A cláusula geral da função social dos contratos no STJ no contrato de seguro a partir do caso paradigma da "demanda direta"

AutorGerson Luiz Carlos Branco e Marina Fink e Kelvin Maggi
Páginas87-106
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5.
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DOS CO NT RA TO S N O S TJ NO CO NT RA TO DE
SE GU RO A PA RT IR DO CA SO PA RA DI GM A
DA DE MA ND A D IR ET A
Gerson Luiz Carlos Branco
Marina Fink e Kelvin Maggi
INTRODUÇÃO
O
propósito deste artigo é analisar os contornos jurisprudenciais da função
social dos contratos, a partir da compreensão da cláusula geral do art.421 do
Código Civil pelo principal Tribunal responsável pela aplicação da Lei Civil no
âmbito do contrato de seguro.
A metodologia adotada foi mapear as principais decisões proferidas pelo
Superior Tribunal de Justiça que, de alguma maneira, aplicaram a cláusula geral da
função social dos contratos, seja para confirmar diretrizes já aplicadas pelos Tribunais
Estaduais, seja para alterá-las. No conjunto de decisões, não foram considerados
os julgados que mencionavam o tema, mas que a solução do recurso tenha sido
meramente processual, exceto se isso estivesse conectado diretamente com a apli-
cação do tema. Do mesmo modo, a pesquisa realizada debruçou-se sobre as deci-
sões colegiadas, tendo deixado de analisar as decisões monocráticas, dado o caráter
predominantemente processual das mesmas.
A análise das decisões identificou quatro grandes temas em torno dos quais
o Superior Tribunal de Justiça enfrentou o tema da função social dos contratos, quais
sejam, o problema da eficácia do contrato de seguro perante terceiros ou eficácia
externa do contrato, o limite funcional do direito de resolver o contrato de seguro,1
1 STJ, Recurso Especial n. 877.965/SP, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 22 nov.
2011, DJe 01 fev. 2012.
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como fundamento para renovação obrigatória2 e também para estender determi-
nados efeitos de contratos de seguro já extintos.3
A análise de todas essas dimensões extrapolaria os limites objetivos deste
artigo, razão pela qual a análise da matéria será centrada a partir das decisões que
trataram sobre problema da eficácia do contrato de seguro perante terceiros ou efi-
cácia externa do contrato, que no caso é conhecido como “ação direta” ou “demanda
direta” promovida pela vítima de um dano contra a seguradora, nos contratos de
seguro de responsabilidade civil.
A pesquisa realizada está situada no contexto da compreensão sobre os limi-
tes dogmáticos das cláusulas gerais na produção de efeitos sobre os contratos legal-
mente típicos, como é o contrato de seguro, com o objetivo de contribuir para a
formação de modelos dogmáticos que permitam uma melhor compreensão sobre
o funcionamento do sistema de Direito Privado, baseado em uma técnica legisla-
tiva que adotou as cláusulas gerais como pontos de mobilidade.
O Código Civil brasileiro está em vigor há mais de 17 anos, porém ainda há
incertezas sobre a extensão da eficácia de cláusulas gerais, especialmente do recém-
-reformado art. 421 do Código Civil,4 ainda que se possa identificar um conjunto
de decisões que começam a conformar o seu significado.
Apesar de a redação do art. 421 ter sido alterada pela Lei da Liberdade Eco-
nômica, a alteração não teve o condão de alterar o seu conteúdo, pois a interpreta-
ção jurisprudencial nunca levou em consideração a expressão “em razão” suprimida
pelo novo texto legal.5 Ainda sob este aspecto, deve-se lembrar que apesar de todo o
2 STJ, Recurso Especial n. 1.818.495/SP, julgado em 08 out. 2019, DJe 11 out. 2019; AgInt. no Recurso
Especial n. 1.834.839/SP, julgado em 25 nov. 2019, DJe 29 nov. 2019; AgInt. no Agravo em Recurso
Especial n. 1.132.794/SP, julgado em 12 mar. 2019, DJe 20 mar. 2019; e AgInt. no Recurso Especial n.
1.763.223/SP, julgado em 26 mar. 2019, DJe 11 abr. 2019; AgRg. nos EDcl. no Agravo de Instrumento
n. 1.400.796/RS, julgado em 16 ago. 2012, DJe 21 ago. 2012; AgRg. no Recurso Especial n. 1.230.665/
SP, julgado em 05 mar. 2013, DJe 03 abr. 2013; AgRg. no Recurso Especial n. 1.444.292/SP, julgado em
05ª go. 2014, DJe 04 set. 2014; AgRg. nos EDcl. no Recurso Especial n. 1.320.969/SP, julgado em 20 set.
2012, DJe 08 out. 2012.
3 STJ, Recurso Especial n. 1.818.495/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em
08 out. 2019, DJe 11 out. 2019. Recurso Especial n. 1.525.109/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, julgado em 04 out. 2016, DJe 18 out. 2016.
4 Art.421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. Parágrafo único.
Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade
da revisão contratual.” Observe-se, entretanto, que a totalidade das decisões foi proferida com base na
redação anterior do dispositivo: “Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites
da função social do contrato”.
5 A propósito, manifestam-se no mesmo sentido TEPEDINO, Gustavo e CAVALCANTI, Lais. “Notas
sobre as alterações promovidas pela Lei n. 13.874/2019 nos Artigos 50, 113 e 421 do Código Civil.
In: SALOMÃO, Luis Felipe; CUEVA, Ricardo Vilas Bôas; FRAZÃO, Ana (Coord.). Lei de Liberdade
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