Conclusão
Autor | Fabiola Albuquerque Lobo |
Páginas | 153-157 |
CONCLUSÃO
A multiparentalidade ingressou de modo surpreendente no direito de família
brasileiro sem a formação prévia e consolidada da dogmática jurídica correspondente,
gerando perplexidades quanto ao seu conteúdo, alcance e interlocução com os demais
modos de filiação reconhecidos, notadamente com a parentalidade socioafetiva.
Desde o julgamento pelo STF do leading case estabelecendo a multiparentalidade
no direito brasileiro, que resultou na Tese 622 (RE 898060, 2016), a inquietação em
relação ao tema tornou-se recorrente.
O ponto central da Tese do STF está expresso no voto do Ministro Relator, nos seguintes
termos:
Ex positis, nego provimento ao Recurso Extraordinário e proponho a xação da seguinte tese para
aplicação a casos semelhantes: A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não
impede o reconhecimento do vínculo de liação concomitante baseado na origem biológica, com
todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais.1
A Ementa do Acórdão do mencionado Recurso Extraordinário 898060, no mesmo
sentido do voto do Ministro Relator, expressamente dispõe que a tese jurídica se aplica
“a casos semelhantes”. Sem referência expressa a casos semelhantes em seu enunciado,
a Tese foi assim fixada:
A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento
do vínculo de liação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios.
Nem o Acórdão nem a Tese delimitam ou especificam as configurações de casos
semelhantes, o seu âmbito de aplicação e os efeitos jurídicos próprios. Nesse cenário de
incertezas, transitamos para demarcar doutrinariamente os lindes desse novo instituto
da parentalidade e seus pontos de convergência e distinção com a consolidada paren-
talidade socioafetiva, no direito brasileiro.
A investigação que procedemos das transformações da filiação no direito brasileiro
permite-nos afirmar as seguintes teses conclusivas:
1. A história do direito de família brasileiro é marcada pela desigualdade entre os
cônjuges e entre os filhos. O casamento era a única forma de constituição de família e
com ele o homem assumia o papel de provedor e chefe, sendo-lhe conferida titulari-
dade exclusiva do exercício do poder marital e do pátrio poder. O estatuto jurídico da
filiação estruturou-se, assim, na diretriz da desigualdade da filiação. A desigualdade
da filiação, com a consequente superação dos critérios determinantes de legitimidade e
ilegitimidade, radicados na família matrimonializada, demandou um processo lento de
1. Disponível em: stf.jus.br. STF. RE 898060. Tema de Repercussão Geral 622, (22.09.2016).
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