarecimentos que possibilitem ao aderente conhecer o significado e as implicações dessas cláusulas), enquanto meios que radicam no princípio da autonomia privada, cujo exercício efectivo pressupõe que se encontre bem formada a vontade do aderente ao contrato e, para tanto, que este tenha um antecipado e cabal conhecimento das cláusulas a que se vai vincular, sob pena de não ser autêntica a sua aceitação. Iii - Por isso, esse cumprimento deve ser assumido na fase de negociação e feito com antecedência necessária ao conhecimento completo e efectivo do aderente, tendo em conta as circunstâncias (objectivas e subjectivas) presentes na negociação e na conclusão do contrato - a importância deste, a extensão e a complexidade (maior ou menor) das cláusulas e o nível de instrução ou conhecimento daquele -, para que o mesmo, usando da diligência própria do cidadão médio ou comum, as possa analisar e, assim, aceder ao seu conhecimento completo e efectivo, para além de poder pedir algum esclarecimento ou sugerir qualquer alteração. Iv - É certo que as exigências especiais da promoção do efectivo conhecimento das cláusulas contratuais gerais e da sua precedente comunicação, que oneram o predisponente, têm como contrapartida, também por imposição do princípio da boa-fé, o aludido dever de diligência média por banda do aderente e destinatário da informação - com intensidade e grau dependentes da importância do contrato, da extensão e da complexidade (maior ou menor) das cláusulas e do nível de instrução ou conhecimento daquele -, de quem se espera um comportamento leal e correcto, nomeadamente pedindo esclarecimentos, depois de materializado que seja o seu efectivo conhecimento e informação sobre o conteúdo de tais cláusulas. V - PorÉM, essa constatação, em caso algum, poderá levar a admitir que o predisponente fique eximido dos deveres que o oneram, ou a conceber como legítimas uma sua completa passividade na promoção do efectivo conhecimento das cláusulas contratuais gerais e, sobretudo, uma

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ausência de comunicação destas ao aderente com a antecedência necessária ao conhecimento completo e efectivo, até para que o mesmo possa exercitar aquele seu dever de diligência, nos apontados termos. Uma tal concepção conduziria à inversão não consentida da hierarquia legalmente estatuída entre os deveres do predisponente e do aderente.

Vi - no caso em apreço, apenas no circunstancialismo da subscrição ou outorga do contrato foram dadas a conhecer à aderente a cláusula contratual geral em discussão, quando, por tudo o exposto, a mesma não teria, para o efeito, de desenvolver mais do que uma diligência comum e era à proponente que caberia propiciar-lhe o antecipado e efectivo conhecimento daquela cláusula.

Vii - Por outro lado, o dever de atempada comunicação, face à sua identificada ratio, também não fica preenchido com as declarações constantes na escritura de que, no dia da sua celebração, esta foi lida aos outorgantes e feita a explicação do seu conteúdo, questão cuja pertinência mais se realça atentando na significativa complexidade do clausulado alusivo à "renúncia ao benefício da excussão prévia" e à sua elevada repercussão (importância) para a embargante, para quem, sendo uma funcionária administrativa, aquela é uma expressão de alcance jurídico dificilmente inteligível.

Viii - o "factum proprium" apto a violar a boa-fé ou a confiança da recorrente e a constituir o aqui invocado exercício abusivo do direito pela embargante pressuporia, enquanto facto voluntário, a ciência e a vontade dessa violação. Ora, no caso, a exequente não provou ter propiciado à embargante o efectivo conhecimento da discutida cláusula, pelo que, no contexto, assim configurado, do incumprimento dos deveres de comunicação e de informação que sobre ela impendiam, não podem ser avocados os (inverificados) pressupostos cognitivos da liberdade de contratar por parte da embargante, que integrariam, simultaneamente, o elemento subjectivo da putativa violação da confiança.

IX - Por consequência, não podendo ser subjectivamente imputado à embargante o alegado comportamento anterior, ou a referida conduta voluntária, fica arredada a invocada violação da expectativa ou confiança supostamente gerada na recorrente.

DECISÃO TEXTO INTEGRAL: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

AA deduziu embargos à execução intentada por "banco bb SA", com base em contrato de mútuo com hipoteca e fiança, alegando a opoente que não lhe foi explicitado, nos termos dos artigos 5º, 6º e 8º b), da lccg, o conteúdo e alcance do clausulado de tal contrato, designadamente o tocante às consequências da renúncia ao benefício da excussão prévia, tendo pedido a sua exclusão e, como tal, a desconsideração da sua posição de fiadora.

A exequente contestou, alegando que o contrato não é de adesão e foi precedido duma livre discussão e

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assinado pela embargante depois de lido e explicado a todos os seus inter-venientes.

Foi proferida sentença, julgando a oposição procedente apenas na parte relativa aos juros de mora.

A relação de guimarães, depois de fixar os factos, considerou válida a fiança mas julgou extinta a execução contra a aqui embargante por dever ser excluída do contrato a parte inserta na cláusula (19ª) que contém a declaração de esta, com renúncia ao benefício da excussão, se constituir principal pagadora.

A exequente interpôs recurso de revista desse acórdão, delimitando o seu objecto com conclusões que colocam as questões de saber se

  1. - a exequente cumpriu os deveres de comunicação e informação impostos pelos arts. 5º e 6º da lccg relativamente à dita cláusula (19ª);

  2. - o comportamento da embargante nos autos constitui abuso de direito por contender com as regras da boa-fé.

    "A relação julgou provada a seguinte factualidade:

    "1. O exequente apresentou como título executivo o contrato de mútuo...

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