A descentralização de políticas sociais e o federalismo cooperativo brasileiro

AutorGilberto Bercovici
Páginas13-28
A DESCENTRALIZAÇÃO DE POLÍTICAS
SOCIAIS E O FEDERALISMO
COOPERATIVO BRASILEIRO(,)
DECENTRALIZATION OF SOCIAL POLICIES
AND THE BRAZILIAN COOPERA TIVE FEDERALISM
Gilberto Bercovicin
RESUMO
O processo de descentralização das políticas sociais que vem ocor-
rendo no Brasil desde 1988 é aqui analisado em suas relações com a
repartição de competências federais estabelecida na Constituição de 1988
e com a crise do Estado brasileiro, que compromete a efetivação do modelo
federal cooperativo previsto no texto constitucional.
Palavras-chave
Federalismo cooperativo, Descentralização, Crise do Estado, Políti-
cas sociais, desigualdades regionais.
ABSTRACT
The process of social policy decentralization that has been conducted
in Brazil since 1988 is analyzed in relation to the distribution of federal com-
petences established in the Constitution of 1988, and to the crisis of the
Brazilian State, which undermines the effectiveness of the cooperative fede-
ral model enacted in the constitutional text.
(*) Doutor em Direito do Estado pela Faculdade de Direito da USP.
(1) Parte da argumentação deste artigo foi desenvolvida na nossa tese de doutorado (em vias de
publicação pela Editora Max Limonad): Gilberto BERCOVICI, Desequilíbrios Regionais: Uma Análise
Jurídico-lnstitucional, mimeo, Tese de Doutoramento, Faculdade de Direito da Universidade deo
Paulo, 2000, especialmente nos capítulos 4 e 5.
Keywords
Cooperative Federalism, Decentralization, Crisis of the State, Social
Policies, Regional Inequalities.
A REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS NO FEDERALISMO
COOPERATIVO BRASILEIRO
Nos regimes federais, tradicionalmente, compete à União buscar a
redução das desigualdades regionais. No Brasil, a forte presença estatal
na economia contribuiu para que o Governo Federal ocupasse um papel de
fundamental importância nas políticas de desenvolvimento regional(2). Des-
ta maneira, os fundos públicos (receitas tributárias, gastos da União e das
estatais federais, incentivos fiscais e empréstimos públicos)o funda-
mentais nas relações federativas, especialmente em países com enormes
disparidades regionais como o nosso. A estruturação federal pressupõe
transferência considerável de recursos públicos entre as regiões, funda-
mentada no princípio da solidariedade(3).
Dentre estas complexas relações de interdependência entre a União
e os entes federados, no federalismo cooperativo, devemos distinguir a
(2) José Roberto Rodrigues AFONSO, "Questão Tributária e o Financiamento dos Diferentes
Níveis de Governo", in Rui de Britto Álvares AFFONSO & Pedro Luiz Barros SILVA (orgs.), A
Federação em Perspectiva: Ensaios Selecionados,o Paulo, FUNDAP, 1995, pp. 315-316; Fer-
nando REZENDE, "El Federalismo Fiscal en Brasil", in Alicia Hernández CHÁVEZ (coord.), Hacia un
Nuevo Federalismo?, México, Colégio de México/Fideicomisso Historia de Las Américas/Fondo de
Cultura Económica, 1996, pp. 227 e 240; e Celina Maria de SOUZA, "Intermediação de Interesses
Regionais no Brasit: O Impacto do Federalismo e da Descentralização", in Dados - Revista de
Ciências Sociais, Rio de Janeiro, IUPERJ, 1998, vol. 41, n. 3, pp. 575-576.
(3) Cf. Rui de Britto Álvares AFFONSO, "A Federação no Brasil: Impasses e Perspectivas", in Rui
de Britto Álvares AFFONSÇ & Pedro Luiz Barros SILVA (orgs.), A Federação em Perspectiva, cit.,
pp.
57-58; e Rui de Britto Álvares AFFONSO, "Descentralização e Reforma do Estado: A Federa-
ção Brasileira na Encruzilhada", in Economia e Sociedade n. 14, Campinas, Instituto de Economia
da UNICAMP, junho de 2000, pp. 132-133. Vide também José Roberto Rodrigues AFONSO,
"Descentralização Fiscal: Revendo Idéias", in Ensaios FEE, Porto Alegre, 1994, vol. 15, n. 2, pp.
354-355. De acordo com Enoch Rovira: "En efecto, sea porque la propia Constitución otorga a la
Federación una competencia de financiacións amplia que su próprio ámbito de competencia
material,
sea porque exista un desequilibrio financiero entre ésta y los miembros, de modo que
mientras la Federación dispone de una mayor capacidad financiera de la que exige la atención a sus
propias funciones, los miembros acusan un déficit de capacidad, que les impide satisfacer adecu-
adamente las responsabilidades que les encomienda la Constitución, en la actualidad constituye
norma común el hecho de que la Federación acuda com sus propios fondos a la financiación de
importantes sectores de la actividad de los miembros. Aun cuando la entrega de tales fondos no se
realice en muchos casos claramente bajo la forma de transferencias condicionadas, resulta
evi-
dente que las instancias centrales adquieren, por estaa indirecta, una cuota de influencia sobre
el ámbito competencial próprio de los miembros superior a la prevista explícitamente por el texto
constitucional. La Federación contribuye a la financiación de ciertas actuaciones de los miembros
en función del interés general implícito en las mismas, de modo que tales actuaciones son
consideradas también por las instancias centrales como de próprio interés. A partir de ahí se crea
también un espacio de común interés, propicio para el desarrollo de fórmulas de cooperación en la
relación entre las dos instancias" in Enoch Alberti ROVIRA, Federalismo y Cooperación en la
Republica Federal Alemana, Madrid, Centro de Estudios Constitucionales, 1986, p. 374.

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