Da Impossibilidade da Relativização da Coisa Julgada Frente à Prova Técnica que se Torna Possível: Uma Análise da Mudança de Paradigma do STJ

AutorRafael José Nadim de Lazari
CargoAdvogado. Mestre em Direito (Centro Universitário Eurípedes de Marília/SP - UNIVEM)
Páginas78-81

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1. Linhas prolegominais

Este autor já escreveu, outrora, sobre a relativização da coisa julgada, injusta e inconstitucional, e, após explanar sobre os variados posicionamentos acerca do instituto, quais sejam, aquele que o veda incondicionadamente1, o que o autoriza irrestritamente2, o que entende pela factualidade de descons-trução da res judicata inconstitucional, apenas3, e o que acena pela possibilidade de ampliação das hipóteses de ação rescisória4, posicionou-se conforme o entendimento que veda, absolutamente, sua flexibilização5.

Neste diapasão, poderia o presente estudo configurar mero adendo ao mencionado artigo (vide nota explicativa n° 5), mas optou-se por uma análise isolada, na forma de percepção de caso, pelos motivos que ao longo do trabalho se exporão.

Sem mais delongas, o Superior Tribunal de Justiça, assumindo posicionamento diametralmente oposto ao que tinha, optou por vedar a "relativização" nos casos em que a prova técnica somente se tornou possível após a coisa julgada já estar consolidada.

Foi correto? Ou materializou-se equívoco? É o que se discutirá nos próximos tópicos do trabalho.

2. Sobre a guinada do posicionamento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça

Até o julgado em evidência, originário deste estudo de caso, o Tribunal da Cidadania tinha o seguinte entendimen-to-padrão acerca da "relativização" para os casos de requerimento com base em prova técnica inovadora (mais especificamente, no caso concreto, para as hipóteses de exame de DNA):

"Direito processual civil. Recurso especial. Ação de investigação de paternidade com pedido de alimentos. Coisa julgada. Inépcia da inicial. Ausência de mandato e inexistência de atos. Cerceamento de defesa. Litigância de má-fé. Inversão do ónus da prova e julgamento contra a prova dos autos. Negativa de prestação jurisdicional. Multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC.

- A propositura de nova ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos, não viola a coisa julgada se, por ocasião do ajuizamento da primeira investigatória - cujo pedido foi julgado improcedente por insuficiência de provas -, o exame pelo método DNA não era disponível tampouco havia notoriedade a seu respeito.

-A não exclusão expressa da paternidade do investigado na primitiva ação investigatória, ante a precariedade da prova e a in-

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suficiência de indícios para a caracterização tanto da paternidade como da sua negativa, além da indisponibilidade, à época, de exame pericial com índices de probabilidade altamente confiáveis, impõem a viabilidade de nova incursão das partes perante o Poder Judiciário para que seja tangível efetivamente o acesso à Justiça. (...)

(REsp 826.698/MS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 06/05/2008, DJe 23/05/2008)."

Clarividente, pois, que frente à discussão de prevalência entre os valores constitucionais de justiça e segurança jurídica, prevalecia o primeiro, em razão da suposta insuficiência técnica que se fazia presente antes do advento do exame de DNA, o qual veio conferir altíssima probabilidade - quase em nível de certeza - de atestação ou negação de paternidade. Sendo assim, uma decisão passada em julgado, que houvesse sido proferida anteriormente ao aludido exame, poderia, com seu advento, ser desconstituída, mesmo após esvair-se o prazo bienal para propositura do instituto rescisório do art. 485 do CPC.

Com efeito, este autor já havia defendido, seguindo os passos de José Carlos Barbosa Moreira6, que a hipótese não deveria ser de "relativização" nem de ampliação das hipóteses autorizadoras de ação rescisória, mas de alteração na contagem do prazo para propositura deste instituto último, que passaria a correr da data da obtenção do laudo científico de paternidade. Em outras palavras, a alteração deveria dar-se na forma de contagem do art. 495, e não no art. 485 do CPC. Parecia uma solução honrosa, que manteria possível a justiça de uma decisão (apesar de não ser essa a finalidade precípua da segurança jurídica), mas não a deixaria, atemporalmente, à mercê de procedimento rescisório autônomo impugnativo.

Mas o STJ foi além, o que explica a não inclusão do entendimento que neste estudo de caso se explana, no trabalho anteriormente escrito.

Baseando-se numa casuística em que se objetivava rever a res judi cata trinta anos após sua consolidação (é o julgado que está em comentário), o

Tribunal da Cidadania acenou pela prevalência da segurança jurídica, em detrimento da justiça, adotando tal entendimento como paradigma. Desde então, esta tem sido a pauta de suas decisões, conforme se pode observar:

"Agravo regimental. Recurso especial. Processo civil e direito de família. Investigação de paternidade. Improcedência de demanda anterior. Coisa julgada. Superveniência de novos meios de prova. Irrelevância. Prevalência da segurança jurídica. Recurso desprovido.

(...)

  1. A Segunda Seção deste Tribunal Superior consagrou o entendimento de que deve ser preservada a coisa julgada nas hipóteses de ajuizamento de nova ação de investigação de paternidade, ainda que se postule pela utilização de meios mais modernos de prova, como o exame de DNA, haja vista a preponderância, nesses casos, da segurança jurídica.

    (...)

    (Desembargador convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 24/08/2010, DJe 01/09/2010) (grifei).

    Processual civil. Investigação de paternidade. Coisa julgada. Precedente da Segunda Seção.

    I - Já decidiu a Segunda Seção desta Corte que, visando à segurança jurídica, deve ser preservada a coisa julgada nas hipóteses de ajuizamento de nova ação reclamando a utilização de meios modernos de prova (DNA) para apuração da paternidade (REsp 706.987/SP).

    (...)

    (AgRg no REsp 895.545/MG, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 18/05/2010, DJe 07/06/2010) (grifei).

    Agravo regimental no recurso especial. Ação de investigação de...

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