Os desafios do Antitruste no Setor Portuário Brasileiro: as inovações da Lei nº 12.815/13 e seus reflexos concorrenciais

AutorVictor Oliveira Fernandes
CargoAdvogado. Graduado em Direito pela Universidade de Brasília e free-mover student pela Universidade de Hamburgo, Alemanha
Páginas161-210
Os desafios do antitruste no setor portuário brasileiro... (p. 161-210) 161
FERNANDE S, V. O. Os desafios do Antit ruste no Setor Portuári o B rasileiro: as inovaçõ es da Lei nº 12.815 /13 e seus reflexos
concorrenci ais.
Revista de Dir eito Setorial e R egulatório
, Brasília, v . 2, n. 1, p. 1 61-210, maio 2016.
Os desafios do Antitruste no Setor Portuário Brasileiro: as inovações
da Lei nº 12.815/13 e seus reflexos concorrenciais*
Brazil’s Port Sector Antitrust Challenges: Innovations brought about by
Law no. 12,815/2013 and its effects on competition
Submetid o(
submitted
): 24/03/2 015
Victor Oliveira Fernandes**
Parecer(
revised
): 26/03/ 2015
Aceito(
accepted
): 21/08/2 015
Resumo
Propósito
Investigar como a nova Lei dos Portos brasileira de 2013 lidou com os
problemas concorrencia is deixados pelo diploma a nterior e quais sã o as novas
possibilidades e desafios de promoção da concorrência no setor.
Metodologia/abor dagem/design
A obra é dividida em três mome ntos. O primeiro
capítulo faz uma breve incursão nas relaçõ es entre regulação e concorrência. A segunda
parte dedica -se a investigar o de senvolvimento do arcab ouço regulatório concor rencial no
setor sob a égide da antiga lei portuária. Por fim, o últi mo ca pítulo explica como as
inovações trazidas pela Lei nº 12. 815/13 reperc utem na viabilidade do modelo de
competição qu e o novel diploma busca f omentar.
Resultados
As assimetrias regulatórias existentes nos novos regimes d e arrendamento e
de autorização portuária tornam pouco exequível o processo competitivo que a Lei nº
12.815/13 visa est imular. Os altos custos de infraes trutura, as limitações à expansão
territorial das insta lações portuár ias privadas e as disparidades nos re gimes de tarifação
são alguns dos fatores que colocam em c heque o crescimento do setor.
Palavras-chav e: setor portuário brasileiro, direito da concorrênci a, nova Lei d os Portos,
imunidades a ntitruste, THC2.
Abstract
Purpose
To assay how the new Ports La w (Law no. 12,8 15/13) treated th e competition
vulnerabilities of the p revious regulati on and also intend to i dentify the ne w competition
boundaries of the sector.
*
O presente artigo constitui reprodução parcial da monogra fia Regulaçã o do Setor
Portuário Brasileiro e os Des afios do Antitruste: as inovações da Lei nº 12.815/13 e seus
reflexos concorrenci ais, a qu al rec ebeu Menção Honrosa na categoria “Regulação da
Atividade Econô mica no X Prêmio Seae/MF de Monograf ias, realizado pela Escola
Superior de A dministração Fazendária - ESAF/MF, no ano de 2015.
**
Advogado. Graduado em Direito pela Universidade de Brasília e free-move r stude nt
pela Universidade de Ham burgo, Alem anha. P ossui experiên cia profissi onal na área de
defesa da concorrência em mercados regulados, em especial no setor portuário brasileiro.
Especialista da carreira de regul ador da Agência Nac ional de Telecomunicações. Email:
victorolfernandes@gmail.com.
162
Os desafios do antitruste no setor portuário brasileiro... (p. 161-210)
FERNANDE S, V. O. Os desafios do Antit ruste no Setor Portuári o Brasileiro: as inovaçõ es da Lei nº 12.815 /13 e seus reflexos
concorrenci ais.
Revista de Dir eito Setorial e R egulatório
, Brasília, v . 2, n. 1, p. 1 61-210, maio 2016.
Methodology/a pproach/design
This research is divided into three c hapters. The first
one promotes a short analysis of the relationshi p betwee n comp etition an d regulat ion
systems. The secon d i nvestigates previous port regulatio n competition vulnerabilit ies.
Finally, the last ch apter explains the treatment given to the competiti on structur e by the
new regulator y model.
Findings
The regu latory asymmetries between the actual m odels of port services
delegation might jeopardize the competition encouraged by th e new regulatio n. The high
infrastructure costs involve d, the private ports legal limitation s that hind er exp ansion
plans a nd the discrep ancies in rat es policy a re some mat ters that ma y limit the market’s
growth.
Keywords: B razilian port sector, antit rust law, ports law, antitrust immunity, THC 2.
Introdução
Embora a existência de mecanismos regulatórios não seja totalmente
incompatível com a atuação das autoridades antitruste, a experiência mostra que,
por vezes, as opções regulatórias adotadas podem influenciar de forma
significativa a viabilidade da promoção da concorrência nos mercados
regulados. Especial mente e m d omínios se nsíveis ao desenvolvimento nacional,
como nos setores de infraestr utura tipicamente marcados por elevados custos
de entrada e pela necessidade de compartilhamento de estruturas vertica lmente
integradas , a falta de regulamentação concorrencial específica ou o excesso
desorientado de normas setoriais podem dar margem a abusos de poder
econômico, cuja repreensão desafia os limites da competência da autoridade
antitruste.
No que concerne ao setor portuário brasileiro, a j urisprudência do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) nos últimos anos têm
evidenciado que os principais problemas co ncorrenciais neste domínio decorrem
de ineficiências em determinadas políticas regulatórias, que carecem de
regulamentos téc nicos ad equados e de normas setoriais específicas que
enderecem ex ante as naturais tendências à vertical ização dos mercados
envolvidos
1
. Os contratos de arrendamento de serviços portu ários, por exemplo,
1
Em um dos primeiros casos julgados sob a ég ide da Lei nº 8.630/93, o conselheiro Luiz
Carlos Delorme Prado, em seu voto no PA nº 080 12.007443/99-17, já advertia os riscos
do déficit de regulação concorre ncial no s etor: “É minha opinião que, nas condições
vigentes nas atividad es de se rviços portuár ios, há incentivos p ara a prática de restrições
verticais pel os Operadores Portu ários e, ainda, não há mecani smos que permitam a
formação de preços na cobrança de serviços de li beração de contê ineres. E a questão
concorrencial que tal situação acarreta pode ser sup erada ou pela proi bição de
cobrança desses serviços aos terminais retroportuários, ou p ela regula mentação, isto é,
Os desafios do antitruste no setor portuário brasileiro... (p. 161-210) 163
FERNANDE S, V. O. Os desafios do Antit ruste no Setor Portuári o B rasileiro: as inovaçõ es da Lei nº 12.815 /13 e seus reflexos
concorrenci ais.
Revista de Dir eito Setorial e R egulatório
, Brasília, v . 2, n. 1, p. 1 61-210, maio 2016.
têm propiciado a cobranças de tarifas não expressame nte outorgadas aos
particulares pelo Poder Público , devido ao elevado grau d e abertura do seus
textos
2
. Além disso, o modelo de delegações previsto na Lei de 1993 e as
limitações ao uso de terminais privados imposta em normas setoriais da Antaq
se tornaram óbices ao desenvolvimento da competição entre portos distintos.
Esses elementos atestam as vulnerabilidades concorrenciais do setor portuário
nas décadas de 1990 e 2000
3
.
Em face desse conjunto de atonia normativa, a Lei nº 12.815/13
estabeleceu novos parâmetros para o desenvolvimento da concorrência no setor.
O novo regime reformou o modelo de autorização de serviços portuários, com o
objetivo claro de atrair investimentos privados para o setor. Além disso, ab oliu-
se a diferenciação entre “cargas próprias” e “de terceiros”
4
, mudança que
intensificou significativamente a competição entre portos públicos e privados.
Ademais, visando corrigir os problemas do regime anterior, os contratos
administrativos concebidos no âmbito da nova lei p reveem de forma mais
objetiva o alcance das taxas e tarifas portuárias, além de delimitarem os serviços
passíveis de cobrança nos terminais de movimentação de contêineres.
pelo est abelecimento de preço máx imo homologado pela aut oridade reguladora” .
(Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Processo Administrativ o
08012.007443 /99-17, Tribunal Administrativo, voto do conselh eiro Luiz Delor me Prado,
publicado no DOU de 9 de março de 200 5).
2
Como bem observado pela Sup erintendência Geral do Cade, em parecer exarado no
âmbito do Processo Administrat ivo 08012.005422/ 2003-03: “cabe salientar a
diversidade dos casos apresentados ao CADE nos qua is os Operadores Portuários têm
sido livres p ara criarem taxas e se remunerar, muitas ve zes de forma anticom petitiva. Isso
é possib ilitado pela pr evisão, na m aioria dos contratos de concessão ou arrendamento de
terminais portuários, de que os serv iços não previstos em contrato fossem remunerados
por preço estabel ecido pelo próprio concessionário. Juntando -se essa cláusula a
interpretações destoantes da extensão do serviço em contra to, a alterações na estrutura
regulatória e à i mposição de novas obrig ações re gulatórias ao contrato a ssinado,
apresenta-se o set or portuário como concorrencialmente sensível, vulnerável a condutas
anticoncorrenc iais, por conta de brech as da regulação setorial. ”
3
Quando da vigência da Lei nº 8.630/9 3, o principal problema concorr encial existente n o
setor referia-se à diferenci ação de preços de armazenagem em relação a mercadori as
destinadas a r ecintos alfandegá rios concorrentes , hipótese de cobrança da chamada
Terminal Ha ndling Charge 2 ou ta xa de segregação e entrega (SEE), que serão analisad os
no Capítulo II deste Trabalho. Casos como esses foram objeto de processos
administrativo s, tanto no âmbito do Cade quanto da agência r eguladora, tendo as duas
autarquias divergido acerc a da legalidade d a cond uta. Com a superveniência da
Resolução nº 2.389/12 da Antaq, a questã o tornou-se ainda mais complexa.
4
O texto da Le i nº 8.630/93 previa que os terminais de uso privativo poderiam ser
explorados na modalidade de u so privativo exclusivo - isto é, somente poderiam se
destinar à movimentação de car gas próprias do op erador portuário ou na modalida de de
uso privativo misto (com vistas à moviment ação de cargas próprias e de te rceiros). A
nova lei aboliu essa diferenciação , permitindo que os terminais de uso privativo operem
com cargas ex clusivamente de terceiros.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT