Alimentos

AutorJoyceane Bezerra de Menezes, Márcia Correia Chagas e Amanda Florêncio Melo
Ocupação do AutorDoutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceara?. Po?s-doutorado em 'Novas Tecnologias e Direito' na Mediterranea Internacional Centre for Human Rights Research (MICHR), Departamento de Direito, Economia e Humanidades - Universidade Reggio Calabria (Ita?lia). / Doutora em Direito...
Páginas517-557
ALIMENTOS
Joyceane Bezerra de Menezes
Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Mestre em Direito pela
Universidade Federal do Ceará. Pós-doutorado em “Novas Tecnologias e Direito” na
Mediterranea Internacional Centre for Human Rights Research (MICHR), Departa-
mento de Direito, Economia e Humanidades – Universidade Reggio Calabria (Itália).
Professora Titular da Universidade de Fortaleza – Programa de Pós-Graduação Stricto
Sensu em Direito (Mestrado/Doutorado) da Universidade de Fortaleza, na Disciplina de
Direitos de Personalidade. Professora associado IV, da Universidade Federal do Ceará.
Coordenadora do Grupo de Pesquisa CNPQ: Direito civil na legalidade constitucional.
Fortaleza, Ceará, Brasil. Editora da Pensar, Revista de Ciências Jurídicas – Universidade
de Fortaleza. Advogada.
E-mail: joyceane@unifor.br.
Márcia Correia Chagas
Doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE; Mestre em
Direito pela Universidade Federal do Ceará – UFC, Pesquisadora na área de Biodireito
e Bioética (PIBIC/CNPq – FUNCAP – PAVIC). Ex-Professora de Direito das Famílias e
Direito de Sucessões na Universidade de Fortaleza – UNIFOR. Professora de Graduação
e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará – UFC.
Amanda Florêncio Melo
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Ceará.
Sumário: 1. Introdução – 2. Princípios constitucionais do direito das famílias; 2.1 Princípio da digni-
dade da pessoa humana; 2.2 Princípio da solidariedade ou do cuidado; 2.3 Princípio da afetividade
– 3. Alimentos: função, pressupostos, características, sujeitos, momento de sua xação e causas de
extinção; 3.1 Função dos alimentos; 3.2 Pressupostos da obrigação/dever de alimentar no direito
das famílias; 3.2.1 Relação de parentesco – conjugalidade – convivencialidade; 3.2.2 Necessidade
de quem os pleiteia; 3.2.3 Possibilidade de quem os presta; 3.2.4 Proporcionalidade – entre neces-
sidade de quem pede e possibilidade de quem presta alimentos; 3.3 Características dos alimentos
no direito das famílias; 3.3.1 Direito personalíssimo – intransmissibilidade – indisponibilidade
– incompensabilidade – impenhorabilidade; 3.3.2 Reciprocidade; 3.3.3 Atualidade; 3.3.4 Impres-
critibilidade; 3.3.5 Irrepetibilidade; 3.3.6 Irrenunciabilidade; 3.3.7 Subsidiariedade e divisibilidade
da obrigação; 3.3.8 Alternatividade; 3.4 Sujeitos passíveis de prestar e de receber alimentos; 3.4.1
Pais e lhos; 3.4.2 Avós e netos; 3.4.3 Irmãos bilaterais e unilaterais; 3.4.4 Tios, sobrinhos e primos;
3.4.5 Cônjuges e companheiros: alimentos denitivos, temporários e compensatórios; 3.5 Quanto
ao momento processual de sua xação: antecipados (provisórios e provisionais) e denitivos; 3.6
Causas de Extinção da Obrigação/Dever de Alimentar – 4. Alimentos gravídicos: livre exercício da
sexualidade x planejamento familiar e suas consequências – 5. Referências.
JOYCEANE BEZERRA DE MENEZES, MÁRCIA CORREIA CHAGAS E AMANDA FLORÊNCIO MELO
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1. INTRODUÇÃO
Ao longo da história das civilizações, observou-se a modif‌icação dos aspectos
funcional e organizacional da família, bem como das relações intersubjetivas entre
os seus membros.
No Brasil, especif‌icamente, assistiu-se à transição da família de modelo patriar-
cal, patrimonialista, hierarquizada e matrimonializada (com vínculo indissolúvel),
cuja regulamentação sofreu inf‌luências predominantes das Ordenações do Reino de
Portugal, calcada no Direito Canônico, bem como da Revolução Francesa sobre o
Código Civil Brasileiro de 1916, para a família nuclear, plural, democrática, reper-
sonalizada, fundada no afeto, com a função primordial de realização e promoção do
desenvolvimento da personalidade de cada um dos que a compõem.
Em atenção a essas modif‌icações, também se observaram alterações na sistemá-
tica do pensionamento alimentar, cuja fundamentação última se extrai do princípio
da solidariedade incidente nas relações intrafamiliares e do princípio da dignidade da
pessoa, imbricados no perf‌il funcional da entidade familiar. Para tratar os alimentos,
o presente capítulo enfoca os perf‌is funcional e estrutural do instituto, apontando
a sua f‌inalidade e os elementos que integram o suporte fático normativo quanto aos
pressupostos, características e sujeitos envolvidos como credor e devedor, além das
hipóteses extintivas da obrigação alimentar. Dentre os alimentandos, observam-se
aqueles marcados por alguma vulnerabilidade que justif‌ica uma proteção especial,
como as crianças/adolescentes, idosos e pessoas com def‌iciências. Adicionalmente,
serão analisados se os chamados alimentos transitórios, compensatórios e gravídi-
cos, f‌iguras emergentes mais recentemente que se mantêm aneladas aos elementos
funcionais da família – marcada pela corresponsabilidade e pelo cuidado mútuo entre
os seus membros. Toda a análise segue as premissas da metodologia civil-constitu-
cional, buscando ressaltar a unidade do ordenamento a partir da força integrativa
das normas constitucionais, sem perder a inf‌luência da realidade fática.
2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DAS FAMÍLIAS
A evolução conceitual da família ao longo das civilizações se ref‌letiu nas suas
funções e em seus objetivos. No livro “A Cidade Antiga”, Fustel de Coulanges (2000,
p. 44-45) demonstra que o principal eixo da família antiga era a religião, elemento
basilar de sua constituição. A “nova” família, também chamada família democrática,
é marcada pela função instrumental de promover o desenvolvimento da pessoa dos
seus membros. Nessa medida, todos os princípios constitucionais da dignidade da
pessoa humana e seus corolários: igualdade, liberdade e integridade psicofísica, além
do princípio solidariedade são o seu substrato axiológico (BODIN DE MORAES,
2010, p. 207). O princípio da afetividade, que foi incorporado, sob esse termo, pela
doutrina e jurisprudência, espelha a corresponsabilidade, o cuidado mútuo e, em
última análise, uma expressão da solidariedade. A despeito da importância desses
princípios e de tantos direitos fundamentais que importam à família, função promo-
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ALIMENTOS
tora da pessoa dos seus membros, três deles serão tratados mais especif‌icamente, dada
a sua imediata inf‌luência em relação à matéria dos alimentos: dignidade da pessoa
humana, solidariedade e afetividade.
2.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
A dignidade da pessoa humana é o princípio norteador de todo o Ordenamento
Jurídico. É, portanto, tal princípio o “epicentro axiológico da ordem constitucional”
(SARMENTO, 2000, p. 60). Exerce importante papel na interpretação e aplicação de
normas de direito público e privado, haja vista que também se impõe entre os mem-
bros da comunidade para o f‌im de assegurar o pleno respeito à pessoa humana. Por
seu intermédio, o direito é chamado a garantir e a promover os atributos intrínsecos
à pessoa, a sua autonomia e a condução de sua vida privada (BODIN DE MORAES,
2010, p. 75). Na dicção de Sarlet (2007, p. 62):
[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano
que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade,
implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a
pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe
garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover
sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão
com os demais seres humanos.
Espraia-se, igualmente, sobre as relações privadas e nas relações familiaristas,
impõe o respeito e a promoção à pessoa dos seus membros, em especial, àqueles mais
expostos à vulnerabilidade, que têm prioridade e prerrogativas especiais reservadas
por lei, como as crianças, as mulheres vítimas de violência, os idosos e as pessoas
com def‌iciência, dentre outros.1
A vulnerabilidade não necessariamente requererá o reconhecimento legal para
justif‌icar um tratamento especial que pode ser, em alguns casos, assegurado por meio
das cláusulas gerais. Fatores de ordens variadas – sociais, pessoais, culturais e eco-
nômicas etc. – podem impingir uma vulnerabilidade ou múltiplas vulnerabilidades
à pessoa, expondo-a à precariedade ou à situação de desigualdade, no gozo dos seus
direitos, como é o caso de muitos órfãos da COVID-19.2 Segundo pesquisa publicada
em novembro de 2021 e acolhida pelo Conselho Nacional de Saúde e pelo Conselho
Nacional de Direitos Humanos, um contingente aproximado de 113 mil de crianças
1. “Neste ambiente, de um renovado humanismo, a vulnerabilidade humana será tutelada, prioritariamente,
onde quer que se manifeste. Terão precedência os direitos e as prerrogativas de determinados grupos con-
siderados, de uma maneira ou de outra, frágeis, e que estão a exigir, por conseguinte, a especial proteção
da lei. Nesses casos estão as crianças, os adolescentes, os idosos, os portadores de def‌iciências físicas e
mentais, os não proprietários, os consumidores, os contratantes em situação de inferioridade, as vítimas
de acidentes anônimos e de atentados a direitos de personalidade, os membros da família, os membros de
minorias, entre outros” (BODIN DE MORAES, 2010, p. 84).
2. Quanto ao impacto da Covid-19 no Direito de Família, como um todo, vale a leitura da obra organizada por
Nevares e Xavier (2020).

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