Capítulo V - Audiência

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Manoel Antonio Teixeira Filho
Capítulo V — Audiência
1. Etimologia
O substantivo audiência é proveniente do latim audientia, ae (silêncio dos ouvintes,
atenção), de audiens, entis, particípio presente de audire, signicando, de modo geral, o ato
pelo qual se ouve alguém ou alguma coisa. Sob esse aspecto, o vocábulo tanto pode expressar
o ato pelo qual uma pessoa está ouvindo um programa de rádio, um discurso, uma palestra,
etc., como aquele em que é recebida por outra pessoa, a m de entrevistar-se com esta.
Encontram-se dicionarizados os substantivos audibilidade (qualidade do que é audível),
audição (ato de ouvir), audito (ação de ouvir), auditor (pessoa dotada de conhecimento
suciente para emitir opinião acerca de assunto de sua especialidade), auditoria (função
do auditor), auditório (recinto destinado à realização de conferências, palestras, cursos,
espetáculos, etc.), e os adjetivos audiente (que ouve, ouvinte), auditor (o que ouve, ouvinte),
auditivo (relativo à audição ou ao ouvido), audível (que se pode ouvir, perceptível aos ouvidos),
dentre outros.
A expressão latina audi nos, por outro lado, signica ouvi-nos, embora, na linguagem
popular, tenha passado a corresponder às súplicas constantes, aos pedidos insistentes que
alguém faz a outrem.
A propósito, em certa ocasião pudemos ouvir, de alguém que é dado ao gosto pelos
neologismos (ou melhor: pelas deturpações vocabulares), a palavra “escutação, como sinô-
nimo de audiência. Ora, como se não bastasse tal afronta ao léxico, essa forma pernóstica
também não resiste a uma investida lógica (e semântica), pois escutar não é o mesmo que
ouvir. Escutar signica prestar atenção a; ouvir quer dizer perceber, captar determinado som
pelo sentido da audição. Assim, nem sempre quem está escutando está ouvindo: escuto o
rádio, mas nada ouço, em virtude das interferências eletromagnéticas ou da vozearia que há
ao meu redor. O mesmo se diga em relação a olhar e ver: posso estar olhando para algum
lugar, mas não estar vendo o que nele se encontra.
2. Conceito
Segundo Cândido Rangel Dinamarco (“Instituições de Direito Processual Civil”, São
Paulo: Malheiros Editores, vol. III, 4.ª ed., 2004, p. 635), “Audiência de instrução e julgamento
é a sessão pública dos juízos de primeiro grau de jurisdição, da qual participam o juiz, au-
xiliares da Justiça, testemunhas, advogados e partes, com o objetivo de obter a conciliação
destas, realizar a prova oral, debater a causa e proferir sentença”.
Do ponto de vista estritamente legal, a esse conceito muito se aproxima do que é próprio
da audiência trabalhista. Assim dizemos, porque sob o rigor da expressão literal dos arts. 843,
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845 e 849, da CLT, a audiência, no processo do trabalho, é una e contínua, motivo por que,
nela, devem ser praticados todos os atos integrantes do procedimento, quais sejam: formu-
lação da primeira proposta conciliatória; recepção da resposta do réu (exceção, contestação,
reconvenção, reconhecimento do direito alegado pelo autor); interrogatório dos litigantes;
inquirição das testemunhas; esclarecimentos do perito ou de terceiros; razões nais; segunda
proposta de conciliação e, por m, o julgamento.
Todavia, se levarmos em conta o processo da praxe — que se caracteriza, dentre outros
traços, pelo fracionamento da audiência em: a) inicial; b) de instrução; e c) de julgamento —
veremos que o conceito formulado por Dinamarco está mais próximo destas duas últimas.
Em termos gerais, podemos enunciar o seguinte conceito de audiência trabalhista: é o
ato público, em princípio indispensável, no qual o réu pode apresentar a sua resposta à petição
inicial, e o juiz procede à instrução, formula propostas destinadas à solução consensual do
litígio, concede prazo para razões nais e profere sentença.
Decompondo os elementos integrantes do conceito que formulamos, temos:
a) ato público, não apenas porque assim determina o art. 813, caput, da CLT, mas porque,
sendo a sentença um ato processual, está rigidamente submetido ao requisito constitu-
cional da publicidade (CF, art. 92, inciso IX). Em situações extraordinárias, previstas
em lei, a audiência poderá realizar-se em segredo de justiça (CPC, art. 189), caso em
que a publicidade será restrita, uma vez que desse ato processual participarão, somente,
o magistrado, o serventuário (escrevente ou digitador), as partes, seus advogados,
testemunhas e o perito. Importa dizer: o público não terá acesso à sala de audiência;
b) em princípio indispensável, porque será nela em que o réu apresentará a sua resposta
à petição inicial, sob a forma de exceção, de contestação, de reconvenção ou de reco-
nhecimetnodo do direito alegado pelo autor. Fizemos a ressalva de que, em princípio,
a audiência é indispensável, porque haverá uns poucos casos em que, ao contrário,
ela poderá ser dispensada, como quando o juiz entender que a resposta do réu pode
ser oferecida no serviço de protocolo e não houver necessidade de instrução oral. A
esta situação se ajustam, por exemplo, algumas ações cautelares e a ação civil pública,
em que pese ao fato de, quanto a esta última, alguns juízes entenderem que também a
resposta deva ser apresentada em audiência;
c) no qual o réu pode apresentar a sua resposta à petição inicial, porquanto, conforme
armamos na letra anterior, é na audiência, em princípio, que o réu poderá manifes-
tar — oralmente ou por escrito — a resposta processual que pretender. A ordem da
formulação das respostas é esta: 1) exceção (de suspeição, de impedimento ou de in-
competência relativa); 2) reconhecimento do direito em que se fundam os pedidos do
autor; 3) contestação; 4) reconvenção. Devemos observar, no entanto, que a presença
do réu à audiência não é obrigatória. Para efeito de regularidade no estabelecimento da
relação jurídica processual o importante é que ele tenha sido citado para comparecer à
audiência. Ausente o réu — e, também, a sua resposta aos termos da inicial —, ele será
revel e o processo prosseguirá, seja para a produção de provas (quando não ocorrer o
efeito da revelia), seja para o proferimento da sentença (quando aquele efeito ocorrer).
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No sistema do CPC de 2015, as respostas do réu caram reduzidas à contestação (art. 335)
e à reconvenção (art. 343);
d) o juiz procede à instrução, designadamente, a oral (interrogatório dos litigantes,
inquirição das testemunhas e do perito). Poder-se-ia entender injusticável o fato de
havermos, aqui, restringido a instrução à oral. Ocorre que, tanto na teoria quanto na
prática, sempre entendemos que os momentos de produção da prova documental são
os da petição inicial e da resposta do réu. Vale dizer, a inicial já deve vir acompanhada
dos documentos em que se funda (CLT, art. 787), o mesmo se dizendo em relação à
resposta do réu (CPC, art. 434). Somente em situações excepcionais será admissível
a juntada de outros documentos fora desses momentos especícos, previstos em lei
e) formula propostas destinadas à solução consensual do litígio, uma vez que a nalidade
essencial da Justiça do Trabalho reside na solução negociada da causa (CLT, art. 764).
Com vistas a isso, o sistema legal impõe ao juiz formular aos litigantes por, quando
menos, duas vezes propostas destinadas a este m. A primeira ocorrerá logo no iníco
da audiência, antes da resposta do réu (CLT, art. 846, caput); a segunda, após as razões
nais (CLT, art. 850, caput);
f) concede prazo para razões nais, porque, após o encerramento da instrução, o juiz
deverá abrir o prazo de dez minutos, a cada parte, para a apresentação de razões nais.
Note-se que o efetivo oferecimento dessas razões não é obrigatório; o que a lei exige é
que o juiz conceda oportunidade para que os litigantes as formulem, se assim deseja-
rem. Na prática, as razões nais têm sido remissivas, vale dizer, as partes se limitam se
reportar-se ao que foi alegado e provado nos autos. Especialmente no caso de audiência
una e contínua, entretanto, as razões nais constituem o momento oportuno para serem
arguidas nulidades processuais, sob pena de preclusão;
g) e profere sentença. A sentença é o mais importante dos diversos atos integrantes do
universo processual. Nenhum outro ato se pratica no processo que não vise a preparar,
direta ou indiretamente, a emissão da sentença. Ela materializa a entrega da prestação
jurisdicional buscada pelas partes. É por meio da sentença que o juiz acolhe ou rejeita
os pedidos formulados pelo autor e pelo réu (CPC, art. 490, caput). Há casos em que a
sentença põe m ao processo sem resolução do mérito; as situações em que isso pode
ocorrer estão previstas, basicamente, nos incisos I a X, do art. 485, do CPC.
No processo do trabalho, raramente a sentença é emitida na mesma audiência em que
se realizou a instrução. Os juízes costumam designar audiência especíca para o julgamento.
Essa atitude, embora implique alargamento do tempo de duração do processo, é justicá-
vel, pois o juiz, muitas vezes, necessita examinar, detalhadamente, as alegações do autor e
as do réu, os documentos por eles juntados, os depoimentos de ambos e das testemunhas,
etc., providências que ele dicilmente poderia adotar na própria audiência em que ocorreu
a instrução oral do processo. No processo de conhecimento, não raro, é preferível que o
magistrado emita uma boa sentença, ainda que tardiamente, a uma sentença emitida desde
logo, mas de má qualidade jurídica.
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