Dos Impedimentos e da Suspeição (Arts. 144 a 148)

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas198-220
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Código de Processo Civil
CAPÍTULO II
DOS IMPEDIMENTOS E DA SUSPEIÇÃO
Art. 144. impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
I — em que i nterveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como
membro do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha;
II — de que c onheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;
III — quando n ele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do
Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou
afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
IV — quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente,
consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
V — quando for s ócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte
no processo;
VI — quando for h erdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;
VII — em que figur e como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de
emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços;
VIII — em que figur e como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge,
companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro
grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;
IX — quando promover ação contra a parte ou seu advogado.
§ 1º Na hipótese do i nciso III, o impedimento só se verifica quando o defensor público, o
advogado ou o membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início da
atividade judicante do juiz.
§ 2º É vedada a criaç ão de fato superveniente a fim de caracterizar impedimento do juiz.
§ 3º O impedimento pr evisto no inciso III também se verifica no caso de mandato
conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado
que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha
diretamente no processo.
• Comentário
Caput. Ainda que por outras palavras, o veto à
atuação do juiz impedido estava expresso no caput
do art. 134 do CPC revogado.
O estatuto processual civil de 1939 não estabele-
cia nenhuma distinção de ordem sistemática entre as
causas de impedimento e de suspeição. Todas elas
vinham enfeixadas sob o título de suspeição e se en-
contravam arroladas no art. 185.
Pedro Baptista Martins chegou a a rmar ser
inteiramente destituída de interesse pragmático
qualquer separação nesse sentido (Comentários ao
Código de Processo Civil. V. III, tomo I, p. 54).
A CLT, editada na vigência do CPC, deixou-se
in uenciar por este, de tal modo que também não
distinguiu os casos de suspeição dos de impedimen-
to (art. 801). Tudo aqui foi tratado (e encambulhado)
como suspeição, embora o parentesco (letra “c”)
diga respeito ao impedimento.
Conforme demonstraremos adiante, o impedi-
mento, no processo do trabalho, não deriva, apenas,
do parentesco do juiz, senão que também de todas
aquelas causas mencionadas nos incisos do art. 144
do CPC.
O atual CPC (a exemplo do CPC de 1973), mais
didático, trata, de maneira separada, os casos de
impedimento e de suspeição (arts. 144 e 145, nessa
ordem). Essa disjunção não derivou de mero capri-
cho do legislador, justi cando-se, acima de tudo, por
motivos cientí cos e práticos. Cientí cos, porque
as causas de impedimento do magistrado são mui-
to mais graves do que as de suspeição, vale dizer,
apresentam-se muito mais comprometedoras de sua
atuação e do dever legal de neutralidade inerente
ao exercício das funções; práticos, porque o silên-
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cio da parte, diante do impedimento, é irrelevante,
pois o fato de ela nada alegar acerca do assunto não
faz com que se torne sem efeito a proibição legal de
o juiz impedido funcionar no processo; na suspei-
ção, ao contrário, a falta de manifestação da parte,
no momento oportuno, é interpretada pelo sistema
como aceitação tácita da presença do magistrado no
comando processual.
A doutrina de nosso País tem sustentado, de
maneira uniforme, que a razão de as normas legais
haverem instituído o veto à atuação judicial, nas si-
tuações de impedimento (e, também, de suspeição),
decorreu da preocupação de assegurar-se a impar-
cialidade do magistrado na condução do processo.
Nós mesmos, em linhas transatas, escrevemos que a
neutralidade do juiz constitui um dos pressupostos
necessários ao regular desenvolvimento da relação
jurídica processual. Isso não quer dizer que esteja-
mos plenamente de acordo com aqueles que veem
no impedimento uma política legislativa devotada,
exclusivamente, à necessidade de evitar a participação
no processo de um juiz parcial, tendencioso. Expli-
quemo-nos. Não há negar que o juiz, como órgão
estatal incumbido de solucionar os con itos de inte-
resses, deve ser imparcial e que o fato, por exemplo,
de ele ser parente ou cônjuge de um dos litigantes,
ou, mesmo, parte, coloca em risco esse princípio fun-
damental da neutralidade. Todavia, se admitirmos a
hipótese em que um juiz impedido tenha conduzido
o processo, desde o início, e decidido contra a parte
a quem, em princípio, se imaginava que estaria pro-
penso a favorecer (por ser seu cônjuge ou parente),
parece-nos que cará um pouco abalado o argu-
mento segundo o qual o veto legal, sob a forma de
impedimento, se vincula, de maneira exclusiva, ao
receio de imparcialidade do magistrado. Pensamos,
assim, que há, nesse veto, também um conteúdo
de natureza ética (pois não podemos nos esquecer
que o processo é o método formal de que se utiliza
o Estado para solucionar as lides), de tal sorte que
mesmo vindo o juiz a decidir contra os interesses de
um seu parente ou de seu cônjuge, qualquer destes
poderá tentar obter um decreto jurisdicional de nu-
lidade do processo ou de desconstituição dos efeitos
da coisa julgada material, conforme seja o caso.
Em resumo, a proibição legal de o magistrado
atuar em determinadas causas provém não somen-
te da preocupação de assegurar-se aos litigantes a
imparcialidade judicial, mas, também, de razões de
ordem ética — capazes, por si sós, em algumas si-
tuações, de conduzir à nulidade do processo ou à
desconstituição da res iudicata, quando o magistrado
não observar essa imposição legal de abstenção, no
que tange ao exercício das suas funções.
Por traduzir, o impedimento, um veto legal abso-
luto à atuação do juiz, estamos convencidos de que
essa proibição alcança todos os atos processuais,
motivo por que eventual desrespeito do magistrado
a essa proibição acarretará a nulidade total do pro-
cesso, tirante a petição inicial. De nada adiantaria,
para a parte interessada, ver anulados somente os
atos decisórios, ou desconstituídos os efeitos da coi-
sa julgada material, se o pronunciamento de mérito
se baseou em atos processuais antecedentes, que
foram praticados sob a direção do juiz impedido.
Tais atos estão, fora de qualquer dúvida razoável,
contaminados pelo desacato judicial à proibição que
emana do art. 144, do CPC.
Não se pense, entretanto, que os atos praticados
por juiz impedido integram a classe (algo inexplo-
rada pela doutrina) dos inexistentes. Nada disso.
Inexistentes seriam esses atos se quem os realizasse
não fosse juiz. Sendo-o, referidos atos existem, ainda
que comprometidos por vícios insanáveis. Se fossem
inexistentes, é óbvio que não poderiam ser objeto de
ação anulatória ou rescisória, e, sim, de ação declara-
tória (de inexistência), embora esta nem sempre seja
necessária.
Dissemos, há pouco, que o impedimento corres-
ponde a um veto legal absoluto à atuação do juiz.
Essa a rmação é inteiramente verdadeira, não ape-
nas em face da dicção inequívoca da norma legal
(art. 144, caput), mas também se levarmos em conta
o fato de que, na suspeição, o dever judicial de abs-
tenção é relativo, haja vista que se a parte deixar de
arguir a suspeição no momento oportuno esse seu
silêncio permitirá a participação do juiz no proces-
so, ainda que seja amigo íntimo ou inimigo capital
de uma das partes; credor ou devedor de qualquer
delas; tenha interesse no objeto da lide etc.
As próprias causas de impedimento, legalmen-
te previstas, justi cam a razão por que o veto legal,
neste caso, é in exível. Essas causas, aliás, podem
ser objetivamente constatadas, pois a prova, em re-
gra, é documental (sem prejuízo de outros meios,
por lei admitidos), ao passo que as causas de sus-
peição envolvem, muitas vezes, aspectos fortemente
subjetivos, como se dá com a amizade íntima, com a
inimizade capital, com o interesse no objeto do lití-
gio e o mais.
O juiz, como representante, por excelência, do
Estado, tem o dever de ser neutro, imparcial, seja na
condução do processo — oportunidade em que deve
ministrar um tratamento equânime às partes, seja
no momento da entrega da prestação jurisdicional.
Eventual quebra desse dever de imparcialidade po-
derá conduzir à decretação de nulidade do processo.
Inciso I. Constituía o inciso II do art. 134 do CPC
revogado.
Mandatário, perito, membro do Ministério Pú-
blico, testemunha (CPC, art. 144, I). Em um único
inciso, a lei enfeixa diversas causas de impedimento
à atuação do juiz. Passemos a examiná-las.
a) Mandatário da parte. Embora, em geral, na
prática, o impedimento do magistrado decorra
de mandato judicial, o veto legal à sua atuação no
processo alcança também os casos de mandato ex-
Art. 144

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