Análise de algumas atividades minerárias paradigmas para o estudo do fechamento de mina

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Analisando o panorama da mineração brasileira, temos exem-
plos, que bem analisados, contribuem para a evolução do assunto.
Vejamos alguns casos.
1. MINA DE SERRA DO NAVIO
Reportagem da Revista National Geographic mostra Serra
do Navio, hoje, uma mina exaurida de manganês, localizada no
Estado do Amapá. Entrou em operação na década de 1950. Foi
fechada em 1998.
O complexo mineiro consistia de cava, usina de benecia-
mento e estrada de ferro, esta última ligando o porto à mina,
e às vilas existentes no porto e na mina. A cidade de Serra
do Navio é hoje sede de um município emancipado. Após
o m da exploração de manganês nos anos 1990, a cidade
continuou ocupada. Empobreceu, é verdade. Os atuais 4 mil
habitantes vivem da agricultura de subsistência e do dinheiro
que a prefeitura injeta na economia, recebido do governo fe-
deral por meio do Fundo de Participação dos Municípios. Há
um pequeno comércio, um hospital sucateado e um cibercafé
com internet via satélite. Em 2010, o Instituto do Patrimô-
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ANÁLISE DE ALGUMAS
ATIVIDADES MINERÁRIAS
PARADIGMAS PARA O ESTUDO
DO FECHAMENTO DE MINA
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DENES MARTINS DA COSTA LOTT
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nio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN – tombou Ser-
ra do Navio, declarando-a Patrimônio Cultural. A vila é um
projeto do arquiteto modernista Osvaldo Bratke, tendo sido
planejada com conceitos que atualmente são considerados
sustentáveis. Para amenizar o forte calor, as casas aproveitam
a ventilação natural com uso de venezianas xas de madeira.
A ferrovia ainda constitui a principal ligação com a capital,
Macapá, situada há cerca de 200 quilômetros. Algumas casas
ainda mantêm características originais, outras estão sendo
modicadas, algumas se encontram em ruínas. A piscina
do hotel, com trampolim e raias para competições, acumu-
la água de chuva em seus azulejos quebrados. A esperança
da prefeitura está concentrada na volta da mineração e no
implemento do turismo. O projeto turístico inclui as minas
desativadas. Ao menos uma delas, chamada Lagoa Azul, já
se tornou local de lazer. Antiga cava foi tomada pela água
do lençol freático. A incrível cor azul da lagoa, com um tom
articial, deu margem a certas especulações de que ela estaria
contaminada, talvez por arsênio. Não há comprovação, mas
esta possibilidade é remota. A maior probabilidade é que o
tom da água se deve a interação com a rocha, rica em sulfeto
de ferro. A água não é adequada para beber por causa da aci-
dez, mas é quase certo que não apresente maiores riscos. O
problema ambiental mais sério é mesmo o esgoto, que passou
a ser jogado direto no Rio Amapari. Os estoques de manga-
nês no subsolo parecem ter sido exauridos. O município tem
outras jazidas ainda não exploradas de ouro e ferro. Na re-
gião já há atividades extrativas em Pedra Branca do Amapari,
cidade vizinha. Ainda que a mineração volte ao município, as
novas mineradoras não se instalam em Serra do Navio, mas
em Pedra Branca. As disputas judiciais e o fato de as casas
já terem sido invadidas foram fatores inviabilizadores. Ou-
tra variável é que cerca de 70% da área do município está
protegida e não pode ser explorada, pois faz parte do Parque
Nacional Montanhas do Tucumaque, o maior do país, com
38.670km². A reserva Tucumaque guarda grande quantida-
de de espécies de animais e plantas à espera de catalogação
cientíca, um patrimônio natural que parece conter a fonte
de recursos esperada por Serra do Navio desde a saída da mi-
neradora. O porto que se situa próximo à Capital do Ama
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ANÁLISE DE ALGUMAS ATIVIDADES MINERÁRIAS
PARADIGMAS PARA O ESTUDO DO FECHAMENTO DE MINA
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está, atualmente, e em operação, dando sustentação econô-
mica à vila portuária.21
Esse texto é uma pequena amostra do que remanesce, hoje,
de um projeto que teve início em 1954 e se encerrou de forma
antecipada em 1999. Existem muitos outros detalhes sobre os
impactos ambientais desse grande empreendimento minera-
dor de mais de 40 anos de duração e da vila operária vizinha,
na qual viveram permanentemente cerca de 1.500 pessoas,
ambos em meio a orestas tropicais primárias. No entanto,
constata-se que os efeitos foram previsíveis, locais, restritos
ao pequeno perímetro da mineração e tiveram magnitude
moderada, com a óbvia exceção do nivelamento e desapa-
recimento de uma série de morretes que continham a maior
parte do minério. A topograa local foi mudada para sempre
e alguns pequenos rios que desciam dos morretes nivelados
simplesmente desapareceram.
Drummond e Pereira,22 no trabalho intitulado O Amapá nos
Tempos do Manganês, retratam todo o histórico de Serra do Navio.
Projeto de responsabilidade da iniciativa privada, essa mineração
de manganês, no Amapá, propiciou a arrecadação de uma enorme
soma de royalties em todo o tempo que perdurou. No entanto, a
riqueza não foi investida na região onde a mina se situava, mas,
principalmente, na capital do hoje Estado do Amapá, Macapá. No
que diz respeito à forma como os diversos governos do Amapá
gastaram as elevadas quantias referentes aos royalties é ponto pa-
cíco que os recursos não foram investidos na própria Vila Serra
do Navio. A região cou praticamente esquecida, tanto nos in-
vestimentos privados complementares pela ICOMI quanto nos
investimentos públicos. Serra do Navio não parecia necessitar de
investimentos ou de alguma atenção especial por parte do Poder
Público. Era uma pequena vila privada, pertencente a uma gran-
de e próspera empresa, que garantia para os seus residentes uma
21 REVISTA National G eographic, p. 20-27, fev. 2011.
22 DRUMMOND, José Augusto; PEREIR A, Mariângela de Araújo Póvoas. O
Amapá nos tempos do manga nês – Um estudo sobre o desenvolvimento de
um estado ama zônico. Rio de Janeiro: Gara mond, 2007, p. 121-449.
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