Comparações constitucionais: convergência, resistência, engajamento

AutorVicki C. Jackson
CargoHarvard Law School
Páginas12-36
12
COMPARAÇÕES CONSTITUCIONAIS:
CONVERGÊNCIA, RESISTÊNCIA, ENGAJAMENTO1
Vicki C. Jackson2
Referências em Roper v. Simmons3 ao direito estrangeiro e internacional -
como fontes relevantes, mas não vinculantes4 - são, em aspectos importantes,
um retorno aos métodos tradicionais de análise, que remontam às primeiras
discussões da Corte sobre a Oitava Emenda. Em 1879, a Corte rejeitou um
recurso interposto contra sentença de morte por fuzilamento no território de
Utah em parte porque haveria “regras correspondentes [que] prevalecem em
outros países” que apoiavam a prática5. Em muitos casos, posteriormente, o
1 Artigo traduzido, com aprovação da autora, por Matheus de Souza Depieri e Pedro
Gonet Branco. O texto original foi publicado na Harvard Law Review, Vol. 119, No. 1
(Nov., 2005), pp. 109-128.
2 Professora de Direito na Harvard Law School. Agradeço a Alex Aleinikoff, Sue Blo-
ch, Sarah Cleveland, David Fontana, Neal Katyal, Marty Lederman, Dan Meltzer, Car-
rie Menkel-Meadow, John Mikhail, Judith Resnik, Mark Spindelman, Dan Tarullo, Bob
Taylor, Mark Tushnet, Carlos Vázquez, Pete Wales e meus colegas do Workshop de verão
da Georgetown Law.
3 125 S. Ct. 1183 (2005).
4 Embora existam muitas formas de direito internacional, esse artigo considerará o uso
de fontes do direito internacional apenas como autoridade comparativa não vinculante
(como o direito estrangeiro), como ocorrido em Roper – Cf. Karen Knop, Here and The-
re: International Law in Domestic Courts, 32 N.Y.U. J. INT’L L. & POL. 501, 525 (2000)
(enxergando “o direito internacional por meio das lentes do direito comparado”) – e não
se abordará questões como quando o direito internacional é obrigatório ou quando seu
efeito o é. O termo “direito transnacional” refere-se tanto ao direito estrangeiro quanto
ao internacional.
5 Wilkerson v. Utah, 99 U.S. 130, 134 (1879). Pelo menos uma decisão anterior referiu-se
à lei estrangeira para decidir se uma lei estadual impôs uma “punição” em violação ao Arti-
go I, Seção 10, proibição de leis ex post facto ou bills of attainder. Veja Cummings v. Missouri,
71 U.S. (4 Wall.) 277, 318, 320-21 (1867) (considerando o código francês contemporâneo e
a lei inglesa mais antiga). As reivindicações de violação à Oitava Emenda levantadas antes
de Wilkerson foram negadas porque a Oitava Emenda não era na época, nem por muitos
anos depois, entendida como aplicável aos estados. Cf., por exemplo, Pervear v. Massa-
chusetts, 72 U.S. (5 Wall.) 475, 479-80 (1867) (comentando a título de obiter dictum que a
punição não foi “cruel ou incomum”); O’Neil v. Vermont, 144 U.S. 323, 332 (1892).
13
Tribunal também considerou práticas estrangeiras na resolução de questões sobre
punições “cruéis e incomuns”6.
6 Em Wilkerson, a Corte se referiu positivamente ao direito estrangeiro, enquanto em ca-
sos posteriores os Magistrados se referiram às práticas ou opiniões estrangeiras tanto negativa
quanto positivamente. Ver, por exemplo, Weems v. United States, 217 U.S. 349, 377 (1910)
(observando a “fonte estrangeira” de uma punição, “de um governo de forma e gênio dife-
rente do nosso”, ao sustentar que a sentença violou a cláusula de punição cruel e incomum da
Constituição das Filipinas (tratada como idêntica à Oitava Emenda)); Trop v. Dulles, 356 U.S.
86, 102 (1958) (opinião pluralista) (argumentando que a imposição da apatridia como puni-
ção foi condenada “praticamente por unanimidade” entre as “nações civilizadas do mundo”);
McGautha v. California, 402 U.S. 183, 204-05 (1971) (discutindo a experiência britânica con-
temporânea em sentenças de pena de morte); Idem em 280-82 (Brennan, J., voto divergente)
(respondendo ao argumento da experiência britânica); Furman v. Georgia, 408 U.S. 238, 255-56
(1972) (Douglas, J., voto concorrente) (sugerindo que a pena de morte estava sendo aplicada
como na Índia antiga, ofendendo os compromissos anticastas da Constituição dos EUA); Idem
em 275 n. 18, 278-79, 296 (Brennan, J., voto concorrente) (referindo-se às práticas de outros
países “ocidentais”); Idem em 351, 371 (Marshall, J., voto concorrente) (armando que a ex-
periência nos EUA e no exterior sugere que a abolição da pena de morte não afeta as taxas de
criminalidade e destacando “as aproximadamente 70 outras jurisdições no mundo que celebram
sua estima pela civilização e humanidade rejeitando a pena capital”); Idem em 404 (Burger,
C.J., voto divergente) (argumentando que a tendência mundial de abolição legislativa da pena
capital não é argumento para a abolição judicial); Idem em 438 & n. 23-24, 453-54, 462 (Powell,
J., voto divergente) (comentando a experiência do Canadá e da Grã-Bretanha na abolição le-
gislativa da pena de morte); Gregg v. Georgia, 428 U.S. 153, 184 n.30, 193 n.43 (1976) (voto
de Stewart, Powell e Stevens, JJ.) (referindo-se ao Relatório da Comissão Real Britânica sobre a
Pena Capital) ; Coker v. Georgia, 433 U.S. 584, 592 n.4, 596 n. 10 (1977) (argumentando que a
morte não pode ser uma pena “indispensável” para estupro à luz das práticas de outros países
e observando o “clima da opinião internacional” por considerá-la inconstitucional); Enmund
v. Florida, 458 U.S. 782, 788, 796 n.22 (1982) (observando o direito estrangeiro e internacio-
nal ao considerar inconstitucional a pena de morte por homicídio qualicado); Thompson v.
Oklahoma, 487 U.S. 815, 830-31 (1988) (opinião pluralista) (referindo-se aos pontos de vista de
“outras nações que compartilham nossa herança anglo-americana” e dos “principais membros
da comunidade da Europa Ocidental” ao concluir que a pena de morte não poderia ser imposta
a quem fosse menor de dezesseis anos no momento do crime); Atkins v. Virginia, 536 U.S. 304,
316-17 n. 21 (2002) (observando a desaprovação mundial da pena de morte para pessoas com
retardo mental); ver também Robinson v. California, 370 U.S. 660, 672-73 (1962) (Douglas, J.,
voto convergente) (observando o tratamento britânico do vício em drogas como uma doença
ao invés de um crime); Solem v. Helm, 463 U.S. 277, 292 (1983) (observando a referência an-
terior da Corte à prática estrangeira); Cf. Kennedy v. Mendoza-Martinez, 372 U.S. 144, 161 n.
16 (1963) (referindo-se às consequências drásticas da apatridia [que] levaram à rearmação na
Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Artigo 15, do direito de todo
indivíduo de manter uma nacionalidade”); Rudolph v. Alabama, 375 U.S. 889, 889 n. 1 (1963)
(Goldberg, J., discordando de negar o certiorari) (observando a tendência em todo o mundo,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT