O estado brasileiro pode ser proprietário e gestor do sistema financeiro?

AutorDavi Augusto Santana de Lelis - Giovani Clark
Páginas330-352
Disponível em: www.univali.br/periodicos
Doi: 10.14210/nej.v26n1.p330-352
330
Licença CC BY:
Artigo distribuído sob
os termos Creative
Commons, permite
uso e distribuição
irrestrita em qualquer
meio desde que o
autor credite a fonte
original.
Resumo: A crise nanceira de 2008 possibilitou a elaboração de novas
propostas, em todo o mundo, sobre o sistema nanceiro. Nesse sentido, o
presente texto examina se, no Brasil, pode-se aplicar a proposta teórica do
jurista português Avelãs Nunes, com vistas a controlar as crises nanceiras, de
tornar o Estado único proprietário e gestor do sistema nanceiro. Para vericar a
viabilidade da proposta no estado brasileiro investiga-se se há, na Constituição
de 1988, apenas uma ideologia determinante da racionalização normativa ou
se há, no texto constitucional, múltiplas ideologias nacionalizantes de modo
a ser possível acomodar a possibilidade de propriedade e gestão do sistema
nanceiro por parte do Estado brasileiro. Constatando a possibilidade jurídica,
o ordenamento jurídico brasileiro é estudado com o intuito de se apontar o
instituto jurídico capaz de instrumentalizar a tomada de propriedade do sistema
nanceiro pelo Estado brasileiro. Conclui-se que de acordo com a ideologia
constitucionalmente adota (pluralismo ideológico) é possível a propriedade e
gestão do sistema nanceiro por via da encampação.
O ESTADO BRASILEIRO PODE SER
PROPRIETÁRIO E GESTOR DO SISTEMA
FINANCEIRO?
COULD THE STATE BE BOTH OWNER AND MANAGER OF THE FINANCIAL SYSTEM?
¿EL ESTADO BRASILEÑO PUEDE SER PROPIETARIO Y GESTOR DEL
SISTEMA FINANCERO?
Davi Augusto Santana de Lelis1
Giovani Clark2
Palavras-chave: Sistema Financeiro; Constituição Econômica; Estatização; Encampação;
Atividade Econômica.
Abstract: The 2008 nancial crisis enabled new proposals to be drafted worldwide in relation to
the nancial system. This text examines whether the theoretical proposal of the Portuguese jurist
Avelãs Nunes can be applied in Brazil to control nancial crises, making the State the sole owner
and manager of the nancial system. To verify the feasibility of this proposal in the Brazilian state, it
investigates whether, in the 1988 Constitution, there is only a determining ideology of the normative
rationalization, or if the constitutional text contains multiple nationalizing ideologies that would allow
for the possibility of ownership and management of the nancial system by the Brazilian State.
Having noted the legal possibility, the Brazilian legal system is studied, in order to point out the legal
institute capable of instrumentalizing the ownership of the nancial system by the Brazilian State. We
conclude that according to the constitutionally adopted ideology (ideological pluralism), it is possible
for the state to own and manage the nancial system through expropriation.
Doi: 10.14210/nej.v26n1.p330-352
Revista Novos estuDos JuRíDicos - eletRôNica, vol. 26- N. 1 - JaN-aBR 2021 331
Keywords: Financial System; Economic Constitution; Neoliberalism; Expropriation; Economic
activity.
Resumen: La crisis nanciera de 2008 posibilitó la elaboración de nuevas propuestas, en todo
el mundo, sobre el sistema nanciero. En este sentido, el presente texto examina si, en Brasil, se
puede aplicar la propuesta teórica del jurista portugués Avelãs Nunes, con vistas a controlar las
crisis nancieras, de convertir al Estado en el único propietario y gestor del sistema nanciero. Para
examinar la viabilidad de la propuesta en el estado brasileño se investiga si hay, en la Constitución
de 1988, apenas una ideología determinante de la racionalización normativa o si hay, en el texto
constitucional, múltiples ideologías nacionalizantes de modo a ser posible acomodar la posibilidad de
propiedad y gestión del sistema nanciero por parte del Estado brasileño. Constatando la posibilidad
jurídica, el ordenamiento jurídico brasileño es estudiado con el intuito de apuntar el instituto jurídico
capaz de instrumentalizar la toma de propiedad del sistema nanciero por el Estado brasileño. Se
concluye que de acuerdo con la ideología constitucionalmente adoptada (pluralismo ideológico) es
posible la propiedad y gestión del sistema nanciero por via de encampación.
Palabras clave: Sistema Financiero; Constitución Económica; Estatización; Encampación;
Actividad Económica.
INTRODUÇÃO
Ao se pensar uma teoria do Estado, o arranjo institucional atual compreende a atuação estatal
entre dois polos: o de concretização de direitos e o de atender às demandas do setor nanceiro,
conforme os ditames constitucionais. O equilíbrio entre os polos, desde a década de 1970, se
“mantinha”, em escala global, até a crise de 2008. Sobre essa crise, dentre os diversos diagnósticos,
prevalece o que atribuiu o desencadeamento dos eventos à liberdade concedida ao setor nanceiro
privado. A referida liberdade só foi possível pela transformação do Estado de bem-estar social em
um Estado Regulador e depois em Estado Garantidor e que adotam, simplicadamente, a seguinte
cartilha: na teoria o Estado, em suas políticas econômicas, deve ser regulador e/ou garantidor do
setor privado. Na prática há inversão da fórmula e se adota a liberdade de mercado como princípio
organizador e regulador do Estado3. Entretanto, tais ideários, não afastam os riscos de ocorrência de
novas crises nanceiras.
Avelãs Nunes, jurista português, no artigo As duas últimas máscaras do Estado capitalista4
constrói uma crítica aos modelos reguladores e garantidores, apontando seus efeitos negativos na
Europa. No mesmo texto, o autor lusitano propõe uma solução alternativa para as recorrentes crises
nanceiras visando solucionar o problema do controle do sistema nanceiro sobre o aparelho do
Estado. Para Avelãs Nunes, a propriedade integral e a gestão do sistema nanceiro deveriam ser
atribuições exclusivas do Estado.
3 FOUCAULT, Michael. Nascimento da Biopolítica. Martins Fontes: São Paulo, 2008, p. 158-159.
4 AVELÃS NUNES, António José. As duas últimas máscaras do Estado capitalista. Pensar. Fortaleza. v. 16, n. 2,
p.409-476, jul/dez. 2011.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT