A atipicidade na prisão do depositário judicial infiel
Autor | Daniel Gustavo de Oliveira Colnago Rodrigues |
Cargo | Discente em Direito pela Faculdade de Direito da Associação Educacional Toledo – AET de Presidente Prudente, São Paulo |
Páginas | 135-140 |
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É de grande interesse da sociedade que aqueles causadores de dano a outrem sejam punidos. No caso de infidelidade do depositário a regra não é diferente, devendo este também, com algumas peculiaridades, reparar o dano. Neste sentido, salienta o professor Gelson Amaro de Souza1: “a partir do art. 159 do Código Civil, pode-se chegar a conclusão de que todo auxiliar de justiça que por culpa ou dolo der prejuízo a alguém deverá responder pelos danos causados, independentemente de haver o Código de Processo previsto ou não de forma expressa. Mesmo porque em matéria de responsabilidade civil prevalece o Código Civil”.
Porém, questão tormentosa na Moderna Processualística Civil envolve a punição dada ao depositário judicial infiel. Este auxiliar de justiça, diferentemente do contrato de depósito típico previsto nos artigos 627 e seguintes e 647 e seguintes, todos do Código Civil, possui relação administrativa, não se enquadrando, portanto, no artigo 5º, inciso LXVII da nossa Carta Magna.
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No dizer do ilustre Silvio Rodrigues2, depósito: “é o contrato pelo qual uma pessoa – depositário – recebe, para guardar, um objeto móvel alheio, com a obrigação de restituí-lo quando o depositante o reclamar. Aperfeiçoa-se pela entrega da coisa”.
No mesmo sentido, referindo-se ao instituto do depósito, pontifica Washington de Barros Monteiro3: “o contrato pelo qual uma das partes, recebendo de outra uma coisa móvel, se obriga a guardá-la, temporária e gratuitamente, para restituí-la na ocasião aprazada ou quando lhe for exigida”.
Importante destacar que para todos os doutrinadores há dois elementos essenciais para a caracterização do depósito: a guarda e a restituição do bem móvel. Isto significa que devem ser excluídos da situação de depósito aqueles casos em que devedor se recusa a entregar bens dados em garantia de dívida4. Assim, Pontes de Miranda5 expõe brilhantemente: “Se os bens penhorados, seqüestrados ou arrestados ficaram com o titular dos direitos sobre eles, e tal titular tem a posse imediata, a eficácia da penhora, do seqüestro ou do arresto não precisa de depósito”.
O depósito, segundo a classificação da doutrina majoritária, pode ser: a) contratual ou voluntário, que, disciplinado pelos artigos 627 e seguintes do Código Civil, nasce da convenção das partes; b) legal ou necessário, previsto nos artigos 647 e seguintes do mesmo Código e que é feito em desempenho de uma obrigação legal ou por situação excepcional; c) judicial, o qual não nasce de uma relação contratual, mas sim de uma necessidade para melhor andamento do processo.
A função do depositário judicial vem bem descrita no art. 148 do Código de Processo Civil: “A guarda e conservação de bens penhorados, arrestados, seqüestrados ou arrecadados serão confiadas a depositário ou a administrador, não dispondo a lei de outro modo”.
O artigo 5º, inciso LXVII da CF/88 diz taxativamente: “Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”. Cabe-nos, neste trabalho, analisar a segunda exceção. Neste sentido, Humberto Theodoro Junior, citando José Frederico Marques, preleciona6: “O ato executivo do depósito não se confunde como depósitoPage 137 convencional regulado no direito privado. O depósito de bem penhorado é de direito processual”. Ainda, “[...] Ele é o longa manus do juízo da execução, seu auxiliar e órgão do processo executivo, com poderes e deveres próprios no exercício de suas atribuições”.
A problemática envolve a distinção entre depositário genuíno ou clássico e depositário judicial. Por se tratar de um auxiliar da justiça, esta última espécie de depositário não pode ser considerada contratual, uma vez que o depositário judicial possui uma relação administrativa com o órgão jurisdicional, posicionando-se em uma relação hierárquica com o juiz, de modo que, conseqüentemente, se trataria de prisão administrativa, que é aquela que não tem caráter penal, servindo...
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