Os argumentos relativos a direitos nas ocupações de escolas no estado de São Paulo (2015): experiências de desrespeito, reconhecimento e política pré-figurativa

AutorRicardo Juozepavicius Gonçalves
CargoDoutorando em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (2018-) e bolsista FAPESP
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 3, 2022, p. 1787-1819.
Ricardo Juozepavicius Gonçalves
DOI: 10.1590/2179-8966/2021/52603| ISSN: 2179-8966
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Os argumentos relativos a direitos nas ocupações de
escolas no estado de São Paulo (2015): experiências de
desrespeito, reconhecimento e política pré-figurativa
The rights-related claims in public school occupations in the state of São
Paulo (2015): experiences of disrespect, recognition and prefigurative politics
Ricardo Juozepavicius Gonçalves1
1 Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail:
ricardojg90@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1539-9056.
Artigo recebido em 9/07/2020 e aceito em 27/01/2021.
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 3, 2022, p. 1787-1819.
Ricardo Juozepavicius Gonçalves
DOI: 10.1590/2179-8966/2021/52603| ISSN: 2179-8966
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Resumo
Este trabalho apresenta uma análise e interpretação teórica das reivindicações
relacionadas a direitos relatadas pelos estudantes nas ocupações de escolas
públicas no estado de São Paulo, em 2015. Primeiro, reconstruo o caso por meio de
um recorte de entrevistas realizadas com os estudantes em que mencionam as suas
experiências de desrespeito diante da proposta governamental de “reorganização
escolar. Em seguida, mobilizo elementos das concepções de teoria crítica de Axel
Honneth e Robin Celikates que podem ser produtivos para interpretar experiências
e práticas sociais concretas em contextos de lutas sociais. Por último, considerando
as observações sobre a “esfera do direito” no l ivro Luta por reconhecimento,
proponho uma interpretação teórica dos argumentos e reivindicações relacionadas
aos direitos como consistindo em um recurso prático e medium compartilhado que
permitiu que os protestos rev erberassem por todo o estado e em outros setores
sociais distantes dos estudantes.
Palavras-chave: Ocupação; Movimento secundarista; Reconhecimento; Política pré-
figurativa; Teoria crítica.
Abstract
This paper presents an analysis and theoretical interpretation of claims related to
rights reported by students in the public-school occupations in the state of São
Paulo, in 2015. First, I perform a reconstruction of the case drawing on a selection
of interviews with students, in which they mention their experiences of disrespect
in face of the government’s proposal of school reorganization. After that, I
mobilize elements of Axel Honneth and Robin Celikates' conceptions of critical
theory that can be productive for the interpretation of concrete social experiences
and practices in contexts of social struggles. Finally, considering the observations on
the sphere of rights in the book Struggle for Recognition, I propose a theoretical
interpretation of the arguments and claims related to rights as consisting a practical
resource and shared medium that allowed the protests to reverberate throughout
the state and in other social sectors distant from students.
Keywords: Occupy; Students’ movement; Recognition; Prefigurative politics; Critical
theory.
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 3, 2022, p. 1787-1819.
Ricardo Juozepavicius Gonçalves
DOI: 10.1590/2179-8966/2021/52603| ISSN: 2179-8966
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Introdução1
O movimento das ocupações de escolas públicas no estado de São Paulo no final de
2015 foi uma mobilização massiva e sem precedentes na história dos movimentos
sociais brasileiros. Alunos e alunas das escolas públicas se uniram com o objetivo de
barrar a medida governamental da “reorganização escolar”, utilizando para isso
diversas táticas de contestação, entre elas a ocupação dos prédios de suas escolas.
Este trabalho discute as motivações para os protestos e as demandas
relacionadas a direitos tematizados pelos estudantes, reconstruindo as experiências
dos próprios sujeitos envolvidos por meio de um recorte e análise de entrevistas e
pesquisas realizadas na época dos protestos e das ocupações. O objetivo dessa
análise será uma tentativa de acessar a perspectiva dos próprios estudantes ao
articular e relatar as suas experiências, especificamente quando mencionaram seus
entendimentos sobre injustiça, violações de direitos e suas aspirações quanto à
efetividade e ampliação de direitos constitucionais relacionados à educação pública
e à participação social na definição de suas diretrizes.
Este recorte argumentativo é proposto pois, na literatura que discute esse
episódio, não há, até o momento, uma análise que trate de forma isolada e
específica os argumentos relacionados a direitos e suas consequências para o
desenvolvimento dos protestos e ocupações2. Ao fazer isso, levanto uma hipótese
de interpretação da capacidade do movimento de influenciar e receber apoio da
sociedade civil em tão curto espaço de tempo, fator decisivo para impedir a
implementação da medida governamental à época.
Em um segundo momento, apresento algumas observações sobre as
concepções teóricas críticas de Axel Honneth e Robin Celikates em relação à
1 Este trabalho foi elaborado com o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
São Paulo (FAPESP) (processos nº 2018/00924-1 e 2019/12975-2). Versões parciais e preliminares
deste texto foram apresentadas no IX Seminário Discente da Pós-Graduação em Ciência Política da
Universidade de São Paulo e no X Seminário Nacional de Sociologia & Política da Universidade Federal
do Paraná, ambos em 2019, agradeço a todos os participantes por seus c omentários nestas
oportunidades. Agradeço também a Arthur Bueno, Luiz Phelipe Oliveira Dal Santo, Rafaella Seixa
Vianna e aos dois avaliadores anônimos da Revista Direito e Práxis por suas críticas e sugestões para
aprimoramento do trabalho. As eventuais falhas e imprecisões rema nescentes são de inteira
responsabilidade do autor.
2 Para uma visão ampla sobre questões relacionadas às ocupações de escolas em diversos estados
brasileiros nesse período, ver a coletânea de pesquisas organizadas em Ocupar e Resistir: Movimentos
de ocupação de escolas pelo Brasil (2015-2016) (JANUÁRIO, MEDEIROS, MELO, 2019).

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