A multiparentalidade no Estado de Louisiana (EUA)

AutorFabiola Albuquerque Lobo
Páginas123-140
CAPÍTULO 15
A MULTIPARENTALIDADE
NO ESTADO DE LOUISIANA (EUA)
Em 1974, um julgamento instou a Suprema Corte a conciliar o direito de família da
Louisiana, com o precedente estabelecido pela Suprema Corte dos Estados Unidos.1 Tal
fato propiciou o surgimento da tese da dupla paternidade na Louisiana, viabilizando-se
jurisprudencialmente a simultaneidade do pai por presunção (pai legal), com o pai por
reconhecimento, derivado da prova da paternidade biológica (pai real). Neste cenário,
ambos passam a ter direitos parentais e responsabilidade f‌inanceira com o f‌ilho.2
A tese da dupla paternidade ingressou no sistema jurídico da Louisiana pelas vias
jurisprudenciais e somente em 2005 foi incorporado no Código Civil. Até esse momento,
o caminho prolongou-se por 14 anos e remonta ao ano de 1991, quando o Instituto de
Direito do Estado da Louisiana (Louisiana State Law Institute – LSLI) iniciou o projeto
que resultou numa profunda reformulação da lei de f‌iliação. Durante esse período, o
tema mais inquietante e controverso entre os revisores dizia respeito à inserção ou não
da dupla paternidade na codif‌icação civil.3
Katherine Shaw Spaht analisando o processo de revisão legislativa da Louisiana,
entre o período de 1991 até 2005, ratif‌ica que um dos temas mais controversos, durante
todo este período foi o da dupla paternidade, em especial a discussão em torno de “quan-
do e em que circunstâncias uma criança cuja f‌iliação esteja previamente estabelecida, a
lei permitirá o ingresso do pai biológico e, quais devem ser as consequências legais?”4
Nesse mesmo sentido, Raquel Kovach af‌irma que, durante o período de revisão
legislativa, o debate em torno da recepção legal da dupla paternidade na Louisiana foi
um dos mais controversos.5
1. Disponível em: https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol77/iss4/11. RAUSCHENBERGER, Henry S. To
kill a cuckoo bird: Louisiana’s Dual Paternity Problem. -The doctrine of dual paternity in Louisiana a rose from
the 1974 Louisiana Supreme Court case of Warren v. Richard in attempt to reconcile Louisiana family Law with
then-recent United States Supreme Court precedent. 2017, p. 1185.
2. Disponível em: http://digitalcommons.wcl.american.edu/jgspl/vol16/iss2/4.
McGINNIS, Sarah. You Are Not The Father: How State Paternity Laws Protect (And Fail To Protect) the Best
Interests of Children. 2008, p. 319.
3. Disponível em: https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol77/iss4/11.
RAUSCHENBERGER, Henry S. To Kill a Cuckoo Bird: Louisiana ‘s Dual Paternity Problem, 2017, p. 1187-1188.
4. Disponível em: https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol67.
SPAHT, Katherine Shaw. Who’s Your Momma, Who Are Your Daddies? Louisiana’s New Law of Filiation dies?
2007, p. 308.
5. Disponível em: https://law.loyno.edu/sites/law.loyno.edu/f‌iles/Kovach-FI-MSP-PRINT.pdf.
KOVACH. Raquel L. Sorry daddy – your time is up: rebutting the presumption of paternity in Louisiana, 2011,
p. 658.
MULTIPARENTALIDADE: EFEITOS NO DIREITO DE FAMÍLIA • FABIOLA ALBUQUERQUE LOBO
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Como se percebe, entre os próprios revisores, não havia consenso e o ponto ne-
vrálgico era ter clareza do que estava em jogo. Af‌inal, a f‌inalidade da adoção ou não da
dupla paternidade era preservar a unidade conjugal e preservar o interesse da criança,
ou reconhecer o vínculo biológico?6
Repise-se a multiparentalidade só foi regulada expressamente pelo Código Civil
da Louisiana em 2005, portanto toda a aplicação do instituto, anterior a este período foi
exclusivamente pela esfera jurisprudencial. O mesmo ocorrendo no Brasil, quer dizer: o
ingresso da multiparentalidade no direito brasileiro se deu pela via jurisprudencial, por
ocasião do julgamento do caso paradigma resultando na Tese 622-STF (2016). Realidade
que permanece até o presente momento, ou seja, inexiste na legislação civil brasileira
qualquer dispositivo regulando a multiparentalidade.
Razão pela qual reputamos importante compreender como o Código Civil da Lou-
isiana (EUA) regula a dupla parentalidade e colher as impressões doutrinárias acerca
da temática.
15.1 AS PRESUNÇÕES DE PATERNIDADE NA LEGISLAÇÃO CIVIL DO ESTADO DE
LOUISIANA (EUA)
O Código Civil do Estado de Louisiana def‌ine a f‌iliação como o relacionamento
entre uma criança e seus pais (art.178), sendo este vínculo proveniente da prova de
maternidade ou paternidade ou por adoção (art. 179). O capítulo destinado às provas
da paternidade principia com a manutenção da clássica presunção pater is est, como a
principal forma de atribuição de paternidade, mas ao lado dela, de maneira complexa
e extensa, estabeleceu a presunção de paternidade por casamento subsequente e reco-
nhecimento de outras origens de paternidade.
De maneira sucinta apresentaremos os dispositivos pertinentes à presunção pater
is est e prosseguiremos com a regulamentação da dupla paternidade.
Subjacente a presunção pater is est (art.185) 7 centra-se a discussão da legitimidade
ou ilegitimidade da f‌iliação e, por extensão, a exclusividade do casamento associado
ao critério biológico, com o condão de legitimar a f‌iliação. Por muito tempo, a história
legislativa da Louisiana foi marcada pela pecha da desigualdade na f‌iliação e, aos pou-
cos, esta barreira foi superada rumo ao tratamento igualitário dos f‌ilhos, em atenção ao
princípio do melhor interesse.
A presunção pater is est apresenta-se de modo alternativo, ou seja, a presunção que
o pai da criança é o marido da mulher incide na constância do casamento, no nascimento
da criança, ou na morte do marido. Porém para estes dois últimos eventos, desde que
ocorram dentro dos trezentos dias, a partir da data do término do casamento. A mãe
casando-se novamente dentro daquele prazo estabelecido, e ocorrer o nascimento, a
presunção pater is est permanecerá.
6. Disponível em: https://digitalcommons.law.lsu.edu/lalrev/vol67. SPAHT, Katherine Shaw. Who’s your momma,
who are your daddies? Louisiana’s new law of f‌iliation dies? 2007, p. 354.
7. Disponível em: legis.la.gov/Legis/Law.aspx?d=109243. Civil Code, art. 185.

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