Disposições gerais

AutorAna Clara Amaral Arantes Boczar/Letícia Franco Maculan Assumpção
Ocupação do AutorGraduada em Direito pela Faculdade Milton Campos/Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais
Páginas17-60
USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL 17
2 Disposições gerais
A usucapião extrajudicial, que é o principal objeto de estudo
do presente trabalho, é uma forma de reconhecimento da usu-
capião prevista no artigo 216-A na Lei nº 6.015 (Lei de Registros
Públicos), modi cado pela Lei nº 13.465/2017.
No entanto, para a compreensão desse instituto e suas
peculiaridades, é necessário, antes disso, o estudo da usucapião
em si, os conceitos envolvidos, seus requisitos gerais, suas carac-
terísticas, suas espécies e seus efeitos. Não há como se falar da
forma de um ato sem antes tratar do seu conteúdo.
Sendo assim, a parte inicial deste trabalho será direcionada
para o estudo do instituto da usucapião em si.
2.1 Conceitos
O ponto de partida para a análise dos conceitos é a própria
usucapião. O termo no feminino passou a ser adotado pelo Código
Civil de 2002, no LIVRO II (Do Direito das Coisas), em seu Título
III (Da Propriedade), Capítulo II (Da Aquisição da Propriedade
imóvel), na Seção I (Da Usucapião), e nesse gênero também
será adotado no presente trabalho.
De origem latina, a expressão usucapião é “formada pela
junção dos termos usus e capere, que signi cam tomada, aquisição,
captação pelo uso” (CORREIA, p.59). Ou seja, a usucapião é um
modo de aquisição da propriedade e de outros direitos reais
pelo exercício da posse prolongada no tempo, observados
requisitos legais especí cos.
Usucapião Extrajudicial [14x21].indd 17 16/07/2018 10:16:47
Ana Clara Amaral Arantes Boczar & Let ícia Franco Maculan Assumpção
18
Orlando Gomes (1996, p. 163) assim conceitua o instituto:
Usucapião é, no conceito clássico de Modestino, o modo de ad-
quirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso
de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei: usucapio est
adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege
denit.
A usucapião é, com efeito, um modo de aquisição da propriedade,
por via do qual o possuidor se torna proprietário. (grifos do autor)
Maria Helena Diniz (1989, p. 116) ainda complementa o
conceito, abrangendo a aquisição não só da propriedade, mas
também de outros direitos reais, como se vê:
O usucapião (sic) é um modo de aquisição da propriedade e de
outros direitos reais (usufruto, uso, habitação, enteuse – RT,
538:278, 598:181, 527:84, 550:174, 596:58; RTJ, 69:528, servi-
dões prediais – RT, 588:189) pela posse prolongada da coisa com a
observância dos requisitos legais. É uma aquisição de domínio pela
posse prolongada, como prefere dizer Clóvis Beviláqua.
É pacíco que a usucapião é uma forma de adquirir não só
a propriedade, mas também outros direitos reais1, como concei-
tuou Maria Helena Diniz, acima. As questões controvertidas a
respeito do tema, como, por exemplo, se é forma originária ou
derivada de aquisição da propriedade, serão tratadas a posteriori,
uma vez que exigem maior atenção.
Passando adiante, o artigo 1.238, do Código Civil de 2002,
dispõe sobre uma das modalidades de usucapião – que não será
objeto de estudo neste momento –, e traz elementos importantes
a serem explorados. Vejamos:
1 O Provimento nº 65, do CNJ, que regulamenta o procedimento da usucapião
extrajudicial no âmbito nacional, dispôs, expressamente, em seu Art. 2º, § 1º,
que “O procedimento de que trata o caput poderá abranger a propriedade e
demais direitos reais passíveis da usucapião”.
Usucapião Extrajudicial [14x21].indd 18 16/07/2018 10:16:47
USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL
19
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem
oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a proprie-
dade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer
ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título
para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. (grifo nosso)
A partir do dispositivo acima podemos extrair os seguintes
elementos: posse, contínua (sem interrupção), mansa e pacíca
(sem oposição), com animus domini (possuir como seu), pro-
priedade, título e boa-fé. Além desses, também será necessária
a análise dos conceitos de posse justa e injusta, bem como da
posse ad interdicta e posse ad usucapionem.
O primeiro conceito a ser estudado é o da posse. Para
conceituá-la, é indispensável a análise de duas teorias: a teoria
subjetiva da posse, de autoria de Savigny, e a teoria objetiva da
posse, cujo autor é Ihering. Ambas as teorias buscaram conceituar
a posse e o zeram de forma divergente.
De acordo com a Teoria Subjetiva, de Savigny, a posse se
caracteriza pela soma de dois elementos, quais sejam o corpus e
o animus. O primeiro consiste na situação fática de poder sobre
a coisa, enquanto o segundo se trata do íntimo do agente de
querer ter a coisa como sua.
Orlando Gomes (1996, p. 19) disserta com excelência
acerca da teoria de Savigny e ainda destaca as críticas que lhe
são atribuídas, como se vê:
Primeiro, o corpus. Sendo o poder de fato sobre a coisa, supõe
a apreensão. Necessária, portanto, a relação exterior da pessoa
com a coisa. Quanto ao animus, é exigido como vontade de ter a
coisa como própria (animus domini). Assim, não se admite sejam
possuidores os que detêm a coisa animo nomine alieno, tenham-na
no interesse próprio ou no alheio. Contudo, a condição de possui-
dor era reconhecida aos que exerciam poder físico sobre a coisa
com animus rem sibi habendi, como era o caso de certos titulares
Usucapião Extrajudicial [14x21].indd 19 16/07/2018 10:16:47

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT