As constituições subnacionais e direitos fundamentais nas federações / Subnational constitutions and fundamental rights in federations

AutorJosé Adércio Leite Sampaio
CargoDoutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e da Escola Superior Dom Helder Câmara. Procurador da República. E-mail: joseadercio.contato@gmail.com
Páginas183-215
Revista de Direito da Cidade vol. 11, nº 1. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2019.34969
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Resumo
As federações diferenciam-se entre si quanto ao espaço de autonomia que as suas
Constituições deixam aos textos constitucionais das unidades subnacionais, influenciando o
nível de proteção normativa dos direitos fundamentais no âmbito do constitucionalismo
subnacional. Naqueles em que é deixado um espaço maior ao trabalho constituinte, as
declarações de direitos subnacionais tendem a ser mais detalhadas e mais inovadoras do que a
existente na Constituição federal. Os direitos sociais, a proteção ambiental e os direitos das
minorias estão mais presentes naquelas do que nesta. No Bras il, as C onstituições estaduais
tendem a detalhar os direitos sociais reconhecidos na Constituição federal, bem como a defesa
do meio ambiente, dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, dos afro-brasileiros e de
outras minorias. A efetividade dessa proteção, no entanto, é polêmica no Brasil e em outros
Estados federais.
Palavras-chave: Estado federal; Constitucionalismo subnacional; Direitos fundamentais
Abstract
Federations differ among themselves in terms of the autonomy space that their constitutions
leave to the constitutional te xts of subnational units, influencing the level of normative
protection of fundamental rights within the framework of subnational constitutionalism. In
those where more space is left for constituent labor, subnational declarations of rights tend to
be more detailed and more innovative than that one in the federal Constitution. Social rights,
environmental protection a nd the rights of minorities are more present in those than in this
one. In Brazil, the state constitutions tend to detail the social rights recognized in the federal
constitution, as well as the defense of the environment, the sexual and reproductive rights of
1 Doutor e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais e da Escola Superior Dom Helder Câmara. Procurador da
República. E-mail: joseadercio.contato@gmail.com
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women, Afro-Brazilians and other minorities. The effectiveness of this protection, however, is
controversial as in Brazil as in other federations.
Keywords: Federal state; Subnational constitutionalism; Fundamental rights
IN TR OD UÇÃ O
A literatura constitucional e política costuma diferençar a federação das outras formas
de Estado pela competência constitucional que possuem as entidades subnacionais,
especialmente os extratos de segundo nível (estados-membros, cantões, comunidades, regiões,
dentre outros nomes por que são designados). Embora definidas e, portanto, limitadas pela
Constituição federal, elas não dependeriam da vontade do legislador federal ordinário (PRÉLOT,
1972, p. 235 ss, 2 52; FAVOREU, 2006, p. 43 3). As limitações impostas pelo texto federal variam
consideravelmente de um para outro Estado federal. De toda forma, é nos domínios da
federação que, pe ààààààà àààà
pois se, é nela, que mais bem se apresenta a autonomia constitucional da s unidades
federativas, é de se esperar que mais se te nha espaço de desenvolvimento dos elementos que
caracterizam o ideário do constitucionalismo de limitação de poder e garantia de direitos
fundamentais (SAMPAIO, 2002; 2013).
Os direitos fundamentais s ão o centro ou, pelo menos, um dos pr incipais eixos do
constitucionalismo (SAMPAIO, 2013; 2015). Seu reconhecimento formal pelos Estados
constitucionais é a regra, embora existam exceções notáveis. A Austrália, por exemplo, um
Estado constitucional e federal, não possui uma declaração de direitos, preferindo-se a força
das tradições dos direitos da Common Law. Há uma Constituição formal orgânica e uma
Constituição material de direitos (SAUNDERS, 1999). Em sendo regra, deve-se analisar que lugar
tais direitos ocupam no temário constituinte subnacional nas federações. É esse o objeto do
presente artigo. Por meio do estudo comparado e de revisão bibliográfica, procura-se identificar
como os textos constitucionais das unidades subnacionais tratam o assunto.
CO NS TI TUC IO NA LI SMO S UBNAC IO NA L N OS ES TA DO S FED ER AIS
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norma constitucionais que promovem os direitos fundamentais e a separação de poderes na
unidades político-territoriais que se situam, sobretudo, imediatamente abaixo do g overno
nacional (GARDNER, 2007, p. 3; MA RSHFIELD, 2011, p. 1153). É de se esperar que nas
federações, ele seja mais desenvolvido, em virtude de ser nelas em que as unidades
subnacionais, especialmente de segundo nível como est ados-membros, Länder ou cantões,
possuem autonomia constitucional. (ELAZAR, 1991, p. xv; STEPAN, 1998; HORTA, 2010, p. 329-
330). É nelas que a Constituição federal e não o legislador ordinário prevê sua existência e
os espaços que lhe são deixados, o que não sucede, por exemplo com os Estados unitários e
descentralizados (PRÉLOT, 1972, p. 235 ss, 252; BADÍA, 1976; FAVOREU, 2006, p. 433)2.
Os Estados que se autoproclamam federais se dividem em dois grupos: os que preveem
a elaboração de uma Constituição subnacional e os que a proíbem. Sob o que se disse no
àà ààà àààà àPà à
autores, no entanto, haveria mais de um c ritério de caracterização da s federações, sendo a
autonomia constitucional apenas um deles3. A participação das unidades subnacionais na
formação de vontade nacional seria, de regra, mais imp ortante (LE FUR, 1896, p. 673 -674). Não
se visa discutir esse tema aqui, pois, mesmo que se excluíssem os autoproclamados federais
sem autonomia c onstitucional subnacional, haveria um grupo significativo de Estados que a
preveem, merecendo a atenção. Sem embargo, dentro dos limites estreitos deste estudo,
poder-se-á valer de alguns exemplos apresentados por esse grupo, pela autopr oclamação e
peculiaridades que alguns apresentam. A Índia, por exemplo, admite que apenas Caxemira
possua uma Constituição (Secs. 3, 168-212).
Entre os sistemas que preveem expressamente a autonomia constitucional subnacional,
diferenças importantes. Hà à à à à à à à à à à
elaboração do texto constitucional pelas unidades subnacionais. O Brasil é um exemplo dos que
impõem um dever de autoconstituição. O Art. 25 da Constituição federal reconhece a
2 Distinção assumida pela jurisprudência do Tribunal Constitucional da Itália (2007) e da Espanha. Se, em
2007, chegou o TC espanhol a considerar que os estatutos das autonomias eram produto de um
àà àà à e autônoma e o Estado, compondo o
à à à à à -àà à à à àecessária a
integrar a quele bloco (ESPANHA, 2007 e 2010). Na Itália, a situação seria a mesma: os estatutos não
seriam Constituições: DELLEDONE; MARTINICO, 2009.
3 São eles Comores, os Emirados Árabes Unidos, Nepal, Paquistão, a Índia, com exceção da Caxemira,
(Secs. 3, 168-212) e a Nigéria (ELAZAR, 1982, p. 9, 178).

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