Análise de dados

AutorRenata Ghisleni de Oliveira
Páginas60-107
3. ANÁLISE DE DADOS
A análise está organizada em dois eixos: o primeiro discute saúde
mental no contexto do ensino jurídico universitário e o segundo toma a
diversidade como um analisador da relação entre saúde mental e
formação jurídica. A diversidade abre dois caminhos analíticos, sendo o
primeiro as políticas afirmativas, raça e classe e, o segundo, gênero e
sexualidade. Desse modo, estas dimensões são interseccionadas para
compreender os processos de produção de saúde e adoecimento e de
formação acadêmica no contexto jurídico.
3.1 SAÚDE MENTAL NO CONTEXTO DO ENSINO JURÍDICO
UNIVERSITÁRIO
Em nossa realidade social o tema do sofrimento psíquico de
universitários/as não é mais ignorado e vem ganhando cada vez mais
espaço por tratar-se de um problema de saúde pública. Nesse cenário,
percebe-se o esforço de autores/as e pesquisadores/as em desenvolver
estudos quantitativos e qualitativos dos registros psicopatológicos
encontrados, com a utilização de questionários, escalas, testes ou
entrevistas semiestruturadas. Em geral, tais estudos buscam descrever
as manifestações do sofrimento psíquico, apresentadas por estudantes,
na tentativa de estabelecer uma relação direta entre os resultados das
aplicações de questionários e testes ou entrevistas, com a queixa
apresentada.
Esse modo de abordar o tema da saúde mental e do sofrimento na
universidade, além de reforçar a individualização e (psico)patologização
do problema, acaba por não levar em conta outras dimensões
importantes dessa construção, tais como: o contexto social, econômico,
político e histórico em que se vive, o panorama atual da universidade e
as transformações pelas quais o ambiente acadêmico passou, sobretudo
nos últimos anos. Acredita-se que uma perspectiva mais ampliada dessa
problemática contribuiu fortemente para a elaboração de políticas
institucionais nas universidades.
A teoria vitalista de Georges Canguilhem (2009) funda-se numa
concepção ativa da vida, que não exclui acidentes ou mesmo a doença.
Para o autor: “a saúde é uma margem de tolerância às infelicidades do
meio” (CANGUILHEM, 2009, p. 78). Essa ideia auxilia numa compreensão
de saúde que se desloca do olhar patológico e marca uma diferença em
relação à tradição biomédica, predominantemente biológica e
unicausal, que limita a saúde à ausência de doença.
Para o autor, o estado de saúde não é um estado puro e estático,
incompatível com a doença. Ao contrário, trata-se de um estado em que
a ideia da doença é uma constante. Assim, a ameaça da doença é um
dos elementos constitutivos da saúde. A saúde é, portanto,
possibilidade de lutar contra a doença(CANGUILHEM, 2009).
De acordo com Yasui (2006), em diálogo com o pensamento de
Canguilhem, o sofrimento psíquico passa a ser entendido como um
processo psicossocial multifacetado, numa compreensão de saúde que
leva em conta dimensões políticas, econômicas e sociais. Paulo
Amarante (2007), figura de destaque da reforma psiquiátrica brasileira,
sustenta que o cuidado em saúde é um ato político de afirmação de
direitos humanos e sociais.
Esses aportes teóricos auxiliam na compreensão de que, para além
dos significados individuais e das categorias generalistas, marcadores
sociais condicionam a subjetividade das pessoas. Isso se reflete nas
experiências pessoais e nas condições de saúde mental de cada
um/uma.
No decorrer da pesquisa, surgiram pistas para pensar questões de
saúde mental no contexto do ensino jurídico universitário. As escritas
nas paredes foram os primeiros enunciados de sofrimento e mal-estar
que a pesquisadora teve contato (figuras 02, 03, 04, 05, 06 e 07):
“Eu aposto que vocês não queriam fazer esse curso”;

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