Art. 384 da CLT e seu aspecto constitucional

AutorGianini Rocha Gois Prado
CargoAdvogada militante desde 1996
Páginas27-34

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1. Introdução

A Consolidação das Leis Trabalhistas, no Capítulo III que disciplina os períodos de descanso em face da proteção do trabalho da mulher, precisamente no art. 384, preceitua o direito ao intervalo de quinze minutos, para a mulher, antes de dar início à jornada extraordinária, a saber: “Em caso de prorrogação do horário normal, será obrigatório um descanso de 15 (quinze) minutos, no mínimo, antes do início do período extraordinário de trabalho.”

Hodiernamente, ainda pairam divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto a sua aplicabilidade e abrangência interpretativa em face da CRFB/88.

A divergência prima facie emana em se definir se tal dispositivo foi recepcionado ou não pela Constituição da República Federal do Brasil de 1988 e, em caso positivo, se sua interpretação deve ser feita de modo isonômico materialmente para homens e mulheres ou somente para estas.

2. Evolução histórica do sistema jurídico sob a ótica dos direitos humanos

Na Idade Média, o direito natural ou “direito não escrito” era considerado superior e anterior

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ao direito positivo, pois refletiva a vontade divina em toda sua plenitude, vez que era a vontade da lei escrita.

Até o final do século XVIII, conviviam as duas espécies de direito, o natural e o positivo. Depois de tal período passou a prevalecer o positivismo jurídico por retratar uma segurança jurídica e ser considerado o direito propriamente dito, saindo de cena o direito natural que perdeu o status de direito.

Esta transitoriedade dá vez à passagem da concepção dualista em que conviviam as duas espécies de direito que eram o natural e o positivo para a corrente monista, donde passou a imperar o positivismo do Estado.

O Código de Napoleão de 1804 rechaçava a ideia de que a sociedade fosse regida por princípios de direito natural, uma vez que as leis devem trazer as previsões para solucionar os casos concretos, dando ideia de plenitude do sistema, sem espaço para lacunas jurídicas.

Para Noberto Bobbio: “O positivismo jurídico considera a norma como um comando, formulando a teoria imperativista do direito.”

No sistema positivista, ao juiz não é dado o poder-dever de ultrapassar os limites trazidos pelo legislador, posto que se a lei é justa ou injusta, somente, cabe ao seu aplicador seguir os seus ditames, resolvendo os casos que lhe são postos de acordo com o direito positivado pelo Estado.

Dura Lex sed Lex era o jargão preferido pelos amantes do sistema positivista, pois a questão de direito justo ou injusto apenas ficava no âmbito filosófico, posto que a lei é sempre justa em face de que ela emana da vontade do povo por intermédio dos seus legisladores escolhidos pelo sufrágio universal.

Montequieu afirma que “o juiz é a mera boca da lei”. Para o positivismo, o juiz deve utilizar o método da interpretação literal e gramatical, jamais se permitindo em tal sistema o ativismo pan ou microprocessual.

Não poderia deixar de falar sobre o normativismo kelsiano que no início do século XX publicou a sua obra mais importante do pensamento jurídico, a tão aclamada Teoria Pura do Direito. O austríaco Hans Kelsen revelou por tal obra o seu intento de construir a teoria “pura” do direito.

Seu principal escopo era de concretizar o estudo do direito na norma, sem negar a conexão que havia entre as disciplinas de conhecimento humano. Porém, pela sua teoria, ele procurava afastar da ciência do direito os fatores que não lhe são próprios, uma vez que o direito deveria se ocupar apenas e tão somente com a ordem normativa. Havia um apelo ao olhar puro do jurista que não deve se deixar influenciar pelas ideologias e a ideia de norma era no sentido estrito, ou seja, a lei.

Kelsen propôs um corte epistemológico do Direito, uma vez que o jurista deve ter a sua atenção voltada somente para a norma. Divulgou ainda a concepção unitarista do direito, teoria monista, em que o Estado era a única fonte normativa.

A moderna doutrina traz uma forte crítica à famosa Teoria Pura do Direito, posto que se o olhar do jurista for puro e abstrair os fatores: psicológicos, sociológicos, ideológicos, humanísticos, políticos, éticos e morais, está se dando mais valor ao tecnicismo jurídico do que à aplicação da norma com os fins a que ela efetivamente se propõe.

Na visão da Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale, figura como uma vertente do culturalismo, quando ele afirma que direito é fato, valor e norma. Direito é o fato social, mas o sentido jurídico da norma, ao que se soma o valor atribuído ao intérprete. Nesta concepção, o direito é um fenômeno plural-pluralismo jurídico, ao contrário do que pensava Kelsen, para quem o direito contém somente normas.

Ainda no século XIX, Ihering já afirmava que: “direito não é um fim em si mesmo, mas tão somente um meio a serviço de um fim, sendo que esta finalidade consiste na existência da própria sociedade.”

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O término do regime nazista e o final da II Guerra Mundial ocasionaram uma grande transição com mudanças significativas quanto ao positivismo ideológico até então consolidado no sistema jurídico.

As atrocidades praticadas pelo regime nazista foi um retirar de véu para o positivismo ideológico que, até então, é consolidado e imaculado.

Traz Goerge Marmeslstein que, pela teoria positivista, a norma deve ser cumprida e obedecida incondicionalmente pelas autoridades públicas e pelos cidadãos, independentemente de seu conteúdo, não cabendo ao jurista formular qualquer juízo de valor, apenas deverá cumpri-la rigorosamente.

E esta foi a tese levantada em defesa, pelos advogados, dos nazistas, posto que como agiram sob o comando de Hitler, apenas estavam cumprindo ordens e por sua vez cumprindo as leis e, por isso, não haveria o que se falar em responsabilização pelo crimes diabólicos, inclusive genocídio, praticados contra a humanidade.

Deste marco histórico, emanou nova corrente jusfilosófica que é chamada de pós-positivismo, cujo propósito é inserir na ciência jurídica os valores éticos indispensáveis para a proteção da dignidade da pessoa humana.

O hoje Ministro do STF Luís Roberto Barroso em sua obra O direito constitucional e a efetividade de...

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