Cláusulas restritivas de propriedade

AutorWendel de Brito Lemos Teixeira
Ocupação do AutorMestre em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia
Páginas7-94
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Capítulo 2
CLÁUSULAS RESTRITIVAS
DE PROPRIEDADE
Dentre essas disposições contratuais importantes, há as se-
guintes cláusulas restritivas de propriedade:
a) inalienabilidade;
b) incomunicabilidade;
c) impenhorabilidade.
São chamadas de cláusulas restritivas de propriedade porque
impõem limitações à propriedade dos bens deixados pelo testador
ou doados pelo doador ou negociados em contratos onerosos.
Para muitos, as cláusulas restritivas de inalienabilidade, inco-
municabilidade e impenhorabilidade cabem apenas em caso de do-
ação ou testamento, segundo a interpretação literal dos arts. 1.848 e
1.911 do Código Civil.5
5 Art.1.848. Salvo se houver justa causa, declarada no testamento, não pode
o testador estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade, e de
incomunicabilidade, sobre os bens da legítima. § 1o Não é permitido ao
testador estabelecer a conversão dos bens da legítima em outros de espécie
diversa. §2o Mediante autorização judicial e havendo justa causa, podem ser
alienados os bens gravados, convertendo-se o produto em outros bens, que
ficarão sub-rogados nos ônus dos primeiros.
Art.1.911. A cláusula de inalienabilidade, imposta aos bens por ato de li-
beralidade, implica impenhorabilidade e incomunicabilidade. Parágrafo
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CLÁUSULAS DE INALIENABILIDADE, INCOMUNICABILIDADE E IMPENHORABILIDADE
As cláusulas restritivas têm a função primordial de limitar a
propriedade, por exemplo, ao impedir que o beneficiário de imóvel
público com cláusula de inalienabilidade o aliene, ao impedir a co-
municação de um imóvel deixado pela mãe ao seu filho com a cônju-
ge deste, ao impor a impenhorabilidade de uma fazenda pertencente
aos pais de um jovem etc.
Também têm as cláusulas restritivas, na maioria das vezes, a
função de proteger os próprios beneficiários. Frequentemente a in-
tenção é proteger o patrimônio de atos dos próprios beneficiários,
como o faz o pai que insere no testamento cláusula de inalienabilida-
de de imóvel para impedir que o filho o venda na primeira oportu-
nidade ou o município que doa um imóvel público mediante alguns
encargos e veda que o beneficiário aliene tal bem.
Apesar de doutrinadores do escol de José Ulpiano Pinto de
Souza entenderem aplicável a cláusula restritiva de propriedade em
contratos onerosos6, no Brasil era praticamente pacífico na doutrina
e na jurisprudência que apenas se poderia incluir cláusulas restriti-
vas de propriedade em testamentos e doações:
“CIVIL. CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE. ALIE-
NAÇÃO. NULIDADE. NÃO TEM VALOR JURÍDICO
A COMPRA E VENDA DE COISA GRAVADA COM
A CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE”. (STJ, REsp
11.678/SP, Rel. Ministro Cláudio Santos, 3ª Turma, julga-
do em 13/03/1995, DJ 03/04/1995, p.8127)7
único. No caso de desapropriação de bens clausulados, ou de sua alienação,
por conveniência econômica do donatário ou do herdeiro, mediante autori-
zação judicial, o produto da venda converter-se-á em out ros bens, sobre os
quais incidirão as restrições apostas aos primeiros.
6 SOUZA, José Ulpiano Pinto de. Das clausulas restrictivas da propriedade,
cit., p.14.
7 Ainda hoje há decisões nesse sentido: “TJMG. APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ALIENAÇÃO DE
AÇÕES. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO
REJEITADA. NULIDADE PROCESSUAL POR AUSÊNCIA DE
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CLÁUSULAS RESTRITIVAS DE PROPRIEDADE
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O Professor Álvaro Villaça Azevedo, no entanto, em histórico
estudo, passou a defender o cabimento da convenção de inalienabili-
dade em contratos onerosos, pois não havia proibição na lei. “Dessa
forma, não sendo ilícito o negócio oneroso, uma sua cláusula poderá
conter um pacto de inalienação, que lhe virá adjecto... só não poden-
do ofender a lei, os bons costumes e a ordem pública”.8
O próprio direito romano utilizava as cláusulas restritivas de
propriedade tanto em contratos onerosos quanto em gratuitos.9
Edson Fachin também passou a defender tal posicionamento:
“[...] pode ser legítima a cláusula imposta em contratos
onerosos, seguindo doutrina estabelecida no direito roma-
no, vislumbrando a possibilidade de inserção da cláusula
INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E CERCEAMENTO DE
DEFESA EM RAZÃO DA NEGATIVA DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS
ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. PREAMBULARES REFUTADAS.
CLÁUSULA DE INALIENABILIDADE DAS AÇÕES. CONTRATO
ONEROSO. IMPOSSIBILIDADE. SIMULAÇÃO NÃO DEMONSTRADA.
HIPÓTESES DE CARACTERIZAÇÃO DE INVALIDADE DO NEGÓCIO
JURÍDICO NÃO VERIFICADAS. SENTENÇA MANTIDA. As questões
suscitadas na apelação combatem a sentença, inexistindo motivos para
não se conhecer do recurso. Preliminar rejeitada. Não há necessidade de
intervenção do Ministério Público nas questões eminentemente de direi-
to privado, não havendo nulidade a ser declarada. Deve ser descartado o
alegado cerceio de defesa em razão da não expedição de ofícios às insti-
tuições financeiras por se tratar de prova inútil, já que os autos possuem
elementos suficientes para a solução da controvérsia. A cláusula de ina-
lienabilidade não se aplica a contratos onerosos por se constituir em ato
de mera liberalidade incompatível com o caráter da cessão de direitos e
obrigações envolvendo transferência de ações” (TJMG, Apelação Cível
n. 1.0459.08.030800-8/001, Rel. Des. Moacyr Lobato, 9ª Câmara Cível,
DJ22/03/2016).
8 AZEVEDO, Álvaro Villaça. Cláusula de inalienabilidade. In:Enciclopédia
Saraiva do direito. v. XV. p.48.
9 SOUZA, José Ulpiano Pinto de. Das clausulas restrictivas da propriedade,
cit., p.39.
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