Análise teórica do homicídio juvenil masculino: categorização da violência e sua articulação multe-escalar no Brasil urbano / Theoretical analysis of the male youth homicide: categorization of violence and its multiscale joint in urban Brazil

AutorAlex Manetta
CargoBacharel em Geografia (IG/Unicamp), Mestre e Doutor em Demografia (IFCH/Unicamp) com pós-doutorado na Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE). Função e afiliação: Professor Pesquisador afiliado à Área Acadêmica de Sociología y Demografía do Instituto de Ciencias Sociales y Humanidades da Universidad Autónoma del Estado de Hidalgo (...
Páginas970-992
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 3. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.22469
__________________________________________________________________
Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 3. ISSN 2317-7721 pp.970-992 970
A LI SE TE ÓR IC A D O HOM IC ÍD IO JU VE NI L M ASC UL IN O: CA TE GO RI ZA ÇÃ O D A
VIO NC IA E S UA ART IC UL ÃO M ULT IE SC AL AR N O B RAS IL U RBA NO
THE OR ET IC AL AN AL YS IS OF T HE M ALE YO UT H H OMI CI DE : C ATEGORIZ AT IO N O F
VIO LE NC E AND I TS M ULT IS CA LE J OIN T IN URB AN B RAZ I L
Ale x Man et ta 1
Resumo
Esse artigo se compõe de um estudo sobre as relações entre as manifestações locais do homicídio
juvenil masculino e a expansão de fenômenos globais. A metodologia utilizada consiste em
qualificar as manifestações predominantes do homicídio como uma categoria particular de
violência direta, que se expressa através de uma interação de tipo triangular com outras duas
categorias: a violência estrutural e a violência cultural. Partindo dessa distinção categórica se
avança em direção ao reconhecimento de uma articulação d e caráter multe-escalar, segundo a
qual cad a uma das três categ orias de vi olência - descritas por Galtung (1999) - pode ser melhor
apreendida através de escalas espaciais específicas. Como resultado vislumbra-se uma contribuição
à análise teórica e conceitual da violência homicida no Brasil urbano, salientando qu e se trata de
um fenômeno que não deve ser diretamente relacionado aos contextos locais de relativa pobreza,
já que deriva de relações muito mais a mplas e complexas. Como conclusão destaca-se que a
interpretação a respeito do processo de elevação da incidência do homicídio entre homens jovens
deve ser buscada exatamente na associação entre dinâmicas espacialmente localizadas e
elementos estruturais do sistema capitalista contemporâneo.
Palavras-chave: homicídio juvenil masculino; violência; manifestações locais; fenômenos globais.
Abstract
This article consists of a study based on the relationship between the local manifestations of the
male youth homicide and the expansion of global phenomena. The methodology used is to qualify
the prevailing murder manifestations as a particular category of direct violence, which is expressed
through a triangular type of interaction with the other two categories: structural violence and
cultural violence. From this categorical distinction it is progressing toward recognition of a
multiscale articulation, according to which each one of the three categories of violence - described
by Galtung (1999) - can be best apprehended through specific spatial scales. As a result we have a
contribution to the theoretical and conceptual analysis of homicidal violence in urban B razil,
highlighting that it is a phenomenon that should not be directly related to local contexts of relative
poverty, since it derives from m uch broader and complex relationships. In conclusion it is
emphasized that the interpretation about the process of rising of the incidence of male youth
homicide is to be found precisely in the as sociation between spatially localized dynamics and
structural elements of the contemporary capitalist system.
Keywords: male juvenile homicide; violence; local manifestations; global phenomena.
1 Bacharel em Geografia (IG/Unicamp), Mestre e Doutor em Demografia (IFCH/Unicamp) com pós -doutorado
na Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE/IBGE). Função e afiliação: Professor Pesquisador afiliado à
Área Acadêmica de Sociología y Demografía do Instituto de Ciencias Sociales y Humanidades da Universidad
Autónoma del Estado de Hidalgo (UAEH/México). E-mail: alexmanetta@hotmail.com
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 3. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.22469
__________________________________________________________________
Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 3. ISSN 2317-7721 pp.970-992 971
INT RO DU ÇÃ O
Muito comia a guerra, muito a guerra enriquecia. É a guerra aquele monstro
que primeiro que devore os homens lhes despeja os bolsos, um por um,
moeda atrás de moeda, para que nada se perca e tudo se transforme, como
é lei primária da natureza... E quando está saciada de manjares, quando já
regurgita de farta, continua no jeito repetido de dedos hábeis, tirando
sempre do mesmo lado, metendo sempre no mesmo bolso (SARAMAGO,
1980: 178).
A sociedade brasileira se desenvolveu em um sistema no qual o uso da violência foi, e
continua sendo, recurso frequentemente adotado como forma de resolução de conflitos (VELHO,
2000). Sugere-se, no entanto, que o panorama atual apresenta novidades, ou seja, características
peculiares reveladas pelo agravo do homicídio entre h omens jovens (com idades entre 15 e 24
anos).
No Brasil o crescimento recente das taxas de homicídio afetou particularmente o segmento
juvenil masculino (WAISELFIZS, 2015a; 2014a e 2013), tanto nas capitais e regiões metropolitanas
quanto no interior do país (WAISELFIZS, 2010), em um contexto no qual predominaram os crimes
cometidos em locais públicos, entre pes soas que não eram íntimas e nem mesmo conhecidas, com
a utilização crescente de armas de fogo (ZALUAR, 2007; WAISELFIZS, 2015b).
Disseminaram-se pelo país elevados riscos de homicídio entre homens jovens, sobretudo
entre residentes de periferias urbanas (ADORNO, 2002; WAISELFIZS, 2011), cenário no qual
ganham destaque duas d as seis características da mortalidade violenta no Brasil, descritas por
Minayo (2009): a concentração dos homicídios por sexo, por idade e por local de residência; e a
prevalência, como meio, da utilização de armas de fogo.
O Gráfico 1 ilustra como progrediram as taxas2 de homicídio da população total brasileira,
que passaram de 11,7 para 28,6 (homicídios para cada 100 mil pessoas) entre os anos 1980 e 2013,
correspondendo a uma variação próxima aos 144 (%) no período. Já as taxas de homicídio da
população total masculina evoluíram de 21,2 para 52,9 (homicídios para cada 100 mil pessoas), em
uma variação de quase 150 (%) entre os anos 1980 e 2013. No que se refere à população juvenil
masculina (com idades entre 15 e 24 anos), as taxas de vitimização por homicídio aumentaram de
31,6 para 114 (homicídios para cada 100 mil pessoas) no período (1980-2013), representando uma
variação superior aos 260 (%). No que diz respeito à evolução d a incidência de homicídio entre
2 Nota técnica: para o cálculo das taxas de homicídio foi adotada a classificação proposta por Lozada et. al
(2009), segundo a qual os homicídios correspondem às mortes classificadas nas categorias entre E960/E978
(CID-9) (1979-1995) e entre X85/Y09 e Y35/Y36 (CID-10) (1996-2010). Foram utilizadas as estatística vitais
contidas no Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde (SIM/MS).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT