Os crimes informáticos na legislação dos palop

AutorPedro Dias Venâncio
Ocupação do AutorProfessor Adjunto convidado a tempo integral no Politécnico do Porto e Professor Auxiliar convidado a tempo parcial na Universidade do Minho. Investigador integrado no JusGov, da Universidade do Minho, e investigador convidado no CIICESI, do Politécnico do Porto. Nos anos de 2016 a 2018 exerci funções de assessor jurídico internacional no ...
Páginas3-24
OS CRIMES INFORMÁTICOS
NA LEGISLAÇÃO DOS PALOP
Pedro Dias Venâncio*1
Sumário: Introdução – 1. Do ciberespaço ao cibercrime – 2. A convenção sobre cibercrime de
Budapeste – 3. A convenção da união africana sobre a cibersegurança e proteção de dados
pessoais – 4. Crimes informáticos em Cabo Verde – 5. Crimes informáticos em São Tomé e
Príncipe – 6. Crimes informáticos em Moçambique – 7. Crimes informáticos em Angola – 8.
Conclusões – Referências.
INTRODUÇÃO
A comunidade dos Países Africanos de Língua Ocial Portuguesa (PALOP)
é atualmente composta pelos cinco membros originais – Angola, Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe – e a Guiné Equatorial, que
aderiu ao grupo posteriormente e adotou a língua portuguesa como ocial.
Após um longo período conturbado que sucedeu os respetivos processos de
independência e fortalecimento das instituições internas, estes países iniciaram na
última década um notável processo de aproximação à Sociedade da Informação,
espelhada a nível legislativo numa progressiva introdução das matérias do direito
digital nos respetivos ordenamentos jurídicos internos. A diversidade social,
política e económica entre estes países tem suscitados diferentes “velocidades”
e abordagens à realidade cibernética, mas todos convergem na necessidade de
harmonização dos seus ordenamentos jurídicos internos com as melhores práticas
internacionais.
As questões da cibersegurança e da cibercriminalidade não poderiam estar
afastadas deste processo de modernização legislativa.
* Professor Adjunto convidado a tempo integral no Politécnico do Porto e Professor Auxiliar convida-
do a tempo parcial na Universidade do Minho. Investigador integrado no JusGov, da Universidade
do Minho, e investigador convidado no CIICESI, do Politécnico do Porto. Nos anos de 2016 a 2018
exerci funções de assessor jurídico internacional no Gabinete do Ministro de Estado Coordenador
dos Assuntos Económicos e no Gabinete do Ministro da Agricultura e Pescas dos VI e VII Governos
Constitucionais da República Democrática de Timor-Leste. Exerci advocacia em Portugal, nas áreas
do Direito Empresarial, Direito laboral e da Propriedade Intelectual. Desde o ano letivo de 2003/2004
que venho exercendo funções como docente convidado em diferentes instituições de ensino superior,
em particular no Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, no Politécnico do Porto, na Universidade
do Minho e na Universidade do Porto. www.pdv.pt.
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PEdro dIAS VENâNCIo
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Neste texto começaremos por uma introdução às problemáticas que a ci-
bercriminalidade comporta para a ação penal dos Estados, em Africa como no
resto do Mundo, seguida de uma abordagem sucinta aos principais instrumentos
internacionais e africanos de harmonização do combate à cibercriminalidade
entre Estados. Passaremos de seguida para uma introdução aos principais diplo-
mas legais que consagram estas matérias nos ordenamentos jurídicos dos países
dos PALOP.
Numa perspetiva territorial, limitaremos a nossa análise a Angola, Moçam-
bique, Cabo Verde e São Tomé, por serem aqueles onde nos foi possível obter
informação suciente sobre o assunto. Na perspetiva material daremos especial
atenção à consagração nos ordenamentos internos destes países das normas de
direito penal substantivo relativas ao núcleo essencial de crimes sobre dados e
sistemas informáticos harmonizado internacionalmente.
Ainda assim, alertamos para a extrema diculdade que tivemos, a partir de
Portugal, em obter doutrina e jurisprudência dos respetivos países sobre estas
matérias, pelo que nessa parte a nossa análise é essencialmente baseada no texto
da lei.
1. DO CIBERESPAÇO AO CIBERCRIME
O acesso e utilização das Tecnologias da Informação e da Comunicação
(TIC), e em especial da internet,1 enquanto espaço globalizado de comunicação,
trabalho, informação e lazer teve um impacto incontornável em todos sujeitos
e organizações das sociedades modernas. Esta realidade é global e tem tido um
exponencial crescimento no continente africano. Num dos exemplos mais para-
digmáticos, uma notícia do site Mercados Africanos refere que “entre 2018 e 2021,
a taxa de penetração da Internet em Cabo Verde aumentou de 48% para 61,9% de
acordo com o Relatório Digital da Hootsuite e We Are Social”.2
De facto, no caso dos PALOP, Cabo Verde vem sendo apontado como o país
com maior penetração do acesso à Internet, mas evolução similar (mais lenta) vem
ocorrendo em outros países dos PALOP com maior extensão territorial e outras
diculdades técnicas a enfrentar. De facto, segundo o Internet World Stats3 em
2021 a penetração do acesso à internet (em percentagem da população) era nos
1. Muito resumidamente “A Internet é um sistema global de redes de computadores interligadas que
utilizam um conjunto próprio de protocolos (Internet Protocol Suite ou TCP/IP) com o propósito de
servir progressivamente usuários no mundo inteiro”. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/
Internet. Accesso em: 02 jun. 2022.
2. Disponível em: https://mercadosafricanos.com/cabo-verde-fundo-social-de-acesso-a-internet/. Acesso
em: 17 jun. 2022.
3. Disponível em: https://www.internetworldstats.com/africa.htm#st. Acesso em: 17 jun. 2022.
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