Da propriedade imobiliária

AutorChristiano Cassettari, Marcos Costa Salomão
Páginas111-175
Capítulo 5
DA proprieDADe imoBiLiáriA
5.1 DA PROPRIEDADE
A propriedade é o direito real por excelência, que dá ao proprietário a faculdade
de usar, gozar e dispor da coisa, além do direito de reavê-la de quem injustamente a
possua ou detenha. Ela não se confunde com domínio, já que ele recai somente sobre
coisas corpóreas, ou seja, é mais restrito que propriedade (o termo domínio era usado
pelo Código Civil de 1916 como sinônimo de propriedade). Já a propriedade recai sobre
coisas corpóreas ou incorpóreas (propriedade intelectual – artística, literária, marcas,
patentes, software). Propriedade é o termo usado pelo Código Civil vigente.
5.1.1 Extensão vertical da propriedade
A propriedade compreende o espaço aéreo e o subsolo correspondente (art. 1.229
do CC). O art. 1.230 do Código Civil e o art. 20, IX e X, da CF excepcionam essa regra
ao af‌irmar que serão de propriedade da União os recursos minerais do subsolo, potenciais
energéticos, sítios arqueológicos e bens referidos em lei especial. Se inexistirem riquezas
minerais no subsolo, o proprietário poderá construir porões e garagens.
5.1.2 Faculdades inerentes à propriedade
O art. 1.228 do Código Civil determina:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do
poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Pelo exposto, verif‌ica-se que o proprietário possui os seguintes poderes inerentes
à propriedade:
Direito de usar (jus utendi): trata-se da faculdade de servir-se da coisa de acordo
com a sua destinação econômica, para f‌ins residenciais ou comerciais. Basta para o
uso o bem estar em condições de servir o proprietário quando necessário. A faculdade
do uso não prescreve pelo não uso; só pela posse de outra pessoa (comportamento
antissocial).
Direito de gozar (jus fruendi): trata-se do direito de fruição, em que o titular pode
explorar economicamente o bem, retirando os frutos que a coisa produzir.
Cumpre lembrar que os frutos são bens acessórios que se renovam com o tempo, e
se dividem em: frutos naturais, que são aqueles produzidos pela natureza. Como exem-
plo citamos o fruto de uma árvore; frutos industriais, que são aqueles produzidos pelo
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REGISTRO DE IMÓVEIS • Christiano Cassettari
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homem. Como exemplo citamos o artesanato; frutos civis, que são aqueles produzidos
pela renda gerada na utilização do bem por um terceiro. Como exemplo citamos os juros.
OBSERVAÇÃO: os frutos não se confundem com os outros bens acessórios,
como os produtos, que não se renovam com a sua retirada (por exemplo, a mina,
o ouro e o poço de petróleo), tampouco com as pertenças, que não constituem
parte integrante da coisa, mas se destinam de modo duradouro ao uso, serviço ou
aformoseamento de outro bem.
Direito de dispor (jus abutendi): é caracterizado pela faculdade do proprietário de
alterar a própria substância da coisa. Ou seja, o direito de dispor é o poder de consumir
a coisa, de aliená-la, de gravá-la de ônus e de submetê-la ao serviço de outrem (demo-
li-la ou vendê-la). A disposição pode ser: disposição material, que são atos físicos que
importam em perda da propriedade, tais como a destruição ou o abandono; disposição
jurídica, que são atos de alienação/constituição de ônus reais.
Direito de reivindicar (rei vindicatio): é a faculdade que permite excluir a inge-
rência de terceiros sobre a coisa, ou seja, é o poder que tem o proprietário de mover
ação para obter o bem de quem injusta ou ilegitimamente o detenha, em razão do seu
direito de sequela. Ele é exercido por meio da ação reivindicatória no juízo petitório.
Cumpre lembrar que a exceptio proprietatis foi abolida pelo art. 1.210 do Código Civil,
que dividiu o juízo possessório (em que se discute posse) do petitório (no qual se discute
propriedade). Esse é o conteúdo do Enunciado n. 79 do CJF.
O exercício do direito de reivindicação se dá pela ação reipersecutória, quando o
autor requer a restituição de algo que é seu e que se acha fora de seu patrimônio.
Como a ação reipersecutória é aquela que busca a entrega de alguma coisa, ela pode
ser tanto real como pessoal. A ação de despejo é reipersecutória pessoal; já a reivindi-
catória é reipersecutória real. Reipersecutória é denominada de acordo com o pedido.
5.1.3. Espécies de propriedade
Propriedade plena: o proprietário tem em mãos os quatro elementos (uso, gozo,
disposição e reivindicação), ou seja, a propriedade será plena quando seu titular puder
usar, gozar, dispor do bem de forma absoluta, exclusiva e perpétua, bem como reivin-
dicá-lo de quem injustamente o detenha.
Propriedade limitada ou restrita: o proprietário transfere o uso e/ou o gozo para
alguém, impondo para si um ônus real em prol de terceiro, como ocorre no caso do
usufruto, f‌icando somente com o direito de dispor e de reivindicar.
Propriedade resolúvel: a propriedade será resolúvel quando houver f‌ixado um
termo ou uma condição resolutiva que dará causa à sua extinção. Como exemplo citamos
a propriedade f‌iduciária, que será estudada mais adiante.
5.1.4. Características do direito de propriedade
Exclusividade: a mesma coisa não pode pertencer exclusiva e simultaneamente
a duas ou mais pessoas; por esse motivo, o proprietário pode excluir o outro pela ação
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reivindicatória. No condomínio não há contradição com esse princípio, já que, pelo
estado de indiviso do bem, cada um tem uma fração ideal (são donos da sua parte e
do todo).
Perpetuidade: a propriedade tem duração ilimitada, até ser transmitida por vontade
do dono (venda) ou por disposição legal (usucapião), exceto se a propriedade for resolú-
vel ou revogável, na hipótese de no título a sua duração for subordinada ao implemento
de condição resolutiva ou advento de termo. Assim, uma vez adquirida a propriedade,
em regra não pode ser perdida senão pela vontade do proprietário.
Elasticidade: a propriedade comporta desmembramento em frações ideais para
várias pessoas.
5.1.5. Conteúdo constitucional da propriedade
Os bens corpóreos ou incorpóreos podem constituir objeto de direito (art. 5º, XXII),
desde que cumpram com sua função social (art. 5º, XXIII). A Constituição Federal elenca
o direito de propriedade como uma garantia fundamental, prevista em cláusula pétrea,
colocando o cumprimento da função social da propriedade como um requisito para o
preenchimento do seu conceito.
Não há na Constituição um conceito fechado de função social da propriedade.
Porém, o art. 186 apresenta os requisitos que devem ser obedecidos para o cumprimento
da função social da propriedade rural. São eles:
a) o aproveitamento racional e adequado;
b) a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
c) a observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
d) a exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
De acordo com o referido artigo, a função social é cumprida quando a propriedade
rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em
lei, aos requisitos acima descritos.
5.1.6. Função social da propriedade
A função social da propriedade possui origem constitucional, já que o inciso XXIII
do art. 5º determina o seu cumprimento. O seu fundamento legal no Código Civil está
descrito no art. 1.228, § 1º, que estabelece:
Art. 1.228. (...)
§ 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas nalidades econômicas
e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a
ora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como
evitada a poluição do ar e das águas.
A sua importância atual é tão grande que o Código Civil elevou a função social da
propriedade à categoria de preceito de ordem pública no parágrafo único do art. 2.035.
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