As provas ilícitas no projeto do novo Código de Processo Civil: primeiras reflexões

AutorAndre Vasconcelos Roque
CargoAdvogado, consultor e professor de Direito Processual Civil no Rio de Janeiro. Mestre em Direito Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP) e da Association of the Bar of the City of New York.
Páginas5-31
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume VI. Periódico da Pós-
Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ. Patrono: José Carlos Barbosa
Moreira www.redp.com.br ISSN 1982-7636
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AS PROVAS ILÍCITAS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL BRASILEIRO: PRIMEIRAS REFLEXÕES
André Vasconcelos Roque
Advogado, consultor e professor de Direito
Processual Civil no Rio de Janeiro. Mestre em
Direito Processual pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (UERJ). Membro do Instituto
Brasileiro de Direito Processual (IBDP) e da
Association of the Bar of the City of New York.
Resumo: O presente artigo tem por objetivo discutir a constitucionalidade do art. 257,
parágrafo único do Projeto de Lei nº 166/2010. Propõe-se, ainda, uma interpretação, a
partir do instituto denominado neste estudo de ―estado de necessidade processual‖, que
permita, em casos excepcionais, a admissão de provas aparentemente ilícitas no
processo civil mediante uma ponderação de interesses baseada em critérios
minimamente lógicos e racionais, evitando a prática de abusos e o esvaziamento de
direitos fundamentais.
Abstract: This article aims to discuss the constitutionality of art. 257, single paragraph
of the Draft Law nº 166/2010. It is proposed also an interpretation, elaborated based on
the institute called in this study "estado de necessidade processual", that permits, in
exceptional cases, the admission of apparently illegally obtained evidence in civil
proceedings by a balancing of interests based on criteria minimally rational and logical,
avoiding the practice of abuse and the undermining of fundamental rights.
Palavras-chave: Provas ilícitas - Direitos fundamentais - Processo civil
Keywords: Illegally obtained evidence - Fundamental rights - civil procedure
Sumário: 1. Introdução 2. Uma questão terminológica preliminar: provas ilícitas e
provas ilegítimas 3. Respostas tradicionais para a questão das provas ilícitas; 3.1 A
divisão estanque entre o direito processual e material; 3.2 A inadmissibilidade das
provas ilícitas; 3.3 O princípio da proporcionalidade e as provas ilícitas 4. A
constitucionalidade do dispositivo em análise 5. Uma proposta de interpretação para
a norma em discussão 6. Considerações finais 7. Referências bibliográficas.
1. Introdução
Encontra-se em tramitação, no Senado Federal, o Projeto de Lei nº 166/2010,
que tem por finalidade instituir um novo Código de Processo Civil no Brasil. Resultante
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume VI. Periódico da Pós-
Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ. Patrono: José Carlos Barbosa
Moreira www.redp.com.br ISSN 1982-7636
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dos trabalhos realizados por eminente Comissão de Juristas presidida pelo Min. Luiz
Fux, o projeto foi elaborado com o declarado objetivo de: estabelecer verdadeira
sintonia fina do processo civil com a Constituição Federal, criar condições para o
julgamento de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa; simplificar
subsistemas do processo civil, como, por exemplo, o sistema recursal; otimizar o
rendimento de cada processo e, por fim, imprimir maior coesão e organicidade ao
sistema processual1.
Entre as diversas inovações apresentadas no Projeto de Lei nº 166/2010, cuja análise
extrapolaria os estreitos limites do presente estudo, destaca-se a previsão, em seu art.
257, parágrafo único, a respeito da inadmissibilidade das provas ilícitas no processo
civil, nos seguintes termos:
Art. 257 (...) Parágrafo único. A inadmissibilidade
das provas obtidas por meio ilícito será apreciada
pelo juiz à luz da ponderação dos princípios e dos
direitos fundamentais envolvidos.
Como se pode facilmente observar, o dispositivo acima destacado deixa entrever
a possibilidade excepcional de admissão das provas ilícitas no processo civil, desde que
tal solução seja recomendada pela ponderação dos princípios e dos direitos
fundamentais envolvidos no caso concreto. Esta possibilidade, entretanto, não se
encontra prevista no art. 5º, LVI da Constituição Federal, que dispõe, de forma
aparentemente peremptória, que são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por
meios ilícitos‖.
Por conta disso, já há quem sustente a possível inconstitucionalidade do art. 257,
parágrafo único do Projeto de Lei nº 166/2010 ou, pelo menos, o risco de que venham a
ocorrer abusos na aplicação da norma em análise, frustrando a proibição constitucional
contra a admissão das provas ilícitas2. Além disso, superada eventual incompatibilidade
da regra em discussão com a Carta Magna, há ainda autores sustentando a necessidade
1 Esses objetivos estão todos relacionados na expo sição de motivos apresentada pela Comissão de Juristas
ao Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney.
2 V. ALMEIDA, Gregório Assagra de; GOMES JR., Luiz Manoel. Um Novo Código de Processo Civil
para o Brasil. Rio de Janeiro: GZ, 2010, p . 174/175 (―Em termos de prova será adotada a regra de que a
inadmissibilidade da prova d everá ser analisada frente aos princípios e direitos fundamentais em
discussão, o qu e pode encontrar obstáculo na regra do art. 5º, inciso LVI, da CF/88 provas ilícitas. A
regra constitucional é peremptória e temos receio de que a opção pela análise caso a caso vá ampliar a
utilização de expedientes ilícitos na obtenção da prova.‖)

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