Constitucionalismo, historiografia e interculturalidade. Análises das rotas normativas para promoção da (bio)diversidade

AutorRhuan Filipe Montenegro dos Reis, Marcelo Rodrigues dos Reis
CargoUniversidade de Brasília, Centro Universitário de Brasília e Centro Universitário Cruzeiro do Sul, Brasília, DF, Brasil/Universidade de Brasília, Universidade Estadual de Goiás e Centro Universitário de Brasília, Brasília, DF, Brasil
Páginas159-176
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CONSTITUCIONALISMO, HISTORIOGRAFIA E
INTERCULTURALIDADE: ANÁLISES DAS ROTAS
NORMATIVAS PARA PROMOÇÃO DA (BIO)DIVERSIDADE
CONSTITUTIONALISM, HISTORIOGRAPHY AND INTERCULTURALITY:
ANALYZES OF NORMATIVE ROUTES TO PROMOTE (BIO)DIVERSITY
Rhuan Filipe Montenegro dos ReisI
Marcelo Rodrigues dos ReisII
Resumo: O presente trabalho analisa o fenômeno do
constitucionalismo intercultural sob o prisma das diversas
acepções de cultura bem como estabelece uma investigação
histórica do fenômeno educacional como propulsor
da promoção da diversidade. Nesse sentido, busca-se
compreender a historicidade dos processos sociopolíticos e os
fatores materiais que embasam as relações entre diversidade,
educação, cultura e sustentabilidade na vigente sistemática
constitucional. Analisa-se, em um primeiro momento, as
ideias de educação, diversidade e democracia, considerado
o enfrentamento dos abusos estatais contra coletividades
e minorias. Por fim, tendo em vista o histórico das
preocupações ambientais, discute-se a relação entre ethos,
paideia e constitucionalismo.
Palavras-chave: Direitos Culturais. Ecologia. Diversidade.
Constitucionalismo Cultural. Relação Educação/
Democracia.
Abstract: is paper analyzes the phenomenon of
multicultural constitutionalism from the perspective of
different cultural meanings, as well as establishing a historical
investigation of the educational phenomenon as a stimulator
of the promotion of diversity. In this sense, we pursue to
understand the historicity of socio-political processes and
the material factors that support the relationships between
diversity, education, culture and sustainability in the current
constitutional system. At first, the ideas of education, diversity
and democracy are analyzed, considering the confrontation
of state abuses against collectivities and minorities. Finally,
in view of the history of environmental concerns, the
relationship between ethos, paideia and constitutionalism
are discussed.
Keywords: Cultural Law. Ecology. Diversity. Cultural
Constitutionalism. Education/Democracy Relationship.
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v16i39.38
Recebido em: 30.04.2021
Aceito em: 26.07.2021
I Universidade de Brasília, Centro
Universitário de Brasília e Centro
Universitário Cruzeiro do Sul, Brasília,
DF, Brasil. Pós-graduado em Direito
Ambiental. E-mail: rhuan-reis@hotmail.
com
II Universidade de Brasília, Universidade
Estadual de Goiás e Centro Universitário
de Brasília, Brasília, DF, Brasil. Doutor
em História. E-mail: marceloreisueg@
gmail.com
160 Revista Direitos Culturais | Santo Ângelo | v. 16 | n. 39 | p. 159-176 | maio/agos. 2021
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v16i39.38
1 Introdução
Esse artigo se propõe a discutir noções multiculturalistas incorporadas ao nosso
constitucionalismo, percebendo o fenômeno intercultural no ordenamento brasileiro a partir de
dois aportes, as noções de paideia e ethos. Aborda-se, em um primeiro momento, os caminhos
institucionais para a superação dos atos discriminatórios e afirmação da diversidade, analisando
essa como valor incorporado na vontade política do Estado. Busca-se, através de certos marcos
da história do Brasil, compreender melhor o que motivou o acolhimento do multiculturalismo
pela atual sistemática constitucional.
No segundo momento, pretende-se discutir como o meio natural exerce influência
sobre a cultura humana, considerada, em especial, a noção de cultivo. Para isso, recorre-se a
investigações sobre a pré-história e fontes historiográficas que cobrem a Antiguidade. E, por fim,
busca-se perceber como, historicamente, a preocupação com o meio natural no Brasil explica
a diversidade de percepções ecológicas expressa pelos múltiplos setores nacionais. Sobre esse
ponto, verifica-se que ideias e pautas dos movimentos ambientalistas foram acatadas ou não
pela assembleia constituinte de 1987. O texto como um todo se empenha em conferir subsídios
teóricos para um dos desafios do constitucionalismo contemporâneo, que é a tarefa de normatizar
populações tão diversas em termos de hábitos sociais e arranjos ecossistêmicos com os quais elas
interagem.
2 Paideia, cultura e democracia no constitucionalismo brasileiro: das práticas
discriminatórias à promoção da diversidade
Apesar da notória proteção constitucional conferida à diversidade e à Educação, sendo
esta estatuída como mola propulsora daquela, a sistemática corrente de nossa Lei Fundamental,
pautada no acolhimento ao multiculturalismo e repúdio ao racismo e às práticas segregacionistas, é
resultado da lenta maturação de uma série de processos políticos, além da constante internalização
de valores democráticos que reformaram antigas práticas em nosso ordenamento jurídico. Nesse
contexto, vale invocar a lembrança amarga do Art. 138 da Constituição de 1934, que registrava:
“Incumbe à União, aos Estados e aos Municípios, nos termos das leis respectivas [...] estimular
a educação eugênica”1.
Achava-se institucionalizada pelo poder constituinte originário da época a noção
encetada por Francis Galton (1822-1911), que incorporou parte dos postulados científicos
de seu primo Charles Darwin – compilados em A origem das espécies –, estendendo-os para a
dinâmica das relações humanas, naquilo que Del Cont qualifica como “uma ciência genuína
sobre a hereditariedade humana que pudesse, através de instrumentação matemática e biológica,
identificar os melhores membros”2.
As práticas eugênicas no Brasil, antes mesmo de ganhar status constitucional, já vinham
sendo reafirmadas por movimentos e boletins médicos, que propagavam ideias pretensamente
científicas de melhoramento genético. Um dos maiores expoentes do movimento eugenista
1 BRASIL. Constituição Federal de 1934. Brasília, DF: Senado Federal, 1934. n.p.
2 DEL CONT, Valdeir. Francis Galton: eugenia e hereditariedade. Scientiae studie, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 201-
218, Jun 2008, p. 202.

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