A contribuição destinada ao financiamento do seguro de acidentes de trabalho e a aplicação do RE nº 343.446/SC

AutorFábio Zambitte Ibrahim, Agatha Accorsi Voss
Páginas148-171
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A CONTRIBUIÇÃO DESTINADA AO FINANCIAMENTO DO SEGURO
DE ACIDENTES DE TRABALHO E A APLICAÇÃO DO RE Nº
343.446/SC
THE CONTRIBUTION FOR THE FINANCING OF WORK ACCIDENT
INSURANCE AND THE APPLICATION OF RE Nº 343.446 / SC
Fábio Zambitte Ibrahim1
Agatha Accorsi Voss2
RESUMO: Este artigo analisa a decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso
Extraordinário nº 343.446/SC e o impacto dessa decisão nas discussões envolvendo a contribuição destinada ao
financiamento do Seguro de Acidentes de Trabalho (SAT) que surgiram posteriormente ao referido julgado.
Objetiva-se demonstrar que a matéria está longe de ser considerada pacífica na jurisprudência e que as premissas
adotadas pelo STF para declarar a constitucionalidade da contribuição para o SAT não podem ser utilizadas para
fundamentar e legitimar as alterações promovidas na legislação, no que diz respeito ao reenquadramento das
atividades nos graus de risco e à instituição do Fator Acidentário de Prevenção, que violam claramente importantes
princípios constitucionais.
PALAVRAS-CHAVE: Contribuição para o SAT. RE 343.446/SC. Delegação. Reenquadramento dos graus de
risco. Fator Acidentário de Prevenção. FAP.
SUMÁRIO: I. Considerações iniciais. II. Da Contribuição destinada ao financiamento do Seguro de Acidentes de
Trabalho. III. Do reenquadramento estabelecido pelo Decreto nº 6.957/09. IV. Do Fator Acidentário de Prevenção.
V. Conclusão. VI Referências Bibliográficas.
ABSTRACT: This paper examines the decision ruled by the Brazilian Supreme Court (STF) in the judgment of
the Extraordinary Appeal n. 343.446/SC and the impact of such decision on the discussions involving the
contribution to insurance against occupational diseases and accidents (SAT) which have arisen after the referred
decision. The objective is to demonstrate that the subject is far from being peaceful in the jurisprudence and that
the premises adopted by the STF to declare the constitutionality of the SAT cannot be used to justify and legitimize
the changes introduced in the legislation, regarding the reclassification of the activities in different degrees of risk
and the institution of the Accident Prevention Factor, which clearly violate important constitutional principles.
KEY WORDS: Contribution to the SAT. RE nº 343.446 / SC. Delegation. Reordering of degrees of risk.
Accident Prevention Factor. FAP.
SUMMARY: I. Initial considerations. II. Of the Contribution destined to the financing of the Insurance of
Accidents of Work. III. From the reframing established by Decree nº 6.957 / 09. IV. From the Accident
Prevention Factor. V. Conclusion. VI Bibliographical references.
Artigo recebido em 23/05/2018.
Artigo aprovado em 12/06/2018.
1 Advogado, Professor Titular de Direito Previdenciário e Tributário do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais
(IBMEC), Professor Adjunto de Direito Financeiro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ),
Professor e Coordenador de Direito Previdenciário da Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro
(EMERJ). Doutor em Direito Público pela UERJ, Mestre em Direito pela PUC/SP. Foi auditor fiscal da Secretaria
de Receita Federal do Brasil e presidente da 10ª Junta de Recursos do Ministério da Previdência Social.
2 Advogada e Mestranda em Finanças Públicas, Tributação e Desenvolvimento pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro - UERJ. RDRST, Brasília, Volume 4, n. 1, 2018, p 148-171, jan-abr/2018
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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
No âmbito do Poder Judiciário, a discussão envolvendo a contribuição destinada ao
financiamento do Seguro de Acidentes de Trabalho (“SAT”) é relativamente antiga, havendo
diversos precedentes sobre a matéria, inclusive do Supremo Tribunal Federal (“STF”).
Inicialmente, se sustentava a inconstitucionalidade da contribuição para o SAT
alegando, principalmente, que: (i) os arts. 3º, inciso II, da Lei nº 7.787, de 30.06.1989, e 22,
inciso II, da Lei nº 8.212, de 24.07.1991, teriam criado uma nova contribuição previdenciária
por meio de lei ordinária, com base de cálculo diversa daquela prevista no art. 195, inciso I, da
Constituição Federal de 1988 (CF/88), o que violaria o disposto no art. 154, inciso I, da CF/88
(que exige lei complementar para instituição de novas fontes de custeio destinadas à Seguridade
Social); e (ii) apesar de a lei ordinária ter estabelecido as alíquotas aplicáveis (1, 2 ou 3%)
segundo o grau de risco da atividade preponderante das empresas, ela (lei ordinária) não teria
definido o conceito de atividade preponderante nem os critérios para o enquadramento do grau
de risco das atividades, não tendo, portanto, definido os contornos para a quantificação da
contribuição; a definição do conceito de atividade preponderante e o enquadramento nos graus
de risco (que define a alíquota para fins de recolhimento da contribuição) teriam sido deixados
a cargo do Poder Executivo, o que violaria o princípio da legalidade.
No entanto, tais argumentos foram afastados pelo Plenário do STF no julgamento do
Recurso Extraordinário (“RE”) nº 343.446/SC, em 20.03.2003, de que foi relator o Ministro
CARLOS VELLOSO, em que foi reconhecida, expressamente, a constitucionalidade da
contribuição para o SAT e a legitimidade da delegação ao Poder Executivo para a definição do
conceito de “atividade preponderante” e o enquadramento das atividades nos respectivos graus
de risco (leve, médio ou grave). Confira-se a ementa do referido Acórdão:
EMENTA: - CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO: SEGURO
DE ACIDENTE DO TRABALHO SAT. Lei nº 7.787/89, arts. 3º e 4º; Lei nº
8.212/91, art. 22, II, redação da Lei nº 9.732/98. Decretos 612/92, 2.173/97 e 3.048/99.
CF., artigo 195, § 4º; art. 154, II; art. 5º, II; art. 150, I.
I Contribuição para o custeio do Seguro de Acidente do Trabalho SAT: Lei nº
7.787/89, art. 3º, II, art. 22, II: alegação no sentido de que são ofensivos ao art. 195, §
4º, c/c art. 154, I, da Constituição Federal: Improcedência. Desnecessidade de
observância da técnica da competência residual da União. CF., art. 154, I.
Desnecessidade de lei complementar para instituição da contribuição para o SAT.
II O art. 3º, II, da Lei nº 7.787/89, não é ofensivo ao princípio da igualdade, por isso
que o art. 4º da mencionada Lei 7.787/89 cuidou de tratar desigualmente os desiguais.
III As Leis 7.787/89, art. 3º, II, e 8.212/91, art. 22, II, definem, satisfatoriamente,
todos os elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida. O fato de a
lei deixar para o regulamento a complementação dos conceitos de ‘atividade
preponderante’ e ‘grau de risco leve, médio e grave’, não implica ofensa ao princípio
da legalidade genérica, C.F., art. 5, II, e da legalidade tributária, C.F., art. 150, I.

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