Do estado liberal ao estado democrático-social: o direito penal econômico como condição de possibilidade à proteção da ordem econômica constitucional

AutorBruno Cozza Saraiva
CargoUniversità degli Studi Mediterranea di Reggio Calabria, Reggio Calabria, Itália
Páginas29-69
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons
Atribuição-NãoComercial-SemDerivações 4.0 Internacional.
DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO DEMOCRÁTICO-
SOCIAL: O DIREITO PENAL ECONÔMICO COMO
CONDIÇÃO DE POSSIBILIDADE À PROTEÇÃO DA ORDEM
ECONÔMICA CONSTITUCIONAL
FROM THE LIBERAL STATE TO THE DEMOCRATIC-SOCIAL STATE: THE
LAW ECONOMIC PENALTY AS A CONDITION OF POSSIBILITY FOR
THE PROTECTION OF THE CONSTITUTIONAL ECONOMIC ORDER
Bruno Cozza SaraivaI
Resumo: O presente texto tem como finalidade responder
ao seguinte problema: o Direito Penal Econômico, no
que se refere ao modo pelo qual o constituinte brasileiro
escolheu para a realização da existência digna, é condição de
possibilidade à proteção e ao desenvolvimento-concretização
da Ordem Econômica Constitucional consubstanciada
na Constituição da República Federativa do Brasil? Em
consequência disso, para esta finalidade, se elencou quatro
objetivos: a) demonstrar que, o abuso do poder econômico,
dominando ou eliminando, total ou parcialmente a
concorrência, mediante qualquer forma de ajuste, ou
acordo entre empresas, condicionado pela Administração
Pública, compromete a livre concorrência; b) verificar se,
a proteção capitaneada pelo Direito Penal Econômico,
no que condiz ao domínio do mercado, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros, é garante
do Princípio Constitucional da Igualdade (artigo 5º, caput,
inciso I, da Constituição Federal de 1988); c) analisar se, o
Estado-Administração Pública, em decorrência dos atuais
acontecimentos relativos à corrupção em âmbito nacional,
mais especificamente no que tange à formação de cartel,
pode ser caracterizado como violador da livre concorrência
ou da sua própria Ordem Econômica Constitucional e d)
compreender se, o Estado Democrático de Direito brasileiro,
enquanto Estado Social, pode ser, de maneira geral,
considerado como bem jurídico e, com isso, passível de ser
protegido pelo Direito Penal Econômico. Logo, este estudo
justifica-se pelo atual – e histórico – cenário verificado no
Brasil, qual seja, o cenário relativo à ocorrência reiterada de
crimes contra a ordem econômica, de modo a se concluir que
a Ordem Econômica Constitucional necessita de proteção.
Para atender aos objetivos traçados, serão utilizados os
métodos de procedimento histórico e monográfico, aliados à
técnica de pesquisa por documentação indireta, bibliográfica,
tratando-se de uma investigação qualitativa.
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v16i38.271
Recebido em: 29.10.2020
Aceito em: 17.03.2021
I Università degli Studi Mediterranea
di Reggio Calabria, Reggio Calabria,
Itália. Doutor em Direito Público. E-mail:
cozzaadvocacia@gmail.com
30 Revista Direitos Culturais | Santo Ângelo | v. 16 | n. 38 | p. 29-69 | jan./abr. 2021
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v16i38.271
Palavras-chave: Estado do Bem-Estar Social; Ordem
Econômica Constitucional; Objetivos Fundamentais da
República; Direito Penal Econômico.
Abstract: e purpose of this text is to answer the following
problem: Economic Criminal Law, with regard to the way in
which the Brazilian constituent chose to achieve a dignified
existence, is a condition of possibility for the protection and
development-concretization of the Constitutional Economic
Order embodied in the Constitution of the Federative Republic
of Brazil? As a result, for this purpose, four objectives were
listed: a) to demonstrate that, the abuse of economic power,
dominating or eliminating, totally or partially, competition,
through any form of adjustment, or agreement between
companies, conditioned by the Public Administration,
compromises free competition; b) verify that the protection
provided by the Economic Criminal Law, in terms of market
dominance, the elimination of competition and the arbitrary
increase of profits, guarantees the Constitutional Principle of
Equality (article 5, caput, item I, of the Constitution 1988);
c) to analyze whether, as a result of current events related to
corruption at the national level, more specifically with regard
to the formation of a cartel, the State-Public Administration
can be characterized as violating free competition or its own
Constitutional Economic Order; to understand whether the
Democratic State of Brazilian Law, as a Social State, can, in
general, be considered as a legal asset and, with that, liable
to be protected by Economic Criminal Law. erefore, this
study is justified by the current - and historical - scenario
verified in Brazil, that is, the scenario related to the repeated
occurrence of crimes against the economic order, in order
to conclude that the Constitutional Economic Order needs
protection. To meet the objectives set, the methods of
historical and monographic procedure will be used, together
with the technique of research by indirect, bibliographic
documentation, in the case of a qualitative investigation.
Keywords: State of Social Welfare; Constitutional Economic
Order; Fundamental Objectives of the Republic; Direito
Penal Econômico.
1 Introdução
A discussão acerca do Estado, tanto histórica quanto contemporânea, seja através de
dilemas-transformações-adjetivações ou, até mesmo, da territorialização do poder, apresenta-
se, em todos os tempos, de fundamental importância para a compreensão das relações políticas
e jurídicas, bem como econômicas que envolvem um determinado, temporalmente falando,
território.
É por isso que, a temática escolhida para este trabalho, se refere, a partir das violações-
crimes contra a Ordem Econômica Constitucional, à probabilidade de, no atual cenário nacional,
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Do Estado Liberal ao Estado Democrático-Social...
Bruno Cozza Saraiva
o Direito Penal Econômico mostrar-se como condição de possibilidade à proteção do Princípio
Constitucional da Livre Concorrência.
Para isso, ou seja, para o desenvolvimento desta temática, torna-se necessário demonstrar
que a delimitação da mesma se relaciona, fundamentalmente, com o Estado do Bem-Estar
Social, consubstanciado pela Constituição da República Federativa do Brasil, que, a partir de
1988, apostou, para a realização da justiça social, em uma ordem econômica e social.
Assim, para abarcar esta complexidade e, da mesma forma, delinear a importância do
Direito Penal Econômico para a realização, mesmo que indiretamente, deste pressuposto (justiça
social), verificar-se-á a indispensabilidade desta proteção, capitaneada por este outro, não mais
liberal, Direito Penal, considerando-se que do momento em que se percebe a cartelização-domínio
da economia-mercado e, consequentemente, a inviabilização do Princípio Constitucional da
Livre Concorrência, surge a necessidade de se proteger a concorrência e, principalmente, o
Estado do Bem-Estar Social.
Em consequência disso, o problema que estruturará este texto se expressa através do
seguinte questionamento: o Direito Penal Econômico, no que se refere ao modo pelo qual
o constituinte – povo – brasileiro escolheu para a realização da existência digna, é condição
de possibilidade à proteção e ao desenvolvimento-concretização da Ordem Econômica
Constitucional estruturada na, e pela, Constituição da República Federativa do Brasil?
Com isso, em um primeiro momento, como objetivo geral, se buscará
demonstrar que o abuso do poder econômico, dominando ou eliminando total ou parcialmente
a concorrência, mediante qualquer forma de ajuste, ou acordo entre empresas, condicionado
pela Administração Pública, compromete a realização dos Objetivos Fundamentais da República
Federativa do Brasil e a livre concorrência, esta última enquanto pressuposto econômico-
constitucional de um Estado que se pretende Social-prestacional.
Ademais, neste contexto e para a finalidade estabelecida, como objetivos específicos foram
propostos os seguintes: a) verificar se, a proteção capitaneada pelo Direito Penal Econômico,
no que condiz ao domínio de mercado, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário
dos lucros, é garante do Princípio Constitucional da Igualdade (artigo 5º, caput, inciso I, da
Constituição Federal de 1988); b) analisar se, o Estado-Administração Pública, em decorrência
dos atuais acontecimentos relativos à corrupção em âmbito nacional, mais especificamente no
que diz respeito à formação de cartel, pode ser caracterizado como violador da livre concorrência
ou, melhor, da sua própria Ordem Econômica Constitucional; c) compreender se, o Estado
Democrático de Direito brasileiro, enquanto Estado Social, pode ser, de maneira geral,
considerado como bem jurídico e, com isso, passível de proteção do Direito Penal Econômico.
Por fim, a presente pesquisa justifica-se, sobretudo, pelo atual – e histórico – cenário
verificado no Brasil, qual seja, o cenário relativo à ocorrência reiterada de crimes contra a ordem
econômica. Dessa forma, por meio do desencadeamento e, por assim dizer, do desenvolvimento
da Operação Lava-jato e do consequente desvelamento de inúmeros esquemas de corrupção que
atentaram e ainda atentam contra a Ordem Econômica Constitucional brasileira, se percebeu,
ao fim e ao cabo, a cartelização da economia nacional, uma vez que esta prática, tipificada no
artigo 4º, caput, incisos I e II, da Lei 8.137 de 1990, viola o Princípio Constitucional da Livre
Concorrência.

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