Da fraude à execução no processo do trabalho

AutorMauro Schiavi
Ocupação do AutorJuiz titular da 19a Vara do Trabalho de São Paulo. Mestre e Doutor em Direito das Relações Sociais pela PUC/SP
Páginas127-135

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Assevera o art. 792 do CPC:

A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:

I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;

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II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828;

III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude;

IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;

V - nos demais casos expressos em lei.

§ 1º A alienação em fraude à execução é ineficaz em relação ao exequente.

§ 2º No caso de aquisição de bem não sujeito a registro, o terceiro adquirente tem o ônus de provar que adotou as cautelas necessárias para a aquisição, mediante a exibição das certidões pertinentes, obtidas no domicílio do vendedor e no local onde se encontra o bem.

§ 3º Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.

§ 4º Antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze) dias.

No CPC de 73 (art. 593), a nomenclatura utilizada era fraude de execução, o CPC atual utiliza a expressão fraude à execução.

Nas palavras de Cândido Rangel Dinamarco7, a fraude de execução "é ato de rebeldia à autoridade estatal exercida pelo juiz no processo".

Caracteriza-se a fraude de execução quando o devedor, diante de uma lide pendente, onera ou grava bens, sem ficar com patrimônio suficiente para quitar a dívida.

A declaração da fraude de execução destina-se a neutralizar as alienações ou onerações de bens por parte do executado, quando houver ação pendente, sem ficar com patrimônio suficiente para solucionar o processo, tendo por objetivo assegurar a efetividade processual, a dignidade da justiça e o efetivo recebimento do crédito consagrado no título executivo.

A fraude de execução, por ser um instituto de ordem pública, destinada a resguardar a dignidade do processo e efetivação da jurisdição, pode ser reconhecida de ofício pelo juiz, inclusive em sede de embargos de terceiro. Não há necessidade de ação própria, pois o juiz reconhecerá a fraude incidentalmente, nos próprios autos da execução. Também a fraude independe de estar o terceiro adquirente do bem de boa ou má-fé.

Não se confunde a fraude de execução, que é instituto de direito processual com o tipo penal de fraude à execução, prevista no art. 179 do Código Penal, que assim dispõe:

Fraudar a execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas.

Não obstante, a fraude de execução praticada no processo, conforme a gravidade da conduta do executado, poderá configurar o delito penal de fraude à execução.

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O ato praticado em fraude à execução não é nulo, nem anulável, tampouco inexiste, é ineficaz em face do processo, ou seja, é como se não tivesse sido efetuado, embora entre terceiros ela seja eficaz. Como bem adverte Araken de Assis8:

(...) o ato fraudulento, ineficaz, apesar de existente e válido entre seus figurantes, é como se inexistisse para o credor que poderá requerer e obter a penhora da coisa, transmitida ou gravada a terceiro (art. 593, caput), como se ainda estivesse presente no patrimônio do executado. Mais do que sutil jogo de palavras, a ineficácia se apresenta vantajosa para o credor prejudicado, comparativamente às dificuldades do regime normal: o juiz declarará a fraude, incidentalmente, nos próprios autos da execução.

O inciso I do art. 792 não se aplica ao direito processual do trabalho, pois a Justiça do Trabalho não detém competência material para ações fundadas em direito real. Nesse sentido é a visão de Manoel Antonio Teixeira Filho9:

(...) no processo do trabalho não há lugar para a fraude de execução baseada neste inciso, que pressupõe a existência de litígio acerca dos bens, de natureza real (ius in re), e que estes venham a ser alienados ou onerados pelo devedor. Justamente para prevenir eventual terceiro adquirente é que se tem exigido a inscrição da citação do réu no Cartório do Registro de Imóveis competente, a fim de que esse registro passe a constar do histórico do imóvel - nada obstante a doutrina processual civil se encontre dividida a respeito da necessidade dessa inscrição.

Os incisos II e III são perfeitamente aplicáveis ao processo do trabalho. Sendo assim, haverá fraude à execução, quando:

  1. tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828. Dispõe o art. 828, do CPC: "O exequente poderá obter certidão de que a execução foi admitida pelo juiz, com identificação das partes e do valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens sujeitos a penhora, arresto ou indisponibilidade. § 1º No prazo de 10 (dez) dias de sua concretização, o exequente deverá comunicar ao juízo as averbações efetivadas. § 2º Formalizada penhora sobre bens suficientes para cobrir o valor da dívida, o exequente providenciará, no prazo de 10 (dez) dias, o cancelamento das averbações relativas àqueles não penhorados. § 3º O juiz determinará o cancelamento das averbações, de ofício ou a requerimento, caso o exequente não o faça no prazo. § 4º Presume-se em fraude à execução a alienação ou a oneração de bens efetuada após a averbação. § 5º O exequente que promover averbação manifestamente indevida ou não cancelar as averbações nos termos do § 2º indenizará a parte contrária, processando-se o incidente em autos apartados";

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  2. tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo em que foi arguida a fraude: como já mencionado, uma das finalidades da hipoteca judiciária e também do registro de constrição judicial é prevenir a fraude à execução.

    Quanto ao inciso IV do art. 792 do CPC, a conduta é de frequente ocorrência no processo do trabalho. Diz o dispositivo que se configura a fraude de execução "quando ao tempo da alienação ou oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência".

    Ocorre a insolvência quando os bens patrimoniais do devedor são de valor inferior ao de suas dívidas. Se o deficit patrimonial acontece, ou se agrava, em razão de ato de disposição ou oneração praticado pela parte...

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