Democracia, inclusão e direitos sociais no Supremo Tribunal Federal: o julgamento da constitucionalidade da lei brasileira de inclusão na ADI 5357

AutorFlávia Danielle Santiago Lima
Páginas59-78
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 59-78
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DEMOCRACIA, INCLUSÃO E DIREITOS SOCIAIS NO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL: O JULGAMENTO DA CONSTITUCIONALIDADE DA LEI
BRASILEIRA DE INCLUSÃO NA ADI 5357
Flávia Danielle Santiago Lima*
RESUMO: O trabalho explora os desafios normativos e políticos para assegurar eficácia
jurídica ao direito fundamental social à educação das crianças com deficiência. Para tal fim,
propõe-se a análise da discussão, no Supremo Tribunal Federal, sobre a constitucionalidade
de dois artigos da Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº. 13.146/2015), na Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) no. 5357, ajuizada pela CONFENEN (Confederação Nacional
dos Estabelecimentos de Ensino). O julgamento recente da ação, que manteve os artigos
questionados, permite avaliar o potencial de proteção de direitos fundamentais pelo exercício
da revisão judicial.
Palavras-chave: Direitos Sociais. Inclusão. Revisão Judicial. Supremo Tribunal Federal.
INTRODUÇÃO: O CONSTITUCIONALISMO ENTRE LIBERDADE E
SOLIDARIEDADE
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possibilidade de que um Tribunal anule os atos dos poderes sujeitos aos processos eleitorais é
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pequena minoria um poder de veto sobre a maioria1. Estas expressões, consagradas por
Alexander Bickel (1962, p. 16-18) e posteriormente incorporadas ao debate da teoria
constitucional, mostram o principal dilema posto aos magistrados encarregados da revisão
judicial de legislação: o que justifica a invalidação das decisões dos representantes do povo?
Responder a este questionamento exige a compreensão do longo caminho
percorrido pelas organizações políticas, na construção de disposições materiais que permitam
ou rechacem as decisões tomadas pelos titulares dos poderes majoritários. Pode-se
afirmar, neste sentido, uma pluralidade de tradições constitucionais, que confluíram na
* Doutora e Mestre em Direito Público (Faculdade de Direito do Recife/ UFPE). P rofessora da Universidade
Católica de Pernambuco (UNICAP). Advogada da União. Pesquisadora do Grupo (REC) Recife Estudos
Constitucionais (UNICAP/CNPq). E-mail: flavia-santiago@uol.com.br.
1 Bickel (1962, p. 16 -18) se referiu, respectivamente: "counter-majoritarian force in our system", "a deviant
institution in the American democracy", "it thwarts the will of representatives of the actual people of the here
and now", "exercises control, not in behalf of the prevailing majority, but against it.", “That, without mystic
overtones, is what actually happens
R: 15.05.2016; A: 25.06.2016
Democracia, inclusão e direitos sociais no Supremo Tribunal Federal: o julgamento da constitucio nalidade da
lei brasileira de inclusão na ADI 5357
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 79-98
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O Direito fundamental à educação inclusiva nas escolas regulares privada s e a LBI
compreensão hodierna de identificação entre o direito e o estabelecimento de condições para o
exercício do poder político (CANOTILHO, 2000, p. 87-91).
Num primeiro momento, o constitucionalismo assumiu uma matriz individualista
e formal, característica do pensamento liberal (LAFER, 1999, p. 126), ao unificar os
principais fundamentos burgueses: origem popular do poder, direitos individuais
propriedade e liberdade, precipuamente e limitação da atividade estatal, amparada na
garantia destes direitos.
Desta forma, os franceses chegaram à identificação entre Constituição, liberdade e
divisão dos poderes, ideia que teve seu maior expoente no célebre art. 16 da Declaração de
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Posteriormente, teve-se o advento do Estado de Bem-Estar, que repercutiu
juridicamente na formatação de um constitucionalismo social. Nesta perspectiva, tem-se a
pretensão de conjugar um projeto de emancipação social com postulados de um Estado de
Direito clássico. Este modelo legitima-se ideologicamente por constituições que exprimem
valores de solidariedade, que intentam despolitizar a quest   
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Vislumbra-se um novo critério de justiça, assentado no paradigma de isonomia,
traduzido numa igualdade de oportunidades ou nas possibilidades de realização da
personalidade ético-cultural de cada um (PINTO, 1994, p. 161). Superar-se-ia a perspectiva
de igualdade formal, preconizada pelo estado mínimo em voga até então.
As previsões do constitucionalismo social obrigam a uma reformulação das
dinâmicas entre os poderes, de sorte que os ramos executivo, parlamentar e judicial devem
incorporar estas pautas às suas atuações. E, em caso de descumprimento de suas diretrizes, o
constitucionalismo posterior a Segunda Guerra Mundial fortaleceu o Poder Judiciário,
sobretudo a jurisdição constitucional, para a garantia do acordo firmado.
A Constituição Brasileira de 1988 (CRFB/88) aderiu aos pilares do
constitucionalismo social, ao adotar a 
preconceitos, fundada na harmonia social e com 
como desafio para os brasileiros, conforme consta de seu Preâmbulo. Consignado, dentre os
objetivos fundamentais do Estado Brasileiro,        
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Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 59-78

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