Da advocacia

AutorHélio Vieira - Zênia Cernov
Páginas15-228

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Capítulo I Da Atividade de Advocacia

Art. 1º São atividades privativas de advocacia:

· Vide Provimento n. 66/88 - p. 474.

O art. 1º enumera atos privativos de advocacia, que somente os advogados legalmente habilitados perante a OAB podem exercer, citando a postulação em juízo e as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas. O exercício de qualquer dessas atividades por quem não ostente a qualidade de advogado constitui exercício irregular da profissão (art. 4º do Regulamento Geral da OAB). O Provimento n. 66/88 dispõe sobre a abrangência das atividades profissionais do advogado, evidenciando que são privativos, além da representação em juízo, tribunal ou repartição: a) o procuratório extrajudicial; b) os trabalhos jurídicos de consultoria e assessoria; c) as funções de assessoria jurídica; d) o assessoramento jurídico nas transações imobiliárias; e) o assessoramento jurídico na elaboração de contratos e estatutos de sociedades civis e comerciais; f) a elaboração de defesas escritas ou orais perante quaisquer tribunais e repartições; g) a elaboração de memoriais no âmbito da Lei do Condomínio, no que é concernente à fundamentação jurídica. O rol não é taxativo, havendo outros atos que exigem a presença do advogado. A título de exemplo, a separação judicial e o divórcio consensuais podem ser materializados extrajudicialmente, por meio de escritura pública a ser lavrada perante o registro imobiliário, mas a validade de tais instrumentos está condicionada à presença do advogado (art. 733, § 2º do novo Código de Processo Civil). Há ainda uma infinidade de atos nos quais é facultada a presença do advogado, a exemplo da defesa técnica em processos administrativos de um modo amplo, quais sejam, procedimentos fiscais, tomadas de contas, tributários, de outorga, etc. Especificamente em relação aos processos administrativos de caráter disciplinar, o Superior Tribunal de Justiça pacificou, na Súmula n. 343, a posição de que "É obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar". Supervenientemente, no entanto, o STF concluiu que nos processos disciplinares a presença do advogado não é obrigatória, ao editar a Súmula Vinculante n. 5: "A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição". O Conselho Federal da OAB requereu ao STF o cancelamento da Súmula Vinculante n. 5, sob fundamento de que a ausência de defesa técnica por advogado não garante o acesso à ampla defesa, garantia do processo administrativo determinada pelo art. 5º, inc. LV, da Constituição Federal, pedido esse ainda pendente de julgamento.

I - a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais.

Em regra, a postulação judicial perante os órgãos do Poder Judiciário, denominado jus postulandi, é privativa do advogado. Em virtude de determinadas exceções admitidas pelo legislador pátrio, entre elas a possibilidade de a parte reclamar ou se defender sem a presença do advogado perante a Justiça do Trabalho, o termo "qualquer" foi considerado inconstitucional pelo STF na ADI 1.127: "I - O advogado é indispensável à administração da Justiça. Sua presença, contudo, pode ser dispensada em certos atos

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jurisdicionais. (...)" (STF, Pleno, ADI 1127-DF, Rel. p/acórdão Min. RICARDO LEWANDOWSKI, publ. DJe 10.06.2010). O direito de petição previsto no art. 5º, inc. XXXIV, da Constituição Federal (são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder") não se confunde com o jus postulandi. NELSON NERY JÚNIOR esclarece que o direito de petição é "um direito político e impessoal, que pode ser exercido por qualquer um, pessoa física ou jurídica, para que se possa reclamar, junto aos poderes públicos, em defesa de direitos contra ilegalidade ou abuso de poder (...). O direito constitucional de petição não garante ao interessado peticionar em juízo sem capacidade postulatória" (Constituição Federal Comentada, 2ª ed./2009, RT, p. 178). Sobre o jus postulandi, vide ainda os comentários ao caput do art. 2º do EAOAB, nos quais fazemos uma crítica relativa ao conflito entre a indispensabilidade do advogado e as hipóteses nas quais ainda se admite que a parte litigue sem sua necessária presença.

Jus Postulandi na Justiça do Trabalho: Ao comentar a decisão do Supremo Tribunal Federal firmada na ADI n. 1.127, PAULO LÔBO aponta que "A decisão do Supremo Tribunal Federal, no que concerne à justiça trabalhista, resultou em tornar compatíveis o Estatuto e a CLT, não tendo aquele derrogado esta. Mantem-se a mesma situação anterior de representação profissional facultativa, embora a prática tenha demonstrado que, na quase-totalidade das reclamações, as partes (empregadores e empregados) estejam sempre patrocinados por advogados" (Comentários ao EAOAB, 5ª ed./2009, Saraiva, p. 17). A constante luta da OAB pelo cumprimento integral do art. 133 da Constituição Federal e a indispensabilidade do advogado em todas as esferas do Poder Judiciário vem cada vez mais ganhando força na Justiça do Trabalho. Alguns exemplos muito positivos devem ser apontados: a) A OAB Seccional Rondônia e o TRT 14ª Região firmaram o Convênio n. 004/2007, em cuja Cláusula Primeira se prevê: "O presente Convênio tem por objeto possibilitar o funcionamento de um Escritório Corporativo da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Rondônia, no âmbito da Justiça do Trabalho, onde atenderá às reclamações trabalhistas mediante o encaminhamento dos reclamantes e reclamados para fins de obtenção de assistência jurídica prestada por advogado." A experiência eliminou a reclamação a termo na capital Porto Velho e acabou por ser estendida às demais comarcas e ao Estado do Acre, também integrante da 14ª Região; b) O TRT da 6ª Região editou, em março de 2000, a Resolução Administrativa n. 04/2000, em cujo art. 1º resolveu "Não mais admitir a propositura de reclamações verbais, no âmbito deste TRT da 6ª Região" (revogada em outubro de 2011); c) O próprio Tribunal Superior do Trabalho não admite o jus postulandi em seu âmbito de atuação. No acórdão proferido pelo seu plenário no E-AIRR e RR 8558100-81.2003.5.02.0900 (Rel. Min. JOÃO ORESTE DALAZEN), ficou consignado que "A capacidade postulatória assegurada às partes no art. 791 da CLT não é absoluta, por seus graves e notórios inconvenientes às próprias partes e à administração da Justiça". Os seguintes fundamentos colhidos do voto do relator conduziram o julgado: "A um, porque, sob um prisma psicológico, sem o concurso do advogado, a parte louva-se do processo para um desabafo sentimental pouco produtivo; obcecada pela paixão e pelo ardor, não tem, como regra, a serenidade para captar os pontos essenciais do caso e expor as razões de modo tranquilo e ordenado, ao passo que o advogado, sem rancores pessoais, garante uma defesa mais razoável, selecionando com calma e ponderação os argumentos mais eficazes e persuasivos. A dois, porque, como se sabe, o processo é instrumento de técnicos, sobretudo ante a progressiva complexidade das causas e a complicação das leis escritas, no particular, a legislação trabalhista, que muitas vezes se apresenta confusa, difusa e profusa. Como afirma VALENTIN CARRION, a norma do art. 791 da CLT "é uma armadilha que o desconhecimento das leis lhe prepara, posto que ou não é necessitado e poderia pagar, ou, sendo-o, teria direito à assistência judiciária gratuita e fácil" (CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 34ª ed., atual. por Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 605). (...) A rigor, é forçoso convir que a capacidade postulatória que se teima em manter no processo do trabalho não é direito, é desvantagem. Penso que sob a enganosa fachada de uma norma que busca emprestar acessibilidade à Justiça do Trabalho é um ranço pernicioso, oriundo da fase administrativa da Justiça do Trabalho e que ainda hoje persiste em total discrepância com a realidade atual." Sucede que esses mesmos fundamentos se aplicam no âmbito do primeiro e segundo graus da jurisdição trabalhista.

Jus Postulandi nos Juizados Especiais: A postulação da parte nos juizados especiais, sem a presença de advogado, prevista no art. 9º da Lei n. 9.099/95 (juizados especiais estaduais) foi declarada constitucional pelo STF na ADI 1.539: "1. Juizado Especial. Lei 9.099/95, artigo 9º. Faculdade conferida à parte para demandar ou defender-se pessoalmente em juízo, sem assistência de advogado. Ofensa à Constituição Federal. Inexistência. Não é absoluta a assistência do profissional da advocacia em juízo, podendo a lei prever situações em que é prescindível a indicação de advogado, dados os princípios da oralidade e da informalidade adotados pela norma para tornar mais célere e menos oneroso o acesso à justiça. Precedentes. (...)" (STF, Pleno, ADI 1539-UF, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, publ. DJ 05.12.2003, p. 17). Igualmente, o STF declarou a constitucionalidade do art. 10 da Lei 10.259/2001 (juizados especiais federais), permitindo a postulação

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sem advogado, no âmbito destes, somente em feitos de natureza cível, no julgamento da ADI 3.168: "É constitucional o art. 10 da Lei 10.259/2001, que faculta às partes a designação de representantes para a causa, advogados ou não, no âmbito dos juizados especiais federais. No que se refere aos processos de natureza cível, o Supremo Tribunal Federal já firmou o entendimento de que a imprescindibilidade do advogado é relativa, podendo, portanto, ser afastada pela lei em...

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